“Escrito nas Estrelas” chegou quando a comédia romântica vivia uma certa ressaca, após uma década de 1990 que entregou pequenas pérolas do gênero, como “Sintonia de Amor”, “O Casamento do Meu Melhor Amigo”, “Um Lugar Chamado Notting Hill” e o injustiçado “Mensagem Pra Você”, que o Caio felizmente defendeu neste mesmo Advogado de Defesa, aqui no Cine Set.

O que todos estes filmes citados têm em comum? Além de roteiros bem amarrados com diálogos memoráveis (daqueles que você cita de cabeça anos e anos depois), o trunfo deles são os seus respectivos protagonistas. Quando se fala em comédia romântica contemporânea, difícil competir com Meg Ryan-Tom Hanks (duas vezes!) e com as dobradinhas de Julia Roberts com Ruppert Everett e Hugh Grant. Talvez esse seja o motivo de as tentativas que sucederam essas produções terem ficado pelo caminho.

Mas, retornando ao objeto deste Advogado de Defesa, há uma certa injustiça quando se fala dele. Mesmo que não haja o brilhantismo dos exemplares anteriores do gênero, “Escrito…” é um filme charmoso, galgado na química de dois atores carismáticos.

Dirigido por Peter Chelsom (que neste ano entregou o pavoroso ‘Um Espaço Entre Nós’, e que tem no currículo petardos como ‘Hanna Montana: O Filme’ e ‘Sempre Amigos’, um hit da Sessão da Tarde), “Escrito…” se apoia no conceito de “Serendipity” (título original do filme). Em uma tradução livre, a palavra é algo como um acaso feliz, e é isso que a produção tenta nos vender desde que conhecemos Jonathan (John Cusack) e Sarah (Kate Beckinsale).

A exemplo dos casais das mais forçadas das screwball comedies, os dois não têm muito em comum, mas têm uma estranha sintonia desde o momento em que se conhecem – em uma daquelas situações deliciosamente clichês que o cinema forja desde sempre. O filme é eficiente ao apresentar os personagens ao público no mesmo momento em que eles se conhecem, e quando eles se separam e a elipse entrega dois protagonistas teoricamente mais maduros, as dissonâncias continuam, e elas funcionam muito bem graças a dupla que os interpreta.

John Cusack tem um personagem que parece uma extensão dos que já interpretou, mas o ator segue um poço de carisma, capaz de proferir as mais absurdas das frases com uma verdade desconcertante. Quem chama a atenção mesmo é Kate Beckinsale, atriz que parece perdida em uma indústria que ora a vende como sex symbol em filmes de ação duvidosos, ora como estrela de produções genéricas fadadas às sessões de cinema policial no sábado à noite na TV aberta – a exceção ficou por conta de “Amor e Amizade”, filme recente onde a britânica teve um papel desafiador de fato, no qual flertou com o drama e a comédia simultâneos das obras de Jane Austen. Esse talento para a dramédia já podia ser observado em “Serendipity”, onde, assim como Cusack, Beckinsale foi a estrela do show, a despeito das situações absurdas do roteiro. Um exemplo disso é quando Sarah explica suas visões sobre a sorte e como ela acredita que algumas coisas “são feitas para ser”. A bobagem da afirmação é limada pela doçura e inocência que Beckinsale confere à personagem.

O filme se perde em várias convenções das comédias românticas, como as figuras dos melhores amigos dos protagonistas, aqui vividos por Molly Shannon (mais uma vez desperdiçada) e por um Jeremy Piven pré-Entourage. A discussão sobre o poder do destino em uma era antes das redes sociais também se revela rasa, já que as situações espontaneamente forjadas não se sustentam, principalmente no que diz respeito à Sarah dos primeiros minutos da película. Por outro lado, o fato de Jonathan – que nunca esqueceu a jovem – estar sempre rodeado de referências que lembram dela é uma situação que o roteiro poderia ter trabalhado de forma menos estereotipada. Precisa mesmo de frases machistas para pontuar que a Sarah que ele conheceu era A Sarah? E o descaso com a companheira dele é algo que ainda incomoda nesses filmes.

Ainda que não seja tão divertido citar Lobão quanto um dia foi, certa feita ele disse que “nem sempre se vê mágica no absurdo”. E o que seria o cinema – e todas as artes, por assim dizer – sem um pouco de absurdo? Mesmo sem ser uma obra-prima ou, ao menos, um grande filme como os seus colegas dos anos 1990l, “Escrito nas Estrelas” é um daqueles filmes adoravelmente guilty pleasures com um casal que vale a torcida, a despeito dos percalços do caminho.