Filmes de mágica em geral ensinam uma mesma lição básica ao espectador: o segredo de qualquer truque é desviar a atenção do público, para que ele não preste atenção no que deveria. Assim, está feita a mágica: a plateia é enganada e olha para onde o ilusionista quer que ela olhe, e se impressiona – se o truque for bom o suficiente, é claro. Em 2013, Truque de Mestre mostrou que aprendeu bem essa lição levando às telas uma experiência enganosa, mas razoavelmente divertida. Agora, n’O Segundo Ato, o truque é mais elaborado, tem um escopo mais grandioso, mas a sensação é a mesma: só é divertido enquanto você ignora o que o filme quer que você não olhe.

Assim como já explicava cada um de seus truques detalhadamente no longa original, para quem não se lembra dos personagens da história anterior, Truque de Mestre: O Segundo Ato faz até o favor de apresentar um pequeno prólogo didático e introdutório. Depois de ter roubado um banco, posto Thaddeus Bradley (Morgan Freeman) na cadeia e levado Arthur Tressler (Michael Caine) quase à falência, os chamados Quatro Cavaleiros se mantêm escondidos por um ano, aguardando instruções do “Olho”, enquanto Dylan Rhodes (Mark Ruffalo) continua no jogo duplo de despistar o FBI como agente da organização e líder dos Cavaleiros ao mesmo tempo. Os mágicos recebem então uma nova missão, que consiste em desmascarar um grande magnata da tecnologia, mas são enganados e se tornam reféns do milionário sociopata Walter Mabry (Daniel Radcliffe), que os obriga a roubarem um chip que pode controlar toda a comunicação mundial.

Nos seus minutos iniciais, Truque de Mestre: O Segundo Ato até parece que vai tocar em temas importantes como privacidade e controle dos meios na era da tecnologia da informação, à luz das denúncias de Edward Snowden, mas isso é só mais um dos truques para desviar a atenção do público. O foco do diretor Jon M. Chu (G.I. Joe: Retaliação) e do roteirista Ed Solomon (do primeiro filme) está mesmo em investir em mais uma história de roubo, com cenas de ação e muitas mágicas pelo caminho. O resultado é capaz de entreter bem, mas só uma vez que ignoramos toda e qualquer lógica dentro da trama: a mais óbvia seria de cara a questão financeira, já que os Cavaleiros passam por Macau e por Londres, e conseguem fazer uma série de truques complexamente elaborados com a fonte aparentemente inesgotável de dinheiro do Olho.

Enquanto isso, uma montagem dinâmica e muitos flashbacks dão conta de frequentemente explicar à plateia o que realmente se passou no que acabamos de ver, passando por cima da coerência e justificando tudo com plot twists simplesmente porque sim. Assim, dá-lhe surpresas que ignoram até mesmo o longa original, na tentativa de apresentar novos caminhos para uma sequência que claramente não era planejada (e ainda vem o terceiro por aí). Não é de se admirar, portanto, que um determinado personagem ganhe todo um novo background e uma nova justificativa para suas ações logo no fim do filme – e quando Dylan Rhodes pergunta “Por que você nunca me disse nada?”, a resposta podia facilmente ser “Porque não estava no roteiro do primeiro filme, bobinho”.

Isso não quer dizer que Truque de Mestre: O Segundo Ato não tenha lá seus bons momentos, a maior parte deles por conta do talento do elenco. Assumindo a vaga de Isla Fisher como integrante feminina do grupo, Lizzy Caplan (a inesquecível Janis Ian de Meninas Malvadas) vive a ilusionista Lola, e é engraçada desde sua primeira cena no filme, ao fingir sua própria morte. Embora seu papel seja claramente de alívio cômico, Caplan se destaca ao subverter clichês e expectativas dos próprios companheiros de cena, oferecendo uma série de “metacomentários” sobre o próprio filme e o mundo dos blockbusters de Hollywood. Além de já se apresentar ironicamente como “a Cavaleiro mulher” e investir descaradamente em Jack Wilder (Dave Franco), em uma cena de perseguição, por exemplo, ao ser questionada se sabe pilotar uma moto, Lola retruca: “Você perguntou isso pra qualquer um dos rapazes ou foi só pra mim mesmo?”.

Já o outro novato na franquia, Daniel Radcliffe, visivelmente se diverte com as bizarrices de seu vilão, um magnata mimado e idiossincrático com fortes traços de sociopatia. Ao lado deles, os veteranos trabalham com o que têm em mãos: Jesse Eisenberg “einsenbergueando” como de praxe, Woody Harrelson fazendo graça também com a nova presença de um irmão gêmeo do mal em cena, Dave Franco investindo em todo seu charme e habilidade com cartas e Mark Ruffalo emprestando sua dignidade habitual ao fiapo de desenvolvimento de seu personagem, explorando seu trauma de infância.

Truque de Mestre: O Segundo Ato é, portanto, um grande truque com o próprio público, desnecessariamente convoluto em demasia, muito incoerente e sem nada de novo a oferecer sobre o próprio mundo da mágica. Se o truque funcionar com o espectador, porém, ele sai da sessão com duas horas divertidas na cabeça – até pensar duas vezes sobre o que viu.