Estreando na primeira quinzena de dezembro, a série mais cara da Netflix (com orçamento em torno de US$ 130 milhões), The Crown, brinda um ano de sucesso para a plataforma apresentando uma nova temporada tão consistente e interessante quanto a anterior.

Mesmo se tratando de um produto em que o retorno financeiro se faz tão necessário, a série foge de apostas comuns para alcançar seu sucesso. Muito disto se deve a proposta de retratar a jovem Rainha Elizabeth II e o estilo de vida da coroa britânica. Este simples fato atrai para si os olhares  dos espectadores curiosos sobre a forma de governo até hoje vigente na Inglaterra.

Entendendo a importância e delicadeza que envolve esta realidade, The Crown (ao contrário do que muitos imaginam) não utiliza histórias com apelo superficial, que possam atrair qualquer tipo de público. A série possui uma grande preocupação em sua primeira temporada em ressaltar as peculiaridades de seu contexto político e social com importante fundamentação histórica.

Em seu segundo ano, o seriado reafirma tramas presentes anteriormente e faz proveito de sua aceitação em meio ao grande público para inserir outros elementos. O que antes beirava o monótono por inserir personagens e questionamentos esquecidos no roteiro, agora se apresenta com clareza para o público.

O esquecimento de personagens, entretanto, continua como característica questionável na série. Figuras e personalidades importantes para determinado momento da trama são estabelecidos sem maior preocupação e voltam a deixar de existir no universo da realeza desta mesma forma. Figurando assim, uma boa quantidade de personagens esquecíveis e mal construídos, deixando transparecer a falta de coesão entre alguns episódios.

Contudo, os personagens bem explorados e centro da trama retornam com maior potencial na história. A interação entre Elizabeth (Claire Foy) e Philip (Matt Smith), seu marido, se torna um elemento narrativo que triunfa no decorrer na temporada sem atenção exacerbada.

Em praticamente um episódio inteiro acompanhamos o passado de Philip, compreendendo melhor suas características já estabelecidas, estas fazem paralelo direto nas decisões que ele realiza durante sua vida. A escolha de aumentar o tempo em tela deste personagem implica no maior entendimento sobre o casamento no qual o divórcio não é opção.

Ao explorar as regras e acordos estabelecidos silenciosamente entre a rainha e seu marido, a série reforça a construção de sua protagonista não somente como rainha e chefe da Igreja Anglicana, como também uma mulher que vivencia dramas comuns. Este porém, possuem uma perspectiva muito mais notória, na qual atitudes pessoais alcançam níveis de preocupação do governo.

Explorar essa relação se torna o maior êxito da temporada. O que poderia facilmente se tornar um drama forçado e totalmente questionável em sua semelhança com a vida real consegue ser retratado de forma engenhosa, utilizando os dez episódios para seu desenvolvimento gradual.

Além dos conflitos matrimoniais, as divergências entre Elizabeth e sua irmã, Margaret (Vanessa Kirby), além de ressaltar atuações competentes, também contribuem para a aproximação da protagonista com realidades mais próximas do espectador. A atenção e carisma da série então é centrada na interpretação que Claire Foy apresenta como rainha.

Mesmo diante de tantas situações inconvenientes, Elizabeth deve agir e governar como realeza, deixando para pequenos gestos sua verdadeira expressão. Gestos como as mãos, a impostação da voz, a mudança no olhar e até mesmo (pasmem) a respiração, são capturados pela fotografia da série que não se preocupa ao demorar-se nas feições de seus personagens, buscando retratar aquilo que não é dito verbalmente.

Com a futura substituição da atriz Claire Foy para a realização da terceira temporada, encerra-se não apenas uma atuação marcante como também um ciclo na vida da protagonista. Sem maiores detalhes, não sabemos de que forma a escolhida Olivia Colman poderá mudar o perfil estabelecido da Rainha Elizabeth. Porém é possível assumir que a produção da Netflix irá em seu próximo ano, continuar incluindo importantes questões históricas em seu roteiro, potencializando o crescimento da série por meio de uma trama convidativa, do contrário, talvez não consiga segurar uma quarta ou quinta temporada.