No próximo dia 15 de setembro, o Brasil define qual filme será o representante do país na briga por uma vaga ao Oscar 2018. Diferente do ano passado em que “Pequeno Segredo” foi escolhido de maneira ridícula pelo Ministério da Cultura em detrimento de “Aquarius“, a definição, agora, deve ser uma disputa muito mais voltada para aspectos cinematográficos do que questões políticas.

Pela primeira vez, o escolhido será feito pela Academia Brasileira de Cinema e uma comissão de sete nomes formadas por ela. Apesar da novidade, a velha questão sobre o nosso representante se mantém: vamos eleger o melhor filme ou será enviado aquele com mais cara de Oscar?

O perfil dos membros da comissão indica que a segunda opção ainda deve prevalecer devido ao caráter com viés mais comercial dos nomes selecionados. O presidente do grupo é Jorge Peregrino, vice-presidente da Academia e vice-presidente sênior de distribuição para América Latina da Paramount. Há também Iara Britz, fundadora da produtora Midgal Filmes, e o sócio-diretor do Canal Brasil, Paulo Roberto Mendonça.

Já entre os cineastas foram escolhidos dois nomes ainda sem grande força do cinema nacional: João Daniel Tikhomiroff, diretor dos esquecíveis “Besouro” e “Os Saltimbancos Trapalhões”, e David Schurman, com apenas o fraquíssimo “Pequeno Segredo” na filmografia. O nível se eleva mais com a presença do experiente Miguel Faria Jr., responsável pelos ótimos documentários “Vinícius” e “Chico – Artista Brasileiro”. Apesar de estar afastado do cinema desde 2007 com “El Corazón de la Tierra”, Doc Comparato traz no currículo os roteiros de filmes importantes como “Bonitinha, mas Ordinária” e “Beijo no Asfalto”.

Além dos jurados, vale lembrar que a Academia Brasileira de Cinema é a mesma responsável pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Esta, na minha opinião, é uma das premiações mais malucas do setor no Brasil. Para se ter uma ideia, em 2014, o evento elegeu Bruno Barreto, por “Flores Raras”, o melhor diretor quando tinha Kleber Mendonça Filho, em “O Som ao Redor”, e, neste ano, fez a competente atuação de Andrea Horta, em “Elis”, superar o melhor papel da carreira de Sônia Braga, por “Aquarius”, em Melhor Atriz. Fora que filmes alternativos pouco conseguem espaço na disputa, o que já indica um olhar mais voltado para o comercial.

Com esta pegada mais na área comercial, a busca por tentar decifrar o que pauta a cabeça dos integrantes da Academia deve continuar sendo o foco dos responsáveis pela seleção do filme nacional. Essa opção já se mostrou um faca de dois gumes: deu certo na aposta do pré-indicado “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias”, em 2009, mas, também foi um fracasso na ideia de emular “Cidade de Deus” com as opções por “Salve Geral” e “Última Parada 174”, além, claro, de “O Pequeno Segredo”.

Vamos, então, às chances dos 23 selecionados para a disputa pela vaga brasileira ao Oscar:

Sem Chances

Motivo: por ter uma categoria própria no Oscar, os documentários da lista (“Cidades Fantasmas”, “Divinas Divas”, “Quem é Primavera das Neves”) serão descartados pela comissão. Apesar dos belos efeitos especiais darem uma cara hollywoodiana, “Malasartes” é uma história muito brasileira para ser entendida no mercado exterior. Já os demais, estão de figurantes na disputa.

Chances Mínimas

Motivo: “Corpo Elétrico” se saiu bem no Festival de Roterdã, mas, dificilmente, a comissão irá eleger uma produção ousada como o filme de Marcelo Caetano para um corpo votante considerado tão conservador quanto do Oscar.

Pesa a favor de “Era o Hotel Cambridge” ser um dos longas mais elogiados do ano pela crítica, porém, não tem o aspecto comercial desejado para uma campanha em Hollywood.

“Joaquim” tinha tudo para ser um peso-pesado só que a recepção fria em Berlim e do público derrubaram o filme.

“João, o Maestro” e “Real” são filmes que possuem características semelhantes a concorrentes mais fortes – “Elis” e “Polícia Federal” – o que dificulta as chances.

Se a recepção em Berlim foi morna, “Vazante” traz em Daniela Thomas, parceira habitual de Walter Salles, um trunfo para surpreender.

Chances Médias
  • Elis
  • Polícia Federal – A Lei é Para Todos

Motivo: “Elis” mostrou força junto à Academia nacional ao vencer em oito categorias no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Jogam contra a indicação o fato de Elis Regina não ser tão conhecida no mercado americano e o filme ser apenas competente em um gênero (cinebiografias) tão bem dominado por Hollywood.

“Polícia Federal” traz como ponto favorável levar o escândalo pelo qual o Brasil tem sido manchete mundo afora de modo didático e dentro de um suspense policial para o público estrangeiro. A escolha do longa, entretanto, colocaria a comissão e, consequentemente, a Academia para dentro de uma briga política enorme, indo, inclusive, contra a maioria da própria da classe do audiovisual, mais aliada à esquerda. Será que os sete membros estariam dispostos a enfrentar esta pressão logo após o conturbado processo “Pequeno Segredo” x “Aquarius”?

Chances Altas

Motivo: “Bingo – O Rei das Manhãs” é o queridinho do público, tem um diretor conhecido da indústria americana (Daniel Rezende foi o montador de “Cidade de Deus”, “Tropa de Elite 1 e 2”, “Árvore da Vida”, “Robocop”), traz a versão brasileira de uma figura televisiva consagrada nos EUA, ritmo hollywoodiano com final de redenção. Resta saber se a comissão brasileira vai querer arriscar levar um filme com censura de 16 anos com cenas de sexo e consumo de drogas para uma Hollywood considerada careta.

“Gabriel e a Montanha” recebeu ótimos elogios no Festival de Cannes deste ano, ganhando, inclusive, o prêmio de Revelação na Semana da Crítica. Ajuda também o longa de Fellipe Barbosa ser uma produção falada em diversas línguas e gravada na África, o que mostra o aspecto universal da produção. Manteria a tradição do Brasil em apostar em diretores nos primeiros trabalhos da carreira (David Schurman estreando em longas de ficção com “O Pequeno Segredo” assim como Daniel Rezende em “Hoje eu Quero Voltar Sozinho” e Kleber Mendonça Filho em “O Som ao Redor”).

Em 2013, Selton Mello teve a honra de representar o Brasil com “O Palhaço”. “O Filme da Minha Vida” seria a possibilidade de uma segunda tentativa e o ator já declarou que está disposto a fazer campanha em Hollywood para emplacar uma indicação, Apesar de toda a beleza, a produção não atraiu o público esperado nos cinemas e a crítica não morreu de amores pelo projeto. O carisma do ator/diretor precisará ser muito forte para superar os rivais.

Favorito

Motivo: “Bicho de Sete Cabeças”, “Chega de Saudade”, “As Melhores Coisas do Mundo”… Laís Bodanzky é uma das diretoras mais respeitadas e talentosas do cinema nacional, mas, nunca teve um filme selecionado para representar o Brasil no Oscar. A possibilidade é agora com o filme brasileiro mais elogiado pela imprensa especializada nos principais festivais europeus deste ano.

A escolha de “Como Nossos Pais” ainda pode ser estratégica por duas vieses:

  1. uma saída conveniente para a comissão sem se envolver em possíveis rusgas políticas ou enviar uma produção de baixa qualidade técnica;
  2. após conseguir amenizar a imagem racista com a vitória de “Moonlight”, Viola Davis e Mahershala Ali, o Oscar deve se voltar em 2018 para diminuir o atrito com as mulheres. Kathryn Bigelow, Sofia Coppolla, Greta Gerwig, Angelina Jolie e até Patty Jenkins possuem boas chances de concorrer na categoria de Melhor Direção e filmes com protagonistas femininas estão em alta em Hollywood. “Como Nossos Pais” pode aproveitar esta onda feminista e, quem sabe, emplacar a primeira indicação do Brasil em 19 anos.