icole, uma guia turística de 25 anos, faz uma careta quando o nome do “el patrón” surge na conversa: apesar de entender o interesse que Pablo Escobar desperta, insiste em que os colombianos já viraram a página desse obscuro capítulo.

Entre as praças em art déco e a igreja barroca La Candelaria, no coração do centro histórico de Bogotá, seus moradores preferem discutir qualquer outro assunto: economia, futebol e até mesmo o último disco de Shakira.

A série “Narcos”, criada pela Netflix para entrar no lucrativo mercado latino-americano, sempre foi difícil de vender no país que a inspirou.

Este popular programa da plataforma de streaming, que há poucos dias iniciou sua terceira temporada, também levou à criação de centenas de empregos e ajudou a mostrar algumas das muitas belezas naturais da Colômbia.

Mas o enredo recria esse passado de uma Colômbia refém de narcotraficantes, políticos corruptos e um conflito civil que deixou 260 mil mortos e sete milhões de pessoas deslocadas.

Embora os críticos locais reconheçam a qualidade da produção, criticam fortemente os sotaques dos atores não colombianos e a imagem vendida do país.

“Há resistência à imagem do narco colombiano, e entendo por que isso acontece. No mundo, a Colômbia está associada a drogas e, se tivermos sorte, a Gabriel García Márquez e jogadores de futebol”, afirma Andi Baiz, produtor-executivo da série e que dirigiu vários episódios, incluindo o final de cada temporada.

Ele é um dos muitos colombianos que trabalham em “Narcos” e defende a ideia de fazer justiça ao país.

Polêmica

Daniel Lara-Agudelo, um telespectador cujos pais moravam na Medellín de Escobar, lembra como conviveu com uma imagem do colombiano relacionada a drogas e violência.

“As pessoas têm que entender que Pablo Escobar foi um assassino há mais de duas décadas e que a violência, embora continue, nem passa perto do que era”, escreveu em um fórum on-line aberto pela Netflix – que não divulga números de audiência de seus programas – para receber reações sobre a série na Colômbia.

Michael Stahl-David, que interpreta o agente da DEA Chris Feistl, disse a repórteres em Bogotá antes da estreia da terceira temporada que se esforçou para mostrar a seus seguidores nas redes sociais os infinitos atrativos da Colômbia.

Ele mesmo admitiu que, antes de viajar para gravar – no departamento do Valle del Cauca, onde surgiu o cartel de Cali -, tinha uma visão “estereotipada e obsoleta” de um país “superperigoso”.

“É um programa polêmico, embora nunca tenha havido hostilidade”, disse ele.

Resistência

“Há um esforço das pessoas para que se entenda que somos muito mais do que isso. Que nossa cultura, música, artes, resistência são muito importantes, mas ‘Narcos’ realmente tem mostrado isso também”, assegura Baiz.

Entre os esforços da Colômbia está a assinatura do acordo de paz com os guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e uma economia em crescimento – em parte graças ao turismo.

Taliana Vargas interpreta Paola Salcedo, a esposa do chefe da segurança do cartel de Cali, que colabora com o DEA para derrubá-lo.

“Nem todos os países têm a oportunidade de contar sua história”, disse Taliana, que foi Miss Colômbia 2007, hoje com 29 anos.

“É uma história que machuca. Foi terrível passar por isso, mas, como país, não estamos mais naquela posição. Olhar para trás e saber que passou nos dá mais força para avançar para o futuro”, reflete.