É impossível falar de Robert Langdon (Tom Hanks) e não lembrar-se de O Código Da Vinci (2006). Fazem dez anos que o romance de Dan Brown foi adaptado para o cinema e causou um tremendo rebuliço, despertando até mesmo pesquisas científicas e declarações do Vaticano sobre o tema. Inferno volta a ter os mesmos insights que a primeira adaptação cinematográfica com o professor de simbologia de Cambridge e que esteve um tanto adormecido em Anjos e Demônios (2009).

O protagonista da franquia, mais uma vez, está envolto em perseguições e pistas carregadas de valor histórico; se antes ligado à religião, desta vez, o filme tem uma conotação mais literária que religiosa e busca o subsídio da trama na problemática levantada por Malthus e que se mostrou não tão real quanto ele esperava, e aí reside um dos elos fracos de Inferno.

Inferno, com Tom Hanks

Superpopulação

O economista inglês acreditava que, ao final de dois séculos, a população cresceria tanto que algo deveria ser feito para que não morressem de inanição. Suas ideias se baseavam, entre outras coisas, na redução da taxa de natalidade que, alias, é uma das medidas citadas no filme. O idealista da sequência é o milionário Zobrist (Ben Foster), que vem com uma roupagem nova das teorias malthusianas e, assim como Joe Carroll (James Purefoy), arrasta centenas de pessoas com seu plano de levar adiante as medidas de Malthus.

O problema é que, em nenhum momento, ele representa uma chantagem real ou mete medo no espectador. O filme é rápido demais pra que algum tipo de reação se crie às “ameaças” propostas contra o mundo. As próprias respostas de Langdon ao enigma deixado por Zobrist não são tão entusiasmantes. Há diversos furos no roteiro, que perde a coesão e mergulha um pouco no absurdo irreal e ilógico. Diferentemente dos anteriores, em que havia procuras e alguma espécie de quebra-cabeça mental, mesmo que fracos, nesse não há.

Inferno, com Tom Hanks e Felicity Jones

Repetição e previsibilidade

As peças na trama continuam as mesmas. A direção de Howard contribui de certa forma pra isso. Não há um acréscimo do que já foi visto nas outras narrativas envolvendo Langdon, há apenas uma repetição de fórmulas utilizadas anteriormente: um mistério, Langdon sendo empurrado pra ele, Langdon perseguido, uma mulher como parceira de perseguição, as organizações governamentais à sua procura, um lacaio para fazer o trabalho sujo enquanto protege uma ideologia e seu algoz ser alguém em quem se confia. Parece spoiler, mas se você pensar em O Código Da Vinci (2006) e Anjos e Demônios (2009) e revê-los, vai estar na sua tela todos esses elementos. É um padrão no universo Brown e que Howard inclui em seus filmes.

Inferno, com Tom Hanks e Felicity Jones

Ritmo

Não se pode tirar o mérito da história contada em elipses. Os devaneios do professor e a câmera subjetiva utilizada nesses momentos ofertam um quê de diferente fotograficamente à terceira sequência inspirada em Brown, mas é apenas isso. A montagem não facilita pra que a narrativa consiga ser construída por meio das memórias, que são por vezes confusas, quando não óbvias.

O início da projeção até conduz a esperança de que o filme será ágil. A montagem é acelerada e os quadros são jogados na tela de forma frenética, ativando a atenção do espectador, que vai se dispersando no restante dos 120 minutos de sequências contínuas e com pouco ritmo.

Tom Hanks em Inferno

Atuações

O que ainda segura a trama são as atuações de Omar Sy, a quem se acompanha torcendo pelo desenrolar da personagem, e um pouco de Felicity Jones, que está no papel de Langdon girl, um tanto controladora, mas com uma construção de personagem frágil. Carregada de clichês, ela se torna um alvo fácil de desconfiança por parte do espectador mais atento.

Ben Foster, que está se especializando em ser coadjuvante, dá um tom pouco carismático ao milionário que motiva toda a caçada pelo Inferno e que deposita sua caçada na referência maior de Inferno que a crença popular adota, até mais que a própria Bíblia. E este é mais um elo fraco da narrativa: se você conhece um pouco da Divina Comédia, vai perceber desde o início qual o desenrolar da trama.

Quanto a Hanks, ele entrega um Robert Langdon falante, mas calado – como é descrito no próprio filme. O ator que já encantou o mundo como Forrest Gump e preso numa ilha com a bola Wilson, parece cansado a trama toda. Ligado no piloto automático e falando muito, mas como se fosse um guia idoso de museu. Sem emoções, apenas transmitindo as informações perguntadas.

Devido aos apoios coadjuvantes, nem mesmo para explicar a simbologia de Alighieri é tão necessário quanto foi ao apresentar os illuminati e o cristianismo apócrifo. Ele chega a ser eclipsado por seus colegas de cena e ter uma presença frígida.

E, por falar em coadjuvantes, é válido ressaltar que, dos três filmes, esta é a sequência com o maior número de mulheres com papéis importantes, embora ainda poucos.

Inferno pode até convencer quem vai assisti-lo para acompanhar o andamento dos mistérios de Langdon. Mas quem sabe esta não seja a hora para o professor aposentar suas aventuras e apenas continuar nos livros? Quem sabe, seja melhor ficar apenas na memória dos fãs.