Nos últimos meses, a HBO lançou dois filmes bastante competentes: All The Way é estrelado por Bryan Cranston (em grande forma) e mostra a luta do presidente americano Lyndon B. Johnson para aprovar o Ato dos Direitos Civis no Congresso; já Confirmation traz Kerry Washington (em uma contida e poderosa atuação) como uma professora de direito que causou um verdadeiro terremoto na mídia no início dos anos 90 ao acusar o então candidato ao Supremo Tribunal, o juiz Clarence Thomas, de assédio sexual. Além deles, a HBO pretende lançar até o final do ano The Wizard of Lies, que mostra o esquema de corrupção montado pelo empresário Bernie Madoff e será estrelado por ninguém menos que Robert De Niro e Michelle Pfeiffer.

Todos estes filmes nos lembram como a TV, longe de ser o “primo pobre” do cinema, é capaz de trazer à tona histórias complexas e relevantes que, por tratarem de temas inusitados e de difícil comercialização nas bilheterias tradicionais, acabam encontrando na tela pequena a plataforma ideal para seu lançamento.

Por isso, o Cine Set fez uma lista com outros 10 grandes filmes lançados diretamente para TV e que merecem ser conferidos por qualquer cinéfilo.

Os Mísseis de Outubro (1974)

O filme mostra a crise política enfrentada durante treze dias em 1962 entre os governos dos EUA e URSS, no auge da Guerra Fria, quando o mundo assistiu às negociações sobre a instalação de mísseis soviéticos em Cuba. Mantendo um aspecto teatral que reforça a tensão e a claustrofobia dos escritórios onde decisões estratégicas precisaram ser tomadas em questão de segundos para evitar o início de uma 3a Guerra Mundial, o filme funciona como um belo exercício de suspense que ainda se mantém intacto mesmo após mais de 40 anos desde o seu lançamento.


E a Vida Continua (1993)

No início dos anos 90, a HBO já dava os seus primeiros passos para se tornar uma canal de referência no lançamento de filmes e séries de qualidade. “E a Vida Continua” foi um desses projetos, um filme cuja temática nenhum outro canal queria encarar. Focando no surgimento da epidemia da AIDS nos EUA durante a década de 80, o filme é uma verdadeira aula sobre os esforços da comunidade científica para tentar entender do que se tratava a doença e de que forma poderia encontrar uma cura. O filme causou polêmica ao mostrar personagens reais que, na época, estavam envolvidos em disputas judiciais para decidir quem havia “descoberto” o vírus HIV, o que definitivamente atrasou o desenvolvimento de remédios que pudessem conter o avanço da doença.


In The Gloaming (1997)    

Estréia na direção do “eterno super-homem” Christopher Reeve, In The Gloaming é um trabalho de sensibilidade ímpar. Um filho, que há anos não vê a sua família, volta para casa e reencontra os pais, apenas para lhes dar a notícia de que está com AIDS e que não possui muitos meses de vida. O elenco inteiro está soberbo, mas é preciso destacar Glenn Close, que como a mãe do garoto entrega uma das melhores atuações de sua consagrada carreira. A cena em que ela canta para o seu filho dormir é de dar um nó na garganta de qualquer um. Com apenas 60 minutos de duração, o filme impressiona pela naturalidade dos seus diálogos e pela emoção contida das suas performances, tendo como reforço as belas paisagens de outono do estado de New England.


Wit (2001)

Provando que a televisão pode ser o terreno ideal para grandes talentos do cinema, o diretor Mike Nichols (dos clássicos “Quem Tem Medo de Virginia Woolf” e “A Primeira Noite de Um Homem) e a atriz Emma Thompson juntaram forças em Wit, uma adaptação da HBO para uma peça teatral de mesmo nome. No filme, acompanhamos a história da Dra. Vivian Bearing, uma professora de literatura que tem sua vida alterada quando é diagnosticada com câncer. Conhecida por sempre tratar de forma rígida e pragmática os seus alunos (e na verdade, todos ao seu redor), ela passa a reavaliar o próprio comportamento quando começa a ser tratada da mesma forma pelos médicos no hospital. O tema é pesado, sem dúvida, mas o diretor encontra o equilíbrio perfeito entre a sensibilidade e pequenos momentos de alívio cômico que nos permitem seguir adiante. Enquanto isso, Thompson entrega uma das maiores atuações femininas da história, não importa se no cinema ou na televisão.


Normal (2003)

Quando Roy (Tom Wilkinson) desmaia no meio da sua festa de 25 anos de casamento com Irma (Jessica Lange) e no dia seguinte confessa ao médico que ele na verdade se sente como uma mulher presa no corpo de um homem e deseja fazer uma cirurgia de mudança de sexo, você a princípio imagina se tratar de uma grande comédia de costumes. No entanto, o que vemos se desenrolar na tela é uma belíssima história de amor e tolerância, a qual é elevada a um outro nível graças às performances do seu casal de protagonistas. Jessica Lange, em especial, consegue a proeza de se transformar no centro emocional do filme e nos faz entender a decisão de Irma em apoiar, ainda que de forma relutante, a mudança de sexo do marido. Aí está um tema que você dificilmente veria no cinema, mas que aqui produz um trabalho brilhante.


Enterrem Meu Coração na Curva do Rio (2007)

De boas intenções o inferno está cheio, já dizia o velho ditado. Neste filme podemos observar bem o significado destas palavras. Afinal, o senador americano Henry Dawes (Aidan Quinn) possui a melhor das intenções em sua luta para aprovar uma lei que garante o direito à terra aos indígenas. Porém, o seu pragmatismo (e até mesmo arrogância) ao tomar decisões unilaterais que simplesmente ignoram os desejos e anseios dos próprios indígenas que ele tanto quer ajudar, acaba não apenas dificultando a aprovação do seu projeto de lei como ainda traz consequências trágicas para um ambiente já abalado por um forte choque de culturas e interesses.


Grey Gardens (2009)

Jessica Lange e Drew Barrymore entregam performances brilhantes como Edith e Little Edie Beale, respectivamente tia e prima da ex-primeira dama Jacqueline Kennedy. O filme mostra a relação entre a mãe e filha desde a década de 30, quando eram figuras proeminentes da alta sociedade nova-iorquina, até o estado decadente em que se encontram nos anos 70, vivendo isoladas na antiga mansão da família, mas ainda cultivando sonhos de grandeza. Ambas atrizes concorreram ao prêmio de Melhor Atriz na cerimônia do Emmy, com Lange merecidamente levando a estatueta pra casa.


Temple Grandin (2010)

Filmes de superação são comuns na televisão, mas em geral a maioria deles acaba caindo no melodrama barato. Temple Grandin definitivamente não é um destes casos. Ao contar a história da personagem-título, que superou as dificuldades do autismo e se tornou PhD e uma especialista na indústria de manejo de gado, o filme evita todas as armadilhas do gênero e humaniza Temple, expondo tanto seus defeitos como suas qualidades e mostrando que foi justamente a combinação de ambos que lhe permitiu crescer e servir de exemplo para outras pessoas com autismo. O filme também se beneficia de uma direção inventiva que traduz em imagens a perspectiva de mundo da protagonista e, claro, da ótima performance de Claire Danes, que ganhou um Emmy pelo papel.


Grande Demais Para Quebrar (2011)

Antes de A Grande Aposta receber várias indicações ao Oscar (e uma estatueta por Melhor Roteiro Adaptado), um outro filme, feito para a TV, explorou as origens da crise financeira de 2008. Grande Demais para Quebrar mostra a relação promíscua entre o governo americano e os grandes bancos comerciais, os quais, para fugir da sua iminente falência, tiveram que ser salvos pelo Tio Sam com uma enorme quantia de dinheiro tirado diretamente do tesouro nacional. Dirigido por Curtis Hanson (responsável pela obra-prima Los Angeles: Cidade Proibida), o filme serve como um belo acompanhante para uma sessão tripla com A Grande Aposta e 99 Homes.


Phil Spector (2013)

Al Pacino pode não ter apresentado nenhum trabalho digno de nota no cinema desde a década de 1990. Porém, seus trabalhos na televisão mostram que o ator ainda possui talento de sobra. Em geral, as pessoas lembram apenas de Angels in America (2003) e Você Não Conhece Jack (2010), pelos quais ele ganhou o Emmy. Porém, talvez minha atuação favorita do ator em um projeto para TV seja em Phil Spector, no qual ele interpreta o lendário e excêntrico produtor musical que na década de 90 foi acusado de assassinar a modelo Lana Clarkson. Aqui, Pacino está assombroso ao nos levar para dentro da mente de um homem insuportavelmente arrogante, mas que agora, talvez pela primeira vez na vida, parece estar genuinamente assustado com que o destino lhe reserva.