Roberto Roger é das figuras mais elegantes e polidas do “meio cinematográfico” amazonense. Sempre educado e aberto ao diálogo, o realizador certamente é um dos nomes mais queridos do cinema local, levando muito a sério o ato de se fazer um filme.

Não à toa que o Teatro da Instalação estava completamente lotado para a estreia de “O Brilho da Estrela”. Ao término da sessão, era perfeitamente possível ver sorrisos por todos os lados, aplausos entusiasmados e elogios que se repetiam sem parar.

Situações como essas me deixam sem saber bem o que fazer, pois, creio que vi um filme completamente diferente das outras pessoas, podendo tornar a minha opinião algo muito difícil de se entender.

Acredito, verdadeiramente, que os elogios que ouvi eram sinceros, mas também que se trata de um olhar diferente. É o olhar de quem vai prestigiar o filme para ver suas qualidades, valorizar o difícil trabalho que é produzir um filme e parabenizar a equipe por sua disposição e coragem de terem se embrenhado nesse difícil mundo das artes, algo muito menos glamoroso do que parece.

Mas o meu olhar não pode ser esse. Não vou procurar defeitos, mas ver o trabalho com um olhar neutro. Vou sem simpatia ou antipatia prévia, ver se o filme me emociona, me impressiona ou não. Por ter lido sobre e visto um pouco mais de filmes, fica mais fácil ver os tais “defeitos implicantes” que tantos criticam, mas que são falhas que atrapalham o decorrer do filme em vários aspectos.

Dito isso, por respeito ao trabalho, por respeito a Roberto Roger, é que acredito que devo manifestar a minha opinião de maneira sincera, justamente por esperar que dessa forma possa contribuir de alguma forma com o seu crescimento.

“O Brilho da Estrela” conta a história da cantora amazonense Kátia Maria (Carla Menezes), famosa em Manaus na era de ouro do rádio amazonense, mas que devido ao vício com o álcool, sua carreira foi caindo no esquecimento com o passar dos anos. Depois de muito tempo esquecida, Kátia retorna aos palcos, convidada pelo programa Carrossel da Saudade, e assim pode reencontrar um pouco do sucesso de sua juventude.

Fica evidente sobre o trabalho é que ele, apesar de bem intencionado, erra no tom da mistura entre documentário e ficção, e acaba resultando numa espécie de programa de TV em homenagem a Kátia Maria.

O didatismo com que Roger intercala os depoimentos da cantora com a representação dos mesmos, agrega um tom repetitivo à trama, visto que sempre ouvimos Kátia Maria contando determinado momento, pra na sequência vermos, de forma previsível e burocrática, esse fato interpretado por atores.

Além disso, a direção erra ao tentar trazer um tom declamado aos depoimentos da cantora na parte documental, o que traz um artificialismo desagradável, uma espécie de rebuscamento desnecessário, fragilizando a trama contada. E a própria história de vida de Kátia Maria é narrada de maneira pouco explorada. Primeiro ele mostra que ela conseguiu se tornar conhecida, tocava nas rádios da cidade, mas, na sequência, ela já está grávida de dois filhos e perdida no vício do álcool. Não demora muito para mostrar a cantora com 60 anos em decadência. Falta paciência, cadência para vermos o que aconteceu entre esses momentos, para compreender melhor suas motivações. A trama foi desenvolvida de maneira abrupta, deixando que acontecimentos importantes passassem de maneira repentina ou sequer estivessem em cena.

A fotografia de J Leonardo definitivamente falha ao tentar trazer um tom antiquado para as imagens, trazendo um sépia e, em outros momentos, uma imagem azulada que são extremamente artificiais, soando como um maneirismo que chama demais a atenção pra si de maneira negativa, além de apresentar falhas grosseiras de iluminação. A montagem, também de Leonardo, mostra-se equivocada, como ao fazer uso exagerado de fades intercalando os depoimentos, tentando trazer um desnecessário ar nostálgico para o momento, atrapalhando a fluidez do trabalho, deixando-o com a impressão de ser repetitivo e cansativo, além do fato de que o corte seco era o ideal para o momento. Soma-se a isso o uso ininterrupto de uma trilha sonora melosa e genérica, que faz com que se torne evidente que o trabalho soma vários aspectos de sua linguagem para dizer rigorosamente a mesma coisa, com a fotografia, montagem, direção, trilha sonora e atuações cumprindo o mesmo papel, bastante restrito.

Todo esse didatismo passa a impressão de que estamos assistindo um programa de TV. Inicia-se como um “Por Toda a Minha Vida”, com os depoimentos de Kátia Maria e as representações na sequência. E no seu desfecho, parece um Arquivo Confidencial, do programa do Faustão, com aquelas falas de pessoas que passaram por sua vida.

Isso pode até parecer algo sem importância se o que se está vendo funciona ao assistir. Não é o caso, visto que os defeitos citados atrapalham a narrativa, e mesmo se funcionasse, isso ainda assim seria um problema visto que se trata de uma obra cinematográfica, não um programa de TV. Ambos tem linguagens completamente diferentes e ignorar isso é não compreender como se conta uma história em cada um dos veículos citados.

E constatar isso é uma pena, pois Kátia Maria parece ser uma boa personagem, tem uma interessante história de vida. Carla Menezes, atriz reconhecidamente talentosa por seu sólido trabalho no grupo de Teatro Experimental do Sesc, aparece má aproveitada em cenas com marcações problemáticas e de pouca densidade, evidenciando uma série de fraquezas do roteiro, fazendo com que os esforços do bom elenco tornem-se insatisfatórios para o sucesso do trabalho.

Mesmo que possa soar estranho, acredito que a noite de 13 de fevereiro mostrou-se como uma das mais importantes da história recente do cinema amazonense, com toda aquela gente saindo de casa com suas melhores roupas em uma noite chuvosa de quinta-feira para prestigiar um filme amazonense. Podia ser melhor, sem dúvida, mas sei que Roberto Roger vai voltar mais seguro, e com um trabalho que apresente um melhor resultado.

NOTA: 3,5