Pensamos que conhecemos as pessoas… E as séries. Pensamos, ao ver esta quinta temporada de Better Call Saul, que a transformação de Jimmy McGill para Saul Goodman, como o conhecemos em Breaking Bad, já estava encaminhada, até mesmo definida. No entanto, as pessoas, assim como as grandes séries, surpreendem. Faltava encaixar uma peça fundamental no quebra-cabeça dessa transformação. Faltava a Kim, ou pelo menos definir de vez qual seria o papel dela na derrocada de Jimmy e sua mudança para aquela casca de ser humano, divertida, mas oca, que era Saul.
Agora parece que não falta mais. Sempre soubemos que ela teria um papel importante nisso, mas agora, parece que o caminho está traçado. Jimmy virou Saul em boa parte porque Kim, que sempre foi seu freio, “broke bad” e passou para o mau caminho. Ao longo da série a vimos participando de alguns pequenos golpes ao lado dele, e se divertindo até, mas ela sempre refreava, só ia até certo ponto. Porém, com o tempo algo foi mudando dentro da personagem. O trabalho que lhe sugava a alma, a armação contra o Mesa Verde, o casamento…
CRÍTICA – BETTER CALL SAUL – EPISÓDIOS 01 e 02
E depois dos últimos episódios, com Jimmy quase morrendo e ela encarando o perigoso Lalo de forma destemida, as coisas mudaram de vez para ela. No início deste episódio final da temporada, “Imperdoável”, Jimmy pergunta a Kim se ele faz mal para ela. Ela nega e desconversa. Agora o mal já está feito. E o desenvolvimento da personagem ocorreu diante dos nossos olhos, enquanto estávamos distraídos… Realmente é difícil pensar numa série, hoje, tão bem escrita como Better Call Saul.
CRÍTICA – BETTER CALL SAUL – EPISÓDIOS 03, 04 e 05
Enquanto isso, do outro lado da fronteira, Nacho se vê arrastado para o esconderijo de Lalo enquanto o atentado contra este se encaminha, orquestrado por Gus. A atuação tensa e precisa de Michael Mando nos faz temer pelo personagem. Em outra ligação com Breaking Bad, o vemos se reunindo com Don Eladio (Steven Bauer) à beira daquela inesquecível piscina… Nacho, assim como Kim, é o ponto fulcral de tensão na série, pois são os personagens cujo destino nós realmente não conhecemos, e essa tensão é levada até os minutos finais do episódio, e além, quando Tony Dalton de novo rouba a cena e vemos Lalo destruindo os planos tão bem construídos e prometendo vingança apenas com sua postura corporal nos minutos finais do episódio. Lalo parece o Exterminador do Futuro agora, e na próxima temporada ele voltará…
SHOW DE SEEHORN
Curiosamente, em termos de direção e momentos visualmente criativos, “Imperdoável” foi mais modesto do que geralmente vemos na série, ou em comparação com os últimos episódios. A direção de Peter Gould, co-criador do seriado, é inteligente e segura o bastante para não se fazer sentir neste momento, porque sinceramente Better Call Saul já funciona tão à perfeição que pode se dar a esses luxos. Os efeitos visuais deste episódio são mesmo o roteiro e os atores.
CRÍTICA – BETTER CALL SAUL – EPISÓDIOS 06 e 07
E embora Odenkirk, Mando, Dalton, Patrick Fabian como Howard, Jonathan Banks e Giancarlo Esposito, todos brilhem, pode-se até dizer que a dona da parada agora é Rhea Seehorn. A Kim sempre foi uma figura interessantíssima por todos os anos do seriado, mas o que os roteiristas fizeram com ela nestas últimas temporadas torna a personagem numa das mais complexas e interessantes da TV atual, e a atriz merece todos os prêmios pela forma que a interpreta. O momento mais assustador do episódio – e olha que nele ainda vemos Lalo matando soldados a torto e a direito – é a expressão de Rhea quando Jimmy e Kim estão discutindo formas de prejudicar a carreira de Howard, e ele pergunta a ela “Nós não faríamos mesmo isso, não é?” e ela responde com o rosto e fazendo arminhas com os dedos.
CRÍTICA – BETTER CALL SAUL – EPISÓDIOS 08 e 09
Quem diria, começamos a ver Better Call Saul esperando presenciar a transformação de um homem, para pior, e acabamos vendo de quebra também a transformação de uma mulher! Nesta fantástica, viciante, e poderosa temporada – provavelmente a melhor da série até agora – foi justamente o que Better Call Saul nos deu ao se encaminhar para a reta final.
Justamente quando pensamos que conhecemos alguém…