Uma vez o criativo roteirista americano Charlie Kaufman comentou sobre o seu ofício: “Uma das coisas mais importantes sobre o ato de escrever o primeiro argumento é o fato de realmente termos terminado um argumento. Ter feito isso é uma etapa muito importante — mesmo que ele seja uma porcaria. Acaba nos dando uma certa confiança para seguir em frente e fazê-lo outra vez.”

Argumento: etapa fundamental para a construção do roteiro

Talvez uns dos maiores obstáculos dos roteiristas iniciantes sejam o medo e o temor de escrever um argumento para cinema que não agrade aos outros, ou a si mesmo, pelo fato de ainda não estar com uma história razoavelmente convincente e interessante. Mas esse momento tem que ser encarado apenas como o início de um processo onde a estrutura da história ainda está sendo elaborada.

A pressão pela qualidade imediata do resultado é algo presente na vida de todos nós, em todos os setores, mas temos o dever de não nos deixar contaminar. Precisamos sempre seguir em frente, mas concentrados e serenos. Avante!

A criação do argumento é o verdadeiro grande passo para a construção do roteiro. Com ele em mãos, já se consegue ter uma visão geral da produção e analisar a viabilidade do projeto.

Assim, o argumento acaba sendo a história do filme que se pretende roteirizar escrita de forma condensada, persuasiva e objetiva (entre 5 a 20 laudas), geralmente sem diálogos, que informe os detalhes sobre a temporalidade (quantidade de tempo compreendida pela história), a localização (lugar onde acontecem as ações e o seu contexto social), a ação dramática e o perfil dos personagens.

A ação dramática é o conjunto de eventos que se interligam dentro da história junto com os personagens. É o universo criado pelo roteirista que pode ou não transitar pela representação da realidade em busca de uma verossimilhança que possa ser assimilada com maior compreensão pelo público.

O Som Ao RedorDiegese – a realidade da narrativa

Dentro da ação dramática do filme estabelecemos uma relação específica de espaço-tempo definindo uma realidade própria imposta pela narrativa. Essa realidade ficcional com regras próprias criadas pela narrativa é conhecida como diegese.

O exemplo mais comum no universo diegético de um filme é o uso do som. Na nossa realidade é extremamente raro termos uma música de fundo acompanhando algumas de nossas ações no dia a dia, mas num filme quase sempre isso acontece.

A definição do perfil dos personagens envolve algumas observações mais profundas a serem consideradas para que se consiga trabalhar um roteiro coerente e significativo. Moldar cada personagem de acordo com a história, expor os sentimentos que predominam nos personagens, definir classe social, caráter, etnia, idade, religião, profissão, escolaridade, sexualidade, desejos e frustrações são apenas alguns dos fatores a serem engendrados para que a espinha dorsal do argumento fique mais sólida.

Leia o argumento em voz alta e observe se há um fluxo na história e nos personagens

Uma dica que pode ser interessante para ter a noção exata se o argumento está seguindo uma dinâmica que desperte o interesse de quem estiver lendo é ler o próprio argumento em voz alta e procurar perceber se existe um fluxo harmonioso de informações básicas sobre a história e os personagens.

É comum um roteirista iniciante cometer muitos erros na primeira tentativa em escrever um argumento. Está bem longe de ser uma tarefa fácil. Mesmo roteiristas profissionais acabam reescrevendo cenas de seus roteiros, por motivos variados, e em alguns casos mais raros chegam até a ficarem no set de filmagem reescrevendo diálogos na hora ao gosto do freguês.

O único cuidado indispensável ao reescrever demais o argumento é manter o equilíbrio do conteúdo que já foi escrito e não desfigurar por completo a história. É preciso evitar que se perca o entusiasmo gerado no início da criação do argumento, a energia do instinto original. Pode parecer complicado, mas é assim que se começa a fazer cinema.