Fazer filmes é um trabalho de equipe. Essa constatação óbvia, mas às vezes esquecida, é o principio norteador por trás das atividades de um grupo de cineastas determinados a fazer trabalhos diferenciados dentro da cena manauara. Afinal, o cineasta Rodrigo “Rod” Castro é enfático em dizer: “Eu não acredito em um coletivo no qual só se destaca um autor. Por isso, já combinamos entre nós: quem quer que vença alguma coisa no Amazonas Film Festival desse ano, em qualquer categoria, vamos subir nós seis no palco”.

O grupo é formado por Castro e pelos cineastas Leonardo Mancini, Emerson Medina, Rafael Lima, Diego Nogueira, Moacyr Massulo e o diretor de fotografia Leandro Resende. Eles têm características em comum: são crias do Amazonas Film Festival e demonstraram interesse em realizar seus projetos após frequentarem o festival ao longo dos anos. Todos se encantaram ainda jovens pelo cinema, por intermédio de pais ou familiares. E todos se ajudam na produção de seus curtas, executando diversas funções nos filmes uns dos outros, rodados sem o apoio de editais ou de outros financiamentos públicos.

Essa turma tem influências e gostos variados. Rod Castro, por exemplo, diz ser “filho” de três mestres cineastas: “Billy Wilder, que escrevia muito bem; Ingmar Bergman, porque ninguém vai fazer filmes sobre mulheres como ele fazia, e o Alfred Hitchcock”. Já Leonardo Mancini, por exemplo, gosta dos franceses François Truffaut e Jean-Luc Godard e dos americanos Quentin Tarantino, Paul Thomas Anderson e Martin Scorsese. “Todo mundo que imita o Scorsese se dá bem”, afirma, meio sério meio de brincadeira.

Emerson Medina afirma transitar pela cinematografia de Tarantino e Ridley Scott. Rafael Lima curte Wes Anderson e seus visuais alternativos. Diego Nogueira, o mais jovem, consegue conciliar Woody Allen (“sensacional”, na sua opinião) com Christopher Nolan. E Moacir aprecia um pessoal mais antigo – além de Allen, admira também Roman Polanski e Michelangelo Antonioni. Era de se esperar que preferências tão diversas produzissem atritos no grupo, mas isso aparentemente não chega a acontecer. De fato, fica a impressão de que eles se complementam, e um contribui para a cultura cinematográfica do outro.

E cultura cinematográfica eles têm. Castro, por exemplo, fez curso com o renomado crítico Celso Sabadin e depois fez a pós-graduação de cinema da Uninorte; Lima estudou na Film Academy de Nova York; e Mancini estudou em São Paulo na Academia Internacional de Cinema e depois frequentou a Film Academy de Los Angeles. Além deles, Medina é jornalista com pós-graduação em artes visuais e também fez o curso intensivo de cinema da Academia Internacional de Cinema de São Paulo.  Todos trabalham e correram atrás das suas formações, encaradas pelo grupo como investimento.

A história deles enquanto realizadores está intrinsicamente ligada à história do Amazonas Film Festival. Medina, por exemplo, teve seu roteiro Criminosos premiado no concurso de roteiro no festival. Diego Nogueira também teve seu curta Póstumo premiado como Melhor Roteiro no festival. Medina, Castro e Mancini se conheceram trabalhando numa agência de publicidade, onde surgiu a ideia para o curta-metragem A Lista, em fase de finalização. Com o apoio de produtoras e empresas como a Sambatango Filmes, Plano A, 6O2 Filmes e Estúdio Castanheira, a turma conseguiu ter acesso a bons equipamentos.

Mais do que isso, porém, essa infraestrutura os possibilitou a adotar uma mentalidade mais profissional em relação às suas atividades cinematográficas. “A gente realmente distribui funções e todo mundo participa. As pessoas precisam começar a ser ver como profissionais. Temos que mostrar pras pessoas que não fazemos vídeo. Eu, pelo menos, quero fazer cinema, e essa é uma outra parada”, afirma Castro.

Por terem essa mentalidade e estarem tão ligados ao Amazonas Film Festival, o grupo é unânime em discordar da infeliz decisão da Secretaria de Estado de Cultura de não realizar o tapete vermelho na edição deste ano. Desde o início o festival se posicionou como uma vitrine, para atrair a atenção do mundo cinematográfico para a região amazônica. Mas essa vitrine tem dois lados: o festival também sempre possibilitou aos talentos locais uma oportunidade sem igual de exibir seus trabalhos.

O festival é a chance inestimável de profissionais terem contato com nomes influentes do cinema nacional e internacional. Castro deu um exemplo: “Na edição de 2012, um dos jurados, que era lá de São Paulo, falou do meu curta “EtSetEra” para um cara que trabalha na HBO de São Paulo. Quer dizer, a chance que se tem de fazer contato com um pessoal desses é no festival. Então por que cortar isso? É uma chance que se pode ter!”.

Lima também ressalta outro lado da situação: “As pessoas precisam ter visão de prospecção. Se você não mostrar seu filme, ele vai morrer numa gaveta, e só a sua namorada vai ver. Nós sempre tivemos vontade de fazer cinema, mas fizemos outras faculdades por segurança e só depois fomos correr atrás disso. Por isso, eu acho legal fazermos filmes e ter um festival que traz visibilidade. As pessoas que veem nossos filmes podem acreditar que se pode viver de cinema, que é possível pular essa etapa de se fazer outra carreira. Esse é pior prejuízo do festival perder sua visibilidade”.

Polêmicas à parte, o grupo ainda se mostra empolgado com o festival deste ano. Pelo que se pode perceber dos novos trabalhos desse pessoal (ainda não finalizados), os curtas deles mostram, além de competência técnica, irreverência, bom humor e uma visão diferenciada. Este, inclusive, é um dos aspectos mais importantes para Rodrigo Castro. “Essa é a minha chance de fazer algo diferente”, diz.

Portanto, vale a pena prestar atenção aos curtas A Lista, Papo de Elevador, Mau Hábito, Germes e Quando um Homem Diz Amém caso sejam indicados na edição 2013 do Amazonas Film Festival. O entusiasmo dos seus realizadores é visível, eles são independentes, têm conhecimento de cinema e também vontade de transgredir as regras. Esse grupo parece apontar um novo caminho para as produções locais.