Não, não se trata de uma nova lista do Cine Set com grandes filmes brasileiros (embora essa seja uma ideia legal; quem sabe, num próximo post…). A nossa proposta de hoje é trazer filmes de diversas épocas e origens que flertam com questões mais que atuais da sociedade brasileira nesses últimos tempos. Portanto, caro leitor, prepare os dedinhos para reclamar muito no Facebook que lá vem a hashtag polêmica!

Tema do momento: redução da maioridade penal

Se você está dando graças a Deus que o Eduardo Cunha inconstitucionalmente colocou a redução da maioridade penal no Brasil um pezinho mais próximo da aprovação, talvez vá curtir “Batalha Real” (2000), de Kinji Fukasaku. O filme japonês baseado no livro de Koushun Takami ficou conhecido a partir da adaptação para mangá e, posteriormente, para o cinema. A trama se passa num futuro não muito distante, no qual acontece periodicamente um torneio comandado pela chamada República do Leste Asiático.

E o que rola nesse torneio? Uma turma de estudantes deve matar uns aos outros até restar apenas um, cumprindo assim uma demanda social apontada pelo próprio governo. O clima de terror psicológico implantado nessa sociedade, aliado ao torneio extremo, despertam instintos de sobrevivência nos jovens “competidores” que só conseguem escape através da violência, seguindo bem a linha “0 ou 80” do lema “bandido bom é bandido morto”.

Se você vê esse papo de redução da maioridade penal com maus olhos, vá sem medo na locadora ou torrent mais próximo e aposte em “Os Incompreendidos” (1959), de François Truffaut. O premiado longa de estreia do francês apresenta a vida do menino Antoine Doinel (Jean‑Pierre Léaud), uma criança que vive com pais bem irresponsáveis numa vizinhança nada interessante.

Na escola, ele é vítima de uma educação opressora, encontrando apenas nas ruas e nas travessuras alguma felicidade, o que faz com que o menino, sem orientação ou carinho por parte dos adultos que o cerca, flerte constantemente com a marginalidade. “Os Incompreendidos” é um retrato emocionante de como uma criança pode ficar perdida quanto carece a ela educação por parte de escola e pais, problematizando muito bem o papel de ambos na formação dos pequenos, apesar de se sua trama se desenrolar a partir da visão do jovem protagonista.

Tema do momento: corrupção e governo

Vai ter reprise sim! “V de Vingança” (2005), de James McTeigue, é uma adaptação dos quadrinhos de Alan Moore que continua apelando ao público como metáfora de poder opressivo do governo sob a sociedade. A metáfora se estende ainda mais ao mostrar como poderes quase ilimitados corrompem a elite, como bem vemos na figura do Alto Chanceler Adam Sutler (John Hurt) ou de um clérigo de estranhas preferências sexuais que surge no caminho dos protagonistas V (Hugo Weaving) e Eve (Natalie Portman). Além disso, é claro no filme que as características dessa sociedade distópica de “V de Vingança” flertam com o racismo, preconceito contra homossexuais e fascismo em geral, tudo em nome não de princípios morais, mas sim da pura dominação.

Tirando os pés da ficção, temos o documentário “We Steal Secrets: The Story of WikiLeaks” (2013), de Alex Gibney. O diretor pode até ter um gosto por dar boas manipuladas nos conteúdos polêmicos que escolhe (vide “Taxi to the Dark Side”, de 2007), mas não deixa de ser chocante de qualquer forma a história do nascimento do Wikileaks e a dimensão das informações que vieram à tona ao público graças ao seu criador, o australiano Julian Assange.

Documentos secretos sobre execuções ilegais no Quênia, crimes de guerra no Iraque e Afeganistão e casos de corrupção bancária na Islândia são alguns exemplos do que Assange e o Wikileaks trouxeram à tona sobre governos e grandes instituições corruptos ao redor do mundo. Como nem tudo são flores, ele próprio se mostra como uma figura controversa, acusado de assédio sexual por várias vítimas.

Tema do momento: direitos dos homossexuais

Ainda na onda dos documentários, o filme “Outrage” (2009), de Kirby Dick, expõe como os direitos dos homossexuais na política norte-americana são tolhidos, ironicamente, por vários políticos que são gays “no armário”. O documentário traz uma ótica interessante ao expor como essas pessoas seguem uma agenda delimitada não tanto por convicções morais, mas sim pelo dinheiro.

Outro ponto curioso de “Outrage” é mostrar como são os acordos entre empresas e governo, a partir do que se define da esfera política em termos de direitos civis. Dessa forma, o filme traz um interessante panorama de uma questão que hoje está longe de estar apenas na esfera das relações íntimas das pessoas.

Impossível não citar também o filme “Milk – A Voz da Igualdade” (2008), de Gus Van Sant. O filme acompanha a história real do protagonista, Harvey Milk (Sean Penn), que nos anos 1970 lutou ativamente a favor dos direitos civis na cidade de São Francisco, ainda hoje considerada uma das mais liberais nos EUA, e se tornou o primeiro gay assumido a alcançar um cargo público de importância nos Estados Unidos.

Não bastasse o tema polêmico, o filme é realmente bem feito, com um roteiro que nunca perde o fôlego, bela fotografia granulada e, em especial, um ótimo trabalho de interpretação de Penn. Não por acaso, recebeu o Oscar em 2008 de Melhor Ator e Melhor Roteiro, além de ter concorrido em outras seis categorias.

Tema do momento: Crise econômica

O documentário “A Corporação” (2003), de Mark Achbar e Jennifer Abbott, pode não mostrar, à primeira vista, como a atuação de grandes empresas, que empregam milhões de pessoas ao redor do mundo, relaciona-se com crises econômicas. Mas quando o filme detalha a exploração de trabalhadores, às vezes em situações análogas à escravidão, aproveitando-se de expansões em países pobres para produzir mais pagando menos, fica claro o quanto os gigantes corporativos se aproveitam de países em clima político e social instável para faturar alto.

O filme ganha pontos ao se distanciar de possíveis discursos panfletários de esquerda para fazer sua crítica, expondo falas de pessoas que fizeram parte de grandes empresas, além de pesquisadores de áreas diversas como economia e sociologia. Assim fica fácil perceber como países ditos de Terceiro Mundo, com suas desigualdades e toda sorte de problemas, são parte da engrenagem de um sistema no qual os mais ricos têm aval para explorar os mais pobres.

Olhando o tema pela ótica não das grandes empresas, mas do homem comum, A Felicidade Não Se Compra (1946), de Frank Capra, é o clássico que encerra essa lista do Cine Set em tom de otimismo. A crise econômica de 1929 é um significativo acontecimento no universo do filme, que mostra como George Bailey (James Stewart) pondera o suicídio após uma vida inteira de sacrifícios para ver sua comunidade e amigos bem.

No entanto, o filme mostra como o herói, por mais percalços que tenha passado, tenta se manter íntegro. Como recompensa, ele é ajudado por sua comunidade, mostrando como a solidariedade pode ser uma saída para os problemas não apenas econômicos, mas humanos num sentido mais amplo.

E você, que outros filmes consegue relacionar a temas do momento?