No primeiro instante, é difícil assistir “O Método Kominsky” e desassociá-la de “Grace and Frankie”. As duas produções bebem do mesmo conceito: abordar os conflitos que envolvem a terceira idade. O interessante é a escolha tomada por seus criadores de tratar essa fase da vida de forma leve, descontraída e desmistificando o clichê dos idosos já terem experimentado tudo que a vida tinha a lhes oferecer e se tornaram sábios eremitas.

Criada por Chuck Lorre, “O Método Kominsky” trilha um caminho diferente do que se está habituado a contemplar do showruner. Mesmo que muitos aspectos que tornaram seu selo de comédia mundialmente rentável, ainda estejam presente.  Aqui, ele traz para essa narrativa dois amigos (Michael Douglas e Alan Arkin) que precisam lidar com a morte, problemas financeiros e amorosos, enquanto acompanham seu próprio processo de envelhecimento. E tudo isso acompanhado por um humor simples, agradável e tocante.

É curioso notar o quanto produções representativas sobre a terceira idade têm ganhado espaço de tela na última década. Mais ainda é perceber como os produtores e roteiristas se mostram atentos a subverter certos padrões outrora estabelecidos pela indústria audiovisual, sendo Lorre eficaz ao executar subversões sutis em seu texto. Isso se demonstra, principalmente, pelo sabor realístico que há nas entrelinhas de seus personagens, deixando um gosto final amargo na mais inocente das risadas arrancadas de suas tiradas. Afinal, assim como afirma Norman (Arkin), todos caminhamos para o mesmo fim. Diante disso, até onde vai a nossa existência?


O enfrentamento do luto

Um dos pontos mais cativantes no personagem de Alan Arkin é essa não-busca pela existência. É o que há de mais engraçado e palpável na série. Há muito de pais, avós e maridos nele. Especialmente, aqueles que se tornam tão dependentes da esposa que não conseguem trilhar seu caminho na ausência delas. E a forma que Lorre encontra para abordar esse questionamento tão presente nas famílias é estimável. Embora Michael Douglas seja o grande nome do projeto – ele também assina a produção executiva –, Arkin é quem rouba a cena. Seu personagem é rabugento e mal-humorado, mas isso evidencia o casulo no qual ele esconde a dor de perder a esposa e se sentir desnorteado.

Enfrentar o luto é uma das temáticas que perpassa todos os episódios, o que torna a condução da trama linear, sem quedas de ritmo. A morte de Eileen (Susan Sullivan) e a reação a ela é o grande condutor de “O Método Kominsky”. Porque serve para mostrar como nos preparamos para o próximo estágio de nossas vidas e o quanto envelhecer ainda nos assusta. Mesmo que o cinema e a TV estejam se preocupando em demonstrar que a terceira idade é um momento como outro qualquer, ainda não estamos preparados para realmente enfrentar a proximidade com a morte. Seja a nossa ou daqueles que estão próximos de nós. É tanto que cada personagem lida com a partida de formas diferentes e até o último episódio eles ainda estão tentando encontrar um meio de suportar essa separação.


Mesmo acerto, mesmos erros

Acontece um acerto contraditório na produção: por um lado, seguir o envelhecimento de dois homens com propostas de vida divergentes é intrigante. Enquanto Sandy (Douglas) tem medo de relacionamentos e vive como se fosse um jovem adulto irresponsável tanto financeira quanto emocionalmente, Norman amou uma única mulher por 46 anos e construiu um império. Ver como esses dois organismos se ajustam e se complementam dá picos de prazer durante a projeção.

A química entre os veteranos do cinema é instantânea e deliciosa, ajudando a tornar todo o clima da série pessoal. É como se os dois personagens pertencessem ao nosso cotidiano. Especialmente pelo texto rememorar constantemente os lados negativos e positivos de envelhecer. Desse modo, o humor apresentado é melancólico, com um gosto agridoce de que mesmo que o exposto seja engraçado naquela situação, é algo que todos nós passaremos um dia. Lorre consegue o equilíbrio entre o drama e a comédia: enquanto faz rir, também leva a refletir e até mesmo arranca alguns suspiros.

Entretanto, a insistência sobre o patriarcado e contar histórias sobre homens brancos, ricos e privilegiados é algo que precisa ser revisto nas produções audiovisuais. Mesmo que procure mostrar como pessoas do sexo masculino tentam enfrentar a morte e outras questões humanas como solidão, declínio profissional, problemas e próstata. A impressão que deixa é apenas uma nova abordagem de como enxergar os problemas do homem privilegiado de meia idade. Claro que a parceria entre os dois atores é o que há de mais impressionante na série, mas o que custava, ao menos, a presença como coadjuvantes de pessoas que fujam ao padrão?

Apesar disso, “O Método Kominsky” é uma das gratas surpresas do catálogo Netflix – demonstrando, mais uma vez, a versatilidade das narrativas seriadas do serviço de streaming. A eficiência da parceria Michael Douglas e Alan Arkin aliada à leveza e irreverência do texto de Chuck Lorre – que o diga o funeral bizarro de Eileen – tornam o projeto memorável.