Durante três dias, os escombros do bairro de Shejaiya, em Gaza, foram testemunhas de uma decoração surpreendente: 60 metros de tapete vermelho que foram estendidos para um pioneiro festival de cinema ao ar livre projetado entre a destruição.

Trata-se do primeiro festival de filmes de direitos humanos da Faixa de Gaza e também do primeiro realizado ao ar livre, que foi encerrado na noite desta segunda-feira (18).

No movimentado evento, denominado “Tapete Vermelho”, foram projetados 28 filmes, escolhidos entre 160 de todo o mundo, a maioria procedentes de países árabes.

A iniciativa tem entre seus objetivos homenagear as famílias que perderam suas casas na última operação israelense contra Gaza, que acabou com a vida de mais de 2.100 palestinos e cerca de 70 israelenses.

Voluntários penduraram cartazes no derrubado minarete da mesquita destruída, colocaram um telão sobre a parede de um edifício gravemente danificado e ajudaram as escavadeiras a limpar o lugar nos caminhos de acesso de restos de foguetes e explosivos.

Mensagem ao mundo

“Decidimos começar nosso festival neste bairro (o mais afetado pela guerra) para enviar uma mensagem ao mundo de que chegou o momento de começar o processo de reconstrução prometido pelos doadores internacionais e ajudar dezenas de milhares de mulheres e crianças deslocadas a retornar a seus lares”, disse à Agência Efe o diretor de cinema palestino Khalil al Muzayan.

As projeções ocorreram em uma área que abrigava a mesquita de Al Tawfiq e dezenas de casas destruídas por bombas lançadas por aviões israelenses, em um bombardeio que assolou a região durante 50 dias.

Dirigentes de Gaza, ativistas de direitos humanos e antigos moradores do bairro se aproximaram durante os três dias para ver algum dos filmes projetados, entre eles dois palestinos, um rodado na Faixa de Gaza e outro na Cisjordânia.

Nesta ocasião, o tapete vermelho não era percorrido por cineastas e atores famosos, mas pelos empobrecidos cidadãos de Gaza, que sofrem há mais de sete anos com a asfixia de um severo bloqueio.

“Deixar que o povo, especialmente os que perderam seus lares, caminhe pelo tapete vermelho é um símbolo. Queríamos enviar a mensagem para dizer que os reis e presidentes e as estrelas do cinema não são mais importantes que os pobres residentes que ainda sofrem por estarem deslocados”, afirmou Muzayan, que considera que o festival foi “um sucesso”.

O lugar também abrigou concertos de música tradicional árabe, para alegria dos presentes, que têm em Gaza poucas oportunidades de desfrutar de atividades culturais.

Mensagem de paz

As projeções foram realizadas em paralelo ao Festival Karama de Direitos Humanos de Amã (Jordânia) e pretendem “lançar uma mensagem de paz e uma chamada ao fim das violações de direitos humanos na Palestina”, comentou Fayek Jarada, um dos organizadores, também diretor de cinema.

“Fazer um festival assim na Faixa de Gaza, que vive sob o bloqueio e a destruição há tantos anos, mostra a parte humana e cultural de Gaza e cria um estado de comunicação com o mundo através da janela do cinema”, acrescentou.

Tanto Israel como o Hamas estão sendo investigados pelo Tribunal Penal Internacional por possíveis violações de direitos internacionais e crimes de guerra durante os enfrentamentos do último verão neste território, que provocou uma enorme destruição de casas, infraestruturas, indústrias e agricultura, além das graves perdas humanas.

“Este festival é o primeiro deste tipo feito em território palestino e representa um laço entre a arte e a realidade”, disse à Agência Efe Salah Abdulati, diretor da ONG palestina Corporação Independente pelos Direitos Humanos, que elogiou que o festival “ponha um foco sobre o sofrimento do povo de Gaza, especialmente durante a última agressão israelense”.

Por sua vez, Husni al-Mughani, um dos moradores do bairro de Shejaiya, disse que este “é um evento importante porque, após nove meses da guerra israelense, o festival mostra ao mundo os grandes crimes cometidos por Israel contra nós”.

“Apesar da dor, da destruição e da pobreza, os residentes de Shejaiya seguem sendo fortes e o exército israelense nunca poderá acabar com nossa vontade de vivermos vidas normais e livres”, concluiu.

da Agência EFE