Garotinho loiro com problemas de crescimento aprende algumas importantes lições durante a Segunda Guerra Mundial, numa história com tons fantásticos – para os cinéfilos mais aplicados, essa sinopse imediatamente remete a O Tambor (1979), clássico alemão do diretor Volker Schlöndorrf, premiado em Cannes e pelo Oscar. Essa sinopse também se aplica a este Little Boy: Além do Impossível, porém, embora o trabalho do diretor Alejandro Monteverde até desperte lembranças do longa alemão, as comparações se encerram aí. Enquanto O Tambor era ousado e imprevisível, com um senso de humor maluco, Little Boy é seguro, bonitinho e genérico, uma fábula que não encanta, apesar de ser bem produzida.

Na trama, o Little Boy do título (interpretado por Jakob Salvati) vive na cidadezinha californiana de O’Hare. Seu nome verdadeiro é Pepper Busbee (um Pimentinha!) e ele está demorando a crescer, por isso sofre nas mãos das crianças maiores. Seu único amigo é o pai James (Michael Rappaport). E é James quem terá de ir à guerra no Pacífico, deixando sua família, e especialmente seu filho, sozinha e temendo pela sua morte. Incentivado pelo padre da cidade (Tom Wilkinson), o Little Boy acaba cumprindo algumas tarefas para fortalecer a sua fé – o menino acredita ter poderes como os do mágico a que ele vê no cinema – e começa a conviver com o senhor Hashimoto (Cary-Hirouyuki Tagawa), o único japonês da cidade. Essa convivência trará mudanças para as vidas do garoto e daqueles ao seu redor.

Little Boy é uma coprodução Estados Unidos/México e tem entre os produtores a atriz Roma Downey, conhecida por produzir filmes religiosos e pelo seriado de TV O Toque de um Anjo. Isso pode explicar a importância da religião na trama: o padre é visto como símbolo da sabedoria e alimenta a crença do menino no poder do impossível e na força da sua mente. Felizmente, o proselitismo religioso não força muito a barra – embora esteja claramente presente na história – mas, no fim das contas, é inegável que o filme foi feito para enfatizar valores como a importância da família e da religião para a vida.

Nada contra, porém, sua visão é também muito questionável por idealizar demais a vida nos Estados Unidos e só se preocupar, realmente, com a família americana, e a conclusão medrosa apenas reforça isso. O filme pode alardear o poder da religião e mostrar o preconceito como algo negativo, mas, no fim de tudo, nenhum dos personagens realmente aprende nada por causa da conclusão sem força; e a família é importante, desde que seja a família americana branca. A guerra pode matar milhões, mas a única preocupação do roteiro e do filme é o destino daquele grupo familiar.

Tecnicamente, Little Boy é muito bem produzido, bem filmado e, geralmente, bem defendido pelos seus atores. Mas uma olhada com mais atenção revela como esses valores de produção são genéricos. A narração em voice-over claramente busca imitar o Morgan Freeman e a fotografia é tão clara e plasticamente limpa que lembra as cenas fantasiosas de Peixe Grande (2003) de Tim Burton, porém sem o contraponto das cenas “reais” que davam àquele filme a sua força emocional. Pena que Alejandro Monteverde não seja um Burton – nem do pálido Burton atual ele chega perto. Seu filme acaba sem conflito porque todos os personagens parecem idealizados, perfeitos demais, vivendo em função da trama e da mensagem do filme, até mesmo quando se comportam mal.

Para seu mérito, Monteverde conseguiu reunir um elenco forte e até eclético: em Little Boy, convivem juntos o comediante Kevin James e atores experientes e de grandeza como Tom Wilkinson e Emily Watson (a nova mãezona do cinema). Wilkinson e Watson estão sólidos, como sempre, mas James poderia ser cortado da história e não faria falta. Rappaport não tem muito tempo para tornar o pai da família uma figura marcante, e David Henrie como o irmão mais velho London é desinteressante. E no papel principal, o garotinho Salvati praticamente é o espelho do filme: loirinho e bochechudo, ele é adorável, mas é inexpressivo e monótono, parecendo ter sido contratado apenas por sua aparência. Mas, para ser justo com Salvati, há pelo menos uma cena no filme na qual ele demonstra talento como intérprete, uma próxima ao final, quando ele se emociona.

Falando nisso, há também uma grande ideia em Little Boy, meio escondida no meio da narrativa, um momento de ironia dramática sensacional envolvendo o fim da Segunda Guerra e que rende, nas mãos de Monteverde, ao menos uma bela imagem, a do sonho do Little Boy em meio às ruínas de Hiroshima. Little Boy é um filme com boas intenções, mas é superficial demais e preocupa-se apenas com suas imagens e a sua mensagem, quando essas coisas deveriam vir organicamente, de dentro da sua história. É um filme que reduz a força infantil e o desejo de acreditar em algo a uma imagem engraçadinha, a do pequeno Jakob Salvati erguendo os braços, fazendo caretas e buscando mover as coisas com sua mente, como um mini-Jedi. E essa imagem fica mais engraçada à medida que o diretor a reencena, um efeito de humor involuntário não antecipado pelo cineasta. Como seu protagonista, Little Boy é bonitinho, mas muito pequeno.