Existe uma bela história sobre feminilidade, privilégios e o problema racial nos Estados Unidos dentro de Little Fires Everywhere (“Pequenos Incêndios por Toda Parte”), minissérie da ABC Signature disponível aqui pelo Amazon Prime Service… Pena que essa história às vezes se perca, ou seja diluída, por clichês dramáticos e elementos “novela das 8”. A minissérie é baseada no livro homônimo de Celeste Ng e estrelada pelas atrizes Reese Witherspoon e Kerry Washington – ambas são também produtoras do seriado.
É uma história ambientada em 1997, sobre duas mulheres bem diferentes vivendo no subúrbio (aparentemente) idílico de Shaker Heights, Ohio. Elena (Witherspoon) é mãe de quatro filhos adolescentes, casada com um advogado bem-sucedido – e só transa com o marido nos dias marcados na semana – e vive bem num estilo “comercial de margarina”, mas sua obsessão por perfeição está aos poucos sufocando emocionalmente seus filhos, especialmente a mais nova, Izzy (Megan Stott). É quando chegam ao lugar a artista Mia (Washington) e sua filha adolescente Pearl (Lexi Underwood). Mia e Pearl vivem uma existência nômade, sem amarras, e acabam cruzando o caminho da família de Elena. Com o tempo, conflitos passam a surgir entre as duas mulheres, temperados pelas divisões raciais e econômicas entre elas. As filhas também são afetadas pela convivência: Pearl começa a ser seduzida pela vida boa a que nunca teve direito e se aproxima dos filhos de Elena; já Izzy, a rebelde, se aproxima de Mia e seu espírito livre, desagradando a mãe controladora.
Claro que, no decorrer da história, aparecem segredos do passado de Mia e as duas mulheres também se envolvem na disputa judicial por um bebê de origem chinesa adotado por um casal branco da vizinhança. Mia é literalmente o “elemento estranho” que desestabiliza a vida na comunidade, e as melhores cenas da minissérie são justamente as que deixam esse conflito provocado por ela vir à tona. Vemos o racismo completamente orgânico daquela sociedade, vindo dos brancos bem intencionados, e essas boas intenções deixam tudo ainda mais perverso. A série também alça voo quando suas duas estrelas interagem.
FANTASMA DE ‘BIG LITTLE LIES’ NO AR
Devido à temática e à produção de Witherspoon, comparações surgem a respeito desta minissérie. Little Fires Everywhere parece, em alguns momentos, um Big Little Lies meio light – Witherspoon também estrelou e foi produtora da série da HBO que também abordava a vida aparentemente feliz de mulheres endinheiradas, mas a aparência escondia abuso domestico e violência.
E talvez este seja realmente o problema desta minissérie: É muito light. A partir de certo ponto da narrativa, os conflitos entre as duas protagonistas e os subtextos raciais e econômicos ficam em segundo plano, quando o foco passa a ser a disputa pelo bendito bebê. E aí começam a aparecer os momentos típicos de novela brega da Globo: Em dado momento, Mia fatia e queima um enorme retrato de Elena; em outro vemos um close na cara de malvadona de Elena ao revelar um segredo de Mia para a filha desta. São cenas para deixar a Glória Perez com inveja, mas talvez elas sirvam a um propósito, o de tornar mais palatável o produto para a audiência em mente – Leia-se, espectadores dos filmes melodramáticos do canal Lifetime ou de seriados da rede ABC. Pena que com isso, a profundidade é sacrificada.
A minissérie é bem dirigida, inclusive, foi o último trabalho da diretora Lynn Shelton, infelizmente recém-falecida. Shelton dirige metade dos oito episódios com um olho preciso, tentando buscar umas sutilezas aqui e ali e, de maneira inteligente, deixa suas estrelas brilharem e carregarem a série. Apesar de Washington e Witherspoon estarem ótimas, infelizmente o mesmo não pode ser dito dos jovens atores que aparecem na minissérie: Todos parecem saídos da escolinha Malhação de atores e não conseguem dar peso dramático a várias das suas cenas, tornando seus personagens opacos – Exceções feitas à Underwood, que é carismática, e à Anna-Sophia Robb, que vive a jovem Elena num episódio em flashback e se mostra uma ótima imitadora dos trejeitos de Witherspoon.
No geral, Little Fires Everywhere é facilmente maratonável e as duas estrelas, com seus desempenhos magnéticos e personagens complexas, que ora se atraem e ora se repelem, fazem valer a experiência. Mas para um espectador mais crítico, é meio que inevitável se decepcionar um pouco ao perceber que a minissérie poderia render mais, poderia ser mais incisiva e mais forte dramaticamente, se prestasse mais atenção aos seus próprios subtextos e não se apoiasse tanto em muletas dramáticas típicas de folhetim. É boa, mas não tem a força, por exemplo, da primeira temporada de Big Little Lies. E bem, posso até queimar a língua depois, mas pelo menos se encerra mesmo e não deve ter segunda temporada. Menos mal, pois nos lembramos de como foi a segunda de Big Little Lies…
Pena que a crítica também foi brega e caiu em diversos clichês típicos de blogs de séries. Se a série é melodramatica, isso é um fato intencional, avalie-a neste segmento, não tente encaixar em outro só para a matéria ter sentido. E não, não achei a série cativante, mas sei distanciar meu gosto pessoal.
Não consegui nem terminar de ler o post. Me lembrou aqueles blogs que querem se destacar das demais críticas e criticam coisas sem motivo apenas pra ganhar atenção e bem, ganharam, porque to aqui escrevendo esse comentário, mas sinceramente é tão deprimente ter que apelar para essas coisas para se conseguir views, não acham?
Em geral, gosto quando o vilão se dá bem no final, mas desta vez não teve como sentir a menor empatia pela personagem Mia Warren. Primeiro porque Kerry Washington acha que interpretar é contorcer a boca. Só isso já tira metade do brilho da série. E a personagem dela é burra até o último fio de cabelo. No fim, a gente só torce pra ela morrer com um tiro — e fica com pena da Elena (Reese Witherspoon), que estava bem até a chegada da invejosa/sequestradora que cresceu numa família estruturada, teve a chance de estudar em Nova York e estragou tudo porque era uma besta. Moral da história: não tente ajudar gente fracassada, pois ela pode acabar estragando sua vida.