Escrito e dirigido por Francis Annan (“Woyzeck”), “Escape From Pretoria” apresenta a história real de Tim Jenkin (Daniel Radcliffe, o eterno ‘Harry Potter’) e Stephen Lee (Daniel Webber), dois ativistas anti-apartheid levados para a prisão de segurança máxima de Pretoria, capital administrativa da África do Sul. Como o próprio título deixa claro, a dupla, ao lado de um personagem ficcional interpretado por Mark Leonard Winter, vai buscar meios para escapar da cadeia.

Com tantas obras do gênero – “Papillon” (1973), “Fuga de Alcatraz” (1979), “Um Sonho de Liberdade” (1994), “Rota de Fuga” (2013) – não há como evitar a comparação. Em todos eles, são apresentados os personagens ou a rotina que estes vivem nas prisões. Isso ajuda a criar conexão com o público, o que não acontece em “Escape From Pretoria”.

O roteiro de Annan não se preocupa em apresentar os personagens e, por consequência, não mostra suas motivações. O foco do filme está no método de fuga planejado por Tim Jenkin, o qual realmente é excepcional e extraordinário, entretanto, “Escape From Pretoria” perde por não aproveitar o pano de fundo político que a história se desenrola. Em 30 minutos, o público é levado a conhecer o passo a passo da construção do plano, mas, em nenhum momento, se preocupa em abordar quem são aquelas pessoas e o que motivou homens brancos, de famílias elitizadas, a ir contra o sistema opressor aos negros.

A única oportunidade em que há um mergulho raso na vida de um dos personagens passa rápido demais para criar qualquer espécie de conexão. É o suficiente, no entanto, para que compreendamos quais são as motivações de fuga daquele prisioneiro. O mais surpreendente é que este é o único personagem central ficcional, já indicando as escolhas intencionais do roteiro.

Tensão entre quatro paredes

Se por um lado, temos este estranhamento vindo do roteiro, a direção de Francis Annan consegue ser eficiente no que se propõe. Aliada a fotografia de Geoffrey Hall, cria-se o ambiente de tensão e claustrofobia que a preparação da fuga exige.

Os planos e enquadramentos são mais fechados nos personagens centrais. A opção de enquadrá-los da cintura para cima ou em menor espaço evidencia o quanto a liberdade está condicionada a barreiras, aumentando o clima de tensão.

A paleta de cores, alternando conforme o estágio de execução da fuga, também ambienta bem o público. Se por um lado, o filme inicia e termina com tons terrosos, a cadeia é um ambiente gélido, austero e azul, entretanto, conforme a esperança da saída começa a desenhar-se como verdadeira, a tonalidade muda para o verde.

A preocupação em tonalizar a narrativa é importante para transpor ao espectador a experiência de estar em uma prisão no regime do apartheid. No entanto, a falta de conexão com os personagens e de motivação cria um abismo que se estabelece durante toda a projeção. Isso provoca a perda de boas oportunidades de discussão em torno do sistema carcerário e do regime racista vivido na África do Sul.

‘Ghostbusters: Apocalipse de Gelo’: apelo a nostalgia produz aventura burocrática

O primeiro “Os Caça-Fantasmas” é até hoje visto como uma referência na cultura pop. Na minha concepção a reputação de fenômeno cultural que marcou gerações (a qual incluo a minha) se dá mais pelos personagens carismáticos compostos por um dos melhores trio de comédia...

‘Guerra Civil’: um filme sem saber o que dizer  

Todos nós gostamos do Wagner Moura (e seu novo bigode); todos nós gostamos de Kirsten Dunst; e todos nós adoraríamos testemunhar a derrocada dos EUA. Por que então “Guerra Civil” é um saco?  A culpa, claro, é do diretor. Agora, é importante esclarecer que Alex Garland...

‘Matador de Aluguel’: Jake Gyllenhaal salva filme do nocaute técnico

Para uma parte da cinefilia, os remakes são considerados o suprassumo do que existe de pior no mundo cinematográfico. Pessoalmente não sou contra e até compreendo que servem para os estúdios reduzirem os riscos financeiros. Por outro lado, eles deixam o capital...

‘Origin’: narrativa forte em contraste com conceitos acadêmicos

“Origin” toca em dois pontos que me tangenciam: pesquisa acadêmica e a questão de raça. Ava Duvernay, que assina direção e o roteiro, é uma cineasta ambiciosa, rigorosa e que não deixa de ser didática em seus projetos. Entendo que ela toma esse caminho porque discutir...

‘Instinto Materno”: thriller sem brilho joga no seguro

Enquanto a projeção de “Instinto Materno” se desenrolava na sessão de 21h25 de uma segunda-feira na Tijuca, a mente se esforçava para lembrar da trama de “Uma Família Feliz”, visto há menos de sete dias. Os detalhes das reviravoltas rocambolescas já ficaram para trás....

‘Caminhos Tortos’: o cinema pós-Podres de Ricos

Cravar que momento x ou y foi divisor de águas na história do cinema parece um convite à hipérbole. Quando esse acontecimento tem menos de uma década, soa precoce demais. Mas talvez não seja um exagero dizer que Podres de Ricos (2018), de Jon M. Chu, mudou alguma...

‘Saudosa Maloca’: divertida crônica social sobre um artista boêmio

Não deixa de ser interessante que neste início da sua carreira como diretor, Pedro Serrano tenha estabelecido um forte laço afetivo com o icônico sambista paulista, Adoniram Barbosa. Afinal, o sambista deixou a sua marca no samba nacional dos anos 1950 e 1960 ao...

‘Godzilla e Kong – O Novo Império’: clima de fim de feira em filme nada inspirado

No momento em que escrevo esta crítica, caro leitor, ainda não consegui ver Godzilla Minus One, a produção japonesa recente com o monstro mais icônico do cinema, que foi aclamada e até ganhou o Oscar de efeitos visuais. Mas assisti a este Godzilla e Kong: O Novo...

‘Uma Família Feliz’: suspense à procura de ideias firmes

José Eduardo Belmonte ataca novamente. Depois do detetivesco – e fraco – "As Verdades", ele segue se enveredando pelas artimanhas do cinema de gênero – desta vez, o thriller domiciliar.  A trama de "Uma Família Feliz" – dolorosamente óbvio na ironia do seu título –...

‘Donzela’: mitologia rasa sabota boas ideias de conto de fadas

Se a Netflix fosse um canal de televisão brasileira, Millie Bobby Brown seria o que Maisa Silva e Larissa Manoela foram para o SBT durante a infância de ambas. A atriz, que alcançou o estrelato por seu papel em “Stranger Things”, emendou ainda outros universos...