Você o conhece, certamente. Aquele cara que nunca para em um emprego porque nenhum está bom. Não sai com ninguém porque ninguém é bom o suficiente. Não gosta do estado das coisas, mas ainda mora com os pais. A cidade onde nasceu não lhe comporta, mas ele ainda está lá.

Você se depara com ele nas festas de família ou nas mesas de bar, talvez, mas nunca estende o papo “A Árvore dos Frutos Selvagens”, o diretor turco Nuri Bilge Ceylan dá voz a este tipo – e por um longo tempo. Durante suas arrastadas três horas de duração, acompanhamos reclamações, reencontros, delírios e discussões de um ser muito, mas muito insatisfeito.

O ser em questão é Sinan (Aydın Doğu Demirkol), um jovem que está na metade de seu serviço militar e, durante seu recesso, volta para a região natal para rever a família, tentar uma carreira de professor e conseguir financiamento para a publicação de seu livro, cujo título dá nome ao longa.

Sinan não só está longe de ser um personagem querido como é facilmente detestável. Ele diz as maiores atrocidades para os próprios pais, faz pouco caso da vida de uma antiga namorada, sai na porrada com antigos amigos e ainda dá um jeito de ofender estranhos que podem lhe servir de ajuda, como no caso de seu encontro com o escritor Süleyman (Serkan Keskin), que vai de admirado a alvo em minutos.

De um ponto de vista dramático, claro, isso está longe de ser um problema. Grandes obras foram construídas em cima de personagens desprezíveis e o próprio Ceylan sabe disso. Seu filme anterior, “Sono de Inverno” (ganhador da Palma de Ouro no Festival de Cannes), também ultrapassava a marca das três horas e centrava-se no terrível ex-ator Aydin, com suas picuinhas e agressões verbais ocupando boa parte da projeção.

Não estão presentes aqui, no entanto, o senso de gravitas e de propósito de “Sono”, que usava de ricos subtextos de Chekov e Dostoyevsky para pintar o retrato de um homem tão perdido em si mesmo que qualquer tentativa de contato com outras pessoas lhe deixava feridas abertas. Nele, Sinan passa a maior parte do tempo preso dentro de um idealismo juvenil quase fanático que o fecha para diálogos – o que é irônico, já que a produção é composta de vários deles, tão longos que fazem a cena da taberna de “Bastardos Inglórios” parecer um videoclipe.

Os momentos em que ele consegue quebrar o idealismo são os que mais funcionam, como em uma das discussões finais que tem com a sua mãe, ponderando o passado e o futuro da família, e no encontro final com seu pai. Infelizmente, só eles não compensam uma narrativa que, da mesma forma que seu protagonista, anda a esmo e nunca parece satisfeita consigo mesma.