Ia assistir ao filme na sexta à noite.

Sessões de sexta-feira à noite geralmente apresentam problemas. É bastante comum encontrar pessoas que estão indo a um cinema, pagam um ingresso para assistir a um filme, e chegando na sala… fazem de tudo, menos assistir ao filme. É mais importante colocar a conversa com o colega em dia, checar o facebook em intervalos de 45 segundos durante todo o filme, fazer ligações telefônicas e empurrar de todas as maneiras possíveis a cadeira da frente e, se possível, apenas se existir a possibilidade de conciliar todas essas atividades, de vez em quando dar uma olhada no que está acontecendo na tela, e depois fazer perguntas para o colega do lado sobre como a trama chegou onde chegou.

Depois de passar esse filme na cabeça, optei por assistir Jobs, e decidi que voltaria no dia seguinte para assistir à película.

Sábado foi feriado, sete de setembro. Fui na sessão de 15h, para evitar problemas semelhantes aos que acontecem sexta-feira à noite. O filme é em 3D. Paguei 12 reais. O ingresso é caro, pensei, mas sei lá, tinha que ver o filme, preferi não pensar muito em relação a isso.

Na hora de comprar uma água, notei uma aglomeração de garotas entre 12 e 15 anos na entrada da sala. Situações semelhantes já aconteceram anteriormente em sessões de blockbusters como Harry Potter, Percy Jackson, e muitos outros mas, como sempre procuro fazer, optei não sofrer por antecipação e entrei na sala.

A sala 1 do Millennium é grande, bem grande. Não estava nem com metade da sua capacidade ocupada, mas aquele pequeno grupo de meninas havia se multiplicado, e ocupava quase que completamente as três últimas fileiras de cadeiras, e somando com as outras pessoas que estavam na sala, tínhamos algo em torno de 60, 70 pessoas no local.

Excepcionalmente, nessa sessão fiquei sentado bem no canto da sala, o mais distante possível daquele grupo, pois receava que elas fizessem barulho durante o filme. Mas logo que me sentei, notei que qualquer esperança que tivesse em assistir ao filme era muita ingenuidade.

Cinco minutos antes do filme começar, o grupo não se calava de forma alguma. Mas não era uma conversa de pessoas que estão ansiosas para ver um filme, mas sim que estão extremamente excitadas por estarem a segundos de verem os maiores ídolos de suas vidas, o grupo pop mais incrível que já existiu, com os garotos mais lindos e incríveis de todos os tempos, com as músicas mais incríveis, os penteados mais incríveis e as personalidades mais contundentes e incríveis. Era a concentração de um show dos Rolling Stones.

A única diferença era que não se tratava de um show, mas sim de um documentário que tem um show musical dentro. Pensei em avisá-las sobre isso, mas me contive, acredito que elas não iriam me compreender.

Depois pensei em falar com alguém do cinema para ver se alguém poderia dar um toque nas meninas, mas novamente continuei sentado. E assim que fiz isso, comecei a me questionar. Será que não era eu que estava com o clima errado pra coisa? Será que não era eu que estava sendo insensível, e que não havia captado o espírito do momento? Que deveria abrir uma exceção a minha crença de que se se vai a um cinema, deve-se propor a assistir ao que é exibido, sem querer chamar a atenção pra si com atividades de sextas-feiras à noite? É, tentei abrir a mente, e prometi a mim mesmo que não iria mais me estressar.

Mas, logo vi que estava enganado de novo. Os gritos de começa! Começa, pelo amor de Deus! Ai, meu Deus, não aguento mais esperar! Tomavam conta da sala, e parecia que o lugar estava prestes a explodir, em uma expectativa que quase não cabia mais dentro daquele local.

Quando apareceu a mensagem na tela para colocar os óculos 3D, a sala quase veio abaixo. Demorei um pouco pra compreender o motivo daquilo. Desse segundo em diante, as meninas não mais pararam de gritar. Veja bem, literalmente, gritar, espernear, pular nas cadeiras. Um momento de genuína histeria.

E ainda estávamos no segundo trailer.

Quando apareceu o trailer de Thor, e o seu intérprete Chris Hemsworth surgiu na tela, os gritos conseguiram aumentar de volume.

Nesse momento, perdi um pouco das dúvidas que tinha anteriormente, e notei que sim poderia até haver um sentimento pela banda, e pelo que ela representa, por mais esdrúxulo que isso possa parecer, mas nesse momento notei que aquele grupo fazia graça, era a versão adolescente do público da sexta-feira à noite (que, diga-se de passagem, é o mesmo do domingo), só que com o plus de serem adolescentes querendo atenção.

Saí da sala, e do lado de fora, muito próximos da porta que estava aberta, estavam três funcionários, que obviamente ouviam todo aquele ensurdecedor alvoroço. Falei que o filme ainda nem havia começado, e que eles podiam ver como o público estava, perguntei se eles iam tomar atitude em relação àquilo. Com educação eles me disseram que infelizmente não poderiam fazer nada, que era um grupo muito grande de pessoas, que se tratava de um show da banda, e que no dia anterior, sexta-feira, a sessão deste filme havia apresentado problemas semelhantes, inclusive com princípio de confusão com reclamações de outras pessoas. Mesmo argumentando que não se tratava de um show, mas de um documentário, eles disseram que poderiam fazer nada para “me ajudar”.

Voltei para a sala, e logo que me sentei o show, digo, o filme começou. E o que parecia impossível aconteceu, se a sala já estava um pandemônio, nesse momento em diante não havia um segundo sequer sem que uma gritaria ininterrupta invadisse os meus ouvidos. Fiquei esperando o Mick Jagger finalmente entrar pela porta, mas isso não aconteceu.

O longa começava com uma música em um show, e as meninas faziam um revezamento, enquanto uma gritava a outra cantava, para depois trocarem de função. Até o final da música comecei a ter a esperança de que havia lido uma sinopse errada, e comecei a torcer pra que aquilo fosse realmente um show, pois aquilo tornaria as coisas mais compreensíveis.

Porém, me enganei de novo, e assim que acabou a música, começaram a pintar alguns depoimentos de integrantes da banda, só que parecia que as meninas ainda tinham ficado no show, pois os gritos não diminuíram nem por um segundo. Depois de dez minutos tentando em vão compreender o que se passava na tela, decidi ir embora da sessão.

Adiei muito o meu retorno lá. O máximo que pude. O medo de ter de encontrar essa mesma situação novamente, além da certeza de pagar de novo um ingresso de uma sala 3D não me animavam nem um pouco para assistir ao trabalho novamente.

Fui na terça-feira, ontem, no meu limite máximo de tempo.

Para a minha satisfação, assim que entro na sala encontro apenas seis meninas, que conversavam de maneira silenciosa.

Ainda fiquei na expectativa de que a qualquer momento um novo fã-clube adentrasse a sala, ocupando todas as cadeiras, mas isso não aconteceu.

E aí, finalmente pude conhecer melhor o tal One Direction. E ao contrário do que possa parecer, o documentário (acredite em mim, não se trata mesmo de um show) é divertido, apresenta os garotos de maneira honesta, conseguindo transmitir sinceridade, algo que realmente me surpreendeu, pois o universo pop de hoje é muito mais preocupado em oferecer produtos pré-estabelecidos, pensados milimetricamente para agradar às fãs adolescentes.

Sei lá, depois de ver o filme, até torço por eles. Depois do vídeo institucional de uma hora e meia, eles conseguiram me convencer de que são interessados em ser mais do que personalidades da mídia, e que realmente se dedicam e abdicam de uma série de coisas para realizarem seus sonhos. Acredito que só por isso já merecem o mínimo de respeito e compreensão.

E se, quando disse que faria a crítica do One Direction, muita gente me desejou um sarcástico boa sorte, depois de passar por isso, digo que, apesar de todo o martírio de sábado, devo admitir sinceramente que a experiência não foi tão ruim assim.