Os Capacetes Brancos é uma produção original da Netflix que faturou o Oscar de melhor documentário de curta-metragem deste ano na premiação. É centrado nos civis voluntários – que usam capacetes brancos, daí o motivo do título da produção –  responsáveis em prestar auxílio às vítimas dos bombardeios na Síria, pais que está em guerra civil desde 2011, envolta atualmente na polêmica do Estado Islâmico e na intensa guerra travada com países que são grandes potências como EUA, Rússia, Inglaterra e França.

Dirigido por Orlando von Einsiedel, responsável pelo emocionalmente intenso Viruga (2014), o curta documentário não deixa de ter a sua relevância social e humanitária ao mostrar o papel dos capacetes brancos dentro dos horrores da guerra, sendo uma história realmente inspiradora, afinal a grande maioria que está na linha de frente são civis sírios – o próprio grupo se auto denomina como “a defesa civil” do país – que exercem profissões comuns da vida cotidiana como padeiro, pedreiro e ferreiro, levando vida e humanidade para ajudar pessoas que estão em áreas bombardeadas, inclusive o curta cita durante a sua projeção que o grupo salvou mais de 60 mil pessoas neste período.

Sim, a história realmente é bonita e não à toa, recebeu a indicação ao prêmio Nobel da Paz. Pena que como documentário, Os Capacetes Brancos é nada ambicioso na sua investigação sobre a atuação do próprio grupo nos resgates como da sua própria existência. Einsiedel se esforça em apresentar uma visão positiva do grupo, vendendo o seu documentário como uma propaganda humanista da entidade, ressaltando as nobres ações destes seres humanos benevolentes que se sacrificam e colocam em risco suas próprias vidas para ajudar desconhecidos.

O grande problema é que o documentário não dá um escopo substancial ao ponto de vista narrativo, de respeito ao trabalho destas pessoas, soando muitas vezes superficial e sem grande relevância no processo investigativo. Falta aquela pergunta digna de Globo Repórter: quem são, como surgiram e de onde vieram os capacetes brancos? É nítido que este olhar mais crítico é evitado a todo momento pela produção, que foge das polêmicas relacionadas ao que há nos bastidores, principalmente de onde provém o seu real financiamento e da estrutura da organização, inclusive na internet, há diversos debates questionando as ações do grupo. Logo, o curta, além de não debruçar sobre estas polêmicas, perde a oportunidade de discutir a situação política-social do país de forma mais definida, sem que fosse necessário abraçar qualquer lado político – e é fácil perceber que o documentário possui material de sobra para fazer isso e bem que poderia arriscar por esta ótica.

Na estrutura narrativa, não há nenhuma construção especial e “Capacetes” é bem irregular na sua metragem. Possui dez minutos centrados na parte mais operativa, e sem dúvida, a mais envolvente do documentário, mergulhando o público naquele mundo de pessoas, na qual medo, insegurança e impotência imperam diante de uma guerra muito maior que elas e que as destrói pouco a pouco. Se isso já ajuda a criar um elo emocional com o público, o curta-metragem acerta ao intercalar cenas de entrevistas com três capacetes voluntários e em uma delas, o homem relata que faz aquilo pensando na filha, de que ela possa viver em um mundo melhor, evocando um sentimento emocionalmente honesto ao longa. Em contrapartida, essas entrevistas apresentam outros momentos carregados de frases cheias de clichê, a maioria claramente ensaiada de frente para câmera, onde as palavras são ausentes de emoção.

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Sem qualquer explicação, a direção de Einsiedel muda seu foco, deixando o olhar mais realista das operações de resgate para centrar-se 30 minutos da sua duração, em um treinamento realizado pelo grupo na Turquia, fora da zona de conflito, que se torna enfadonho, até porque as cenas de treinamento tem pouca eficácia para o drama das personagens e ainda tira do público aquilo que até então era o seu atrativo: as intervenções de resgate dos capacetes no seu dia a dia.

É claro que há momentos ao longo do curta para se emocionar como a famosa cena do resgate de um bebê com vida de dois meses entre os destroços de um desabamento, um momento de esperança, milagre e humanidade em um espaço destronado pela guerra. O curta também dá aquele nó na garganta no espectador ao mostrar que nos lugares onde não há guerra, a visão de um avião é associada pela mente infantil como algo fascinante, enquanto nesta realidade de guerra, as crianças sírias o associam tragicamente a um arauto da morte, afinal qualquer avião sobrevoando aquele espaço bélico é a fonte de destruição por trazer bombas que exterminam suas vidas.

Capacetes Brancos tem na sua essência, uma relevância social e humana importante para se discutir nos tempos atuais, mas que perde o seu foco por colocar para debaixo do tapete, o outro lado da moeda, não mostrando as diferentes visões e percepções sobre seu objeto de estudo que poderiam deixá-lo mais complexo. É até uma história bonita, com personagens de atitudes nobres e heroicas e imagens emocionantes que infelizmente é contada de uma forma pouco relevante, tirando toda sua urgência em torno da temática e sua qualidade.