Se Renato Aragão ainda investisse no mercado cinematográfico, com certeza, “O Vendedor de Sonhos” seria mais um de seus trabalhos na sétima arte ao lado de “O Noviço Rebelde” e “O Trapalhão e A Luz Azul”. O Mestre (César Troncoso), que se autoproclama o vendedor de sonhos nos primeiros instantes da projeção, segue a mesma linha caricata, apelativa e na busca de um sentido moral na vida das pessoas próximas a si como o Trapalhão costumava fazer na década de 90. Será que estamos vendo um novo estilo de adaptação surgir?

A trama traz Dan Stulbach como um renomado psicólogo que após desistir do suicídio segue um morador de rua que lhe promete uma nova visão sobre o mundo que inclui moradia, tratamento de menores, idosos e até mesmo de pessoas com influência. Juntos, o psicólogo ao lado do mestre e mais dois moradores de rua, procuram levar uma mensagem de esperança e contra a sociedade de consumo para o maior número de pessoas que, na concepção diferenciada do mestre, estão em uma fase negativa da vida.

Para quem leu Augusto Cury, vai facilmente identificar as frases de autoajuda que é usual nos livros do escritor, e parece reverberar suas escolhas de vida na personagem título do livro. O roteiro é claramente influenciado nas frases prontas presentes no decorrer do texto literário. A todo o momento, o espectador é bombardeado por frases motivacionais encontradas nos primeiros anos de Facebook, herança de redes sociais como o Orkut e MSN, que não apenas norteiam, mas são os diálogos completos do filme e, no decorrer da projeção, tomam o lugar dos personagens e assumem o holofote da obra.

A história que realmente deveria ser o guia da narrativa cinematográfica é pouco orgânica e prioriza os discursos motivacionais e moralistas que ganham destaque em momentos inoportunos e sem razão de existirem, além de faltar coesão e sensibilidade à própria montagem/roteiro que não oferece momentos de viradas e pouco situa o que realmente está ocorrendo na obra.  Este fator também atrela-se as passagens fora de tom e que se desvinculam de tornar a narrativa algo natural.

A direção de Jayme Monjardim contribuiu para que cada escolha mal empregada ocorresse, trazendo vícios televisivos que tentam tornar a narrativa didática, mas subestima o seu público. Muito disso se deve ao melodrama que, embora aconteça tardiamente, é este desfecho um dos responsáveis por cansar o espectador. A obra tenta criar um suspense previsível, utilizando duas vertentes amarradas e preguiçosas como nas novelas televisivas.

Outro ponto impactante no filme é o efeito digital do prédio usada para o suicídio. O chroma-key é mal empregado e fica nítido a ausência do cenário real, onde o mestre e o psicólogo conversam. Mas, fora isso, a fotografia busca ressaltar os extremos de pobreza e riqueza e outros meios pontos opostos na sociedade de consumo. De forma bem pensada, a fotografia é um dos poucos eixos que situa o espectador nos eventos que permeiam a narrativa. A plasticidade presente nela faz o papel, até muitas vezes incômodo, que o roteiro deveria executar se não fosse tão preciso em pregar as filosofias de Augusto Cury de forma integral.

Outro acerto do filme está na composição do elenco. Stulbach e Troncoso fazem uma boa parceria. A caracterização dos dois é fraca e passa um tom pouco crível para um psicólogo bem sucedido que abandona tudo pra seguir um mendigo, que tem feições limpas, roupas e sapatos pouco gastos e convive sem problemas com outras pessoas, mesmo está sendo uma classe menosprezada pela sociedade que ele prega estar doente. A sua postura também é fraca diante da doença que seu personagem carrega. Mesmo assim, Troncoso rouba a cena interpretando a própria personificação de Cury.

Se pensarmos em “O Vendedor de Sonhos” como um projeto audiovisual para colocar Augusto Cury no cinema, talvez a junção de imagens com o discurso motivacional dê certo. Mas, se o colocarmos como um filme que busca algo emotivo e apelativo, ele não atinge seus objetivos e subestima seu leitor em um abuso de clichês e lições de moral.

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Volto a perguntar: será que estamos vendo um novo estilo de adaptação surgir?