Aclamado pela crítica e público, Ryan Murphy provou ao longo de 10 anos que o sucesso de ‘Glee’ não foi ocasional. Além de colecionar Emmys e espectadores fiéis, o showrunner também deixou seu estilo de narrativa marcado nas séries e ‘Hollywood’ consolida este cenário ainda mais. Sendo uma verdadeira homenagem ao cinema americano na década de 1940, a produção em exibição na Netflix recria o visual da época com perfeição, porém, fantasia excessivamente nas histórias de seus personagens, o que nem sempre é negativo, mas, nesse caso, não é suficiente para manter a trama interessante.
O ano é 1948 e diversos jovens estão desembarcando em Los Angeles na esperança de viver o sonho hollywoodiano. Entretanto, para se tornar alguém na indústria, os aspirantes precisam sobreviver na cidade e fazer bons contatos. É assim que o ex-soldado Jack Castello (David Corenswet) passa a se prostituir enquanto tenta estrear como ator. Pelo caminho ele conhece Archie Coleman (Jeremy Pope), um roteirista negro e gay, o diretor Raymond Ainsley (Darren Chris) e a influente Avis Amberg (Patti LuPone).
Apesar de possuir uma grande quantidade de personagens, os roteiros conseguem aproximar todos na intenção de fazer o filme ‘Meg’ ser rodado com uma protagonista negra. Como principal linha condutora da narrativa, Castello é um galã tradicional: sobreviveu à guerra, trabalha para sustentar a família e seu sonho. Entretanto, mesmo o mais básico dos personagens consegue ter bons momentos como o diálogo com Avis no primeiro episódio, o qual mostra a grande homenagem ao cinema que “Hollywood” propõe.
Nem drama, nem comédia
Logo de cara, a produção nos apresenta esquemas verídicos de prostituição, tudo visto de forma cômica. Caso um tom dramático fosse explorado, suas tramas se tornariam bem mais convincentes. Um elemento que marca muito essa visão cotidiana sobre temáticas mais sérias é a trilha sonora, sempre remetendo à década de 1940 e dando uma leveza desnecessária para momentos mais tensos.
Essa escolha pelo humor não apenas deixa diversas falhas no roteiro como também prejudica seus personagens. Um claro exemplo disto é a história de Rock Hudson: como uma das personalidades reais sendo retratada na série: a trajetória do astro de “Assim Caminha a Humanidade” não ganha a dramaticidade necessária apesar de existir um maior direcionamento para tal. Mesmo parecendo inocente, o humor como subterfúgio acaba sendo cansativo e não contribui para aumentar o carisma de seus personagens.
A dificuldade dos personagens se relacionarem com o público é unicamente atribuída ao roteiro, pois o elenco selecionado se destaca positivamente. É claro que as veteranas LuPone, Queen Latifah e Holland Taylor dominam diversas cenas, mas a grande surpresa vai para o Henry Wilson, de Jim Parsons. Seu personagem se adequa bem tanto para o drama quanto a comédia e, mesmo sendo o vilão em diversos cenários, é fácil de entender sua importância para a trama, tornando suas cenas grandes momentos entre os episódios.
Hollywood segundo Ryan Murphy
Nos figurinos e cenários, “Hollywood” acerta perfeitamente. Desde os uniformes até as locações como cinemas da época, tudo remete ao brilhantismo de Hollywood como a terra das oportunidades. Aqui é possível dissociar do recente ‘Era Uma Vez em Hollywood’ na importância de fazer o público vivenciar seus acontecimentos. Assim como o longa de Tarantino, ‘Hollywood’ também apresenta seu final alternativo para muitas histórias conhecidas, porém, com muitos exageros.
Ao escolher retratar algumas personalidades reais, Ryan Murphy comete excessos como um sonhador em uma Hollywood tão distante do ideal. Exemplo disto é a carreira de Rock Hudson, a qual sempre foi acompanhada de boatos sobre sua homossexualidade, o que existe na série, mas recebe um tratamento muito mais positivo.
Apesar de contar com um desfecho muito distante da realidade, a série em nenhum momento esconde sua intenção de fantasiar sobre aspirantes oprimidos em Hollywood alcançando seus sonhos. O único problema disso é que somado a falta de dramaticidade, parece tudo muito fácil de ser alcançado, de forma quase superficial. É claro que as dificuldades estão ali, mas o foco da série vai justamente para o triunfo de negros, gays e mulheres, deixando claro a assinatura de seu showrunner.
Ao abordar questões de gênero, raça e sexualidade, ‘Hollywood’, retrata o cinema americano de forma muito mais inclusiva e positiva. Se caso possuísse maior densidade, a série poderia chegar a ser uma ‘American Crime Story’ ou mesmo ‘Feud’, mas já podemos agradecer por não ser uma ‘Scream Queens’, ou seja, mesmo sem explorar devidamente seus personagens, a produção é mais um trabalho convencional de Ryan Murphy.