O bom nerd que cresceu na década de 90 adorava discussões sobre conspirações governamentais e abduções alienígenas. Frases prontas, verdadeiros taglines também eram comuns nas conversas: A Verdade Está Lá Fora e Não Confie em Ninguém. A culpa de tudo isso era de um senhor com pinta de galã e jeito despojado que atendia pelo nome de Chris Carter. Fã confesso de Kolchak e os Demônios da Noite, o autor se baseou na série cult da década de 70 para criar Arquivo X, um seriado inovador que misturava investigação policial com eventos sobrenaturais e conspiratórios.

Quando estreou em setembro de 1993, a série não tinha muitas ambições a não ser a contar histórias consistentes que misturavam episódios estranhos com aqueles centrados em conspirações que mostravam o envolvimento do Governo em acobertar a verdade da população. A audiência da série se não era das melhores, estava longe de ser ruim. Ainda assim, tanto Carter como a sua equipe não imaginavam que ela fosse renovada para uma segunda temporada sendo surpreendidos quando a Fox oficializou a renovação.

O problema principal foi atriz Gillian Anderson grávida na época. Curiosamente esse “problema” foi responsável pelo futuro sucesso da série junto ao público. Para suprir a ausência da atriz, os roteiristas desenvolveram um esqueleto conspiratório, onde o governo tinha envolvimento cada vez maior para esconder a participação dos homenzinhos verdes em nosso planeta.

Desta casualidade, o universo mitológico começou a ser desenvolvido, tornando-se o fio condutor da série e criando um elo extremamente fervoroso de ligação junto aos fãs a cada nova temporada. Além dos interessantes episódios sobre os Monstros da Semana, os fãs esperavam ansiosamente por cada episódio da mitologia, querendo saber e compartilhar a verdade com Mulder e Scully. A audiência aumentou, assim como a criatividade dos roteiristas em elaborar teias conspiratórias cada vez mais complexas.

 Sinceramente, todo o arco mitológico da série é muito bem explorado nas cinco primeiras temporadas, sendo que a quarta e quinta, apresentava o fino da bossa neste quesito. O ponto de corte (e da decadência) começou exatamente com o lançamento do filme Arquivo X – Resista ao Futuro nos cinemas ao final da quinta temporada, culminando também na mudança das filmagens da sombria Vancouver no Canadá para colorida Los Angeles, o que tirou o charme soturno da série. Logo, Carter perdeu o fio da meada, principalmente quando começou a querer inventar a roda adicionando mais informações a mitologia do que necessário. A oitava e nona temporada evidenciaram o quanto ela ficou confusa e sem nexo.

Não é toa que o próprio criador em uma entrevista ao Chicago Tribune assumiu mea culpa pelos problemas das últimas temporadas quando falou sobre o processo mitológico: “Há buracos onde se pode cair e você precisa evitá-los a cada passo do caminho. E posso te dizer: com programas de mitologia, você tropeça, você cai. Dentro do especial de Arquivo X, esta lista vai focar nos melhores dez episódios relacionados ao arco mitológico, diretamente ou indiretamente. Numa análise comparativa, diria que pelo menos uns 25 episódios inseridos nas nove temporadas alternaram entre ótimo a excelente, o que mostra a dificuldade de elaborar a lista. Se a nova temporada conseguir resgatar pelo menos parte desta qualidade já terá valido a pena. Lembre-se, caso você nunca tenha assistido a série, há alguns spoilers abaixo. Por isso, descubra as verdades que fizeram tão bem ao seriado e os principais motivos que não se deve confiar em ninguém.


10) Episódio-Piloto – 
1ª Temporada

Revendo o episódio onde tudo começou, nota-se o quanto continua fascinante. A começar pela abertura assustadora, ele apresenta a essência sombria e conspiratória que a série desenvolveria ao longo das outras temporadas. A trama alienígena é simples, enxuta e bem encenada. Trata de um tema considerado como ridículo por grande parte do público com seriedade. E nosso amigo Canceroso já dava as caras no episódio piloto.


9) Lembranças Finais –  4ª Temporada

Belo episódio que mistura investigação e drama. É centrado no arco da descoberta do câncer de Scully em decorrência da sua abdução na segunda temporada. Mostra a maturidade do seriado em conciliar o enredo conspiratório – na busca de Mulder em descobrir a origem da doença da parceira – com texto melodramático, extremamente delicado e sensível mostrando Scully tendo que lidar com a doença. Linda atuação de Gillian Anderson.


8)
A Paciente X – Parte II – 5ª Temporada

Se a primeira parte oscilava no ritmo da narrativa, esta continuação apara os problemas oferecendo altas doses de conspiração, revelações, ação e participações marcantes dos personagens secundários. Marcou o último arco interessante da mitologia, no caso introduziu os Rebeldes Alienígenas na dimensão conspiratória (Resistir ou Servir, é a tagline do episódio), assim como impulsionou a série para novos horizontes, abrindo o caminho para o filme que viria ao final da temporada.


7) Anasazi – 2ª Temporada

Já com um bom reconhecimento por parte da crítica, Chris Carter resolveu fundamentar de vez sua mitologia com este magistral episódio de encerramento da segunda temporada. Anasazi é ousado neste sentido, por levar a mitologia a uma esfera global de conspiração – marca o primeiro aparecimento do famoso Consórcio das Sombras. Não faltam momentos tensos, dramáticos (a morte do Pai de Mulder pelo rato Alex Krycek) e misteriosos. O roteiro também faz uma interessante releitura do Caso Roswell.


6) Por um Fio – 2ª Temporada

Revendo até hoje o episódio, considero um dos mais bem fundamentados do seriado. Texto impecável da ótima dupla Glenn Morgan e James Wong.  Apresentas novidades até então inéditas a série, como o enredo exotérico e espiritual, explorando a luta de Scully frente a morte. Destaque para o primeiro encontro cara a cara entre Mulder e Canceroso e a fundamental participação do informante X. É um episódio marcado por ótimos diálogos: “Eu senti a força de suas crenças”.


5) O Falso Alienígena – 3ª Temporada

Se o episódio anterior era tenso por natureza, esta continuação se destaca como um belo episódio de ação e mistério. Do início ao final é marcada por um ritmo frenético, sempre levando o espectador a um grau de ansiedade enorme. Tudo isso explorado em um único ambiente, dentro de um trem pela ótima direção de Rob Bowman. A conspiração global fica mais nítida com a participação dos japoneses e Scully descobre que outras mulheres foram abduzidas assim como ela. Tem uma das melhores aparições do Informante X (o ótimo Steven Willians)


4) Um Filho – 6ª Temporada

É o último episódio memorável da mitologia, todos que vieram a seguir não conseguiram chegar a sua excelência. A conspiração dos colonizadores apresenta o ápice da coerência textual e o episódio em si, é envolvente pelas boas reviravoltas e revelações. Um dos pontos mais interessantes é a relação entre pai e filho, explorada pelos roteiristas nas figuras de Mulder e Canceroso. Marca o último aparecimento do Consórcio das Sombras dizimado pelos rebeldes. Poderia ser muito bem o final do seriado, pois o fecharia com chave de ouro.


3) Fim de Jogo – 2ª Temporada

Lembro quando assisti o episódio na época, pensei: Como é que os filmes de ação de Hollywood não conseguem ter essa pegada e ritmo alucinante, oferecendo ação, tensão e dramaticidade tudo junto? Em outras palavras a direção de Bowman consegue fazer tudo em 45 minutos o que os filmes americanos da época não conseguiram em 120 minutos. Episódio eletrizante do início ao fim que explora bem a trama dos clones e a volta da irmã de Mulder, Samantha, graças ao roteiro marcante de Frank Spotnitz. Destaque para briga entre Skinner e X.


2) Jogo de Gato e Rato – 1ª Temporada

Nutro uma grande afetividade pelo episódio que marca o encerramento da primeira temporada, talvez por acreditar como Mulder, de estar próximo da verdade (na realidade estava bem longe dela). Carter não imaginava que a série seria renovada para uma segunda temporada e por isso trabalhou como fosse o último episódio. Seu texto prima pela densidade e atmosfera conspiratória. Marca o primeiro contato de Scully com o universo alienígena de Mulder e o foi o primeiro momento doloroso que presenciei na série, com a morte do emblemático informante Garganta Profunda (o carismático Jerry Hardini) que profetiza a célebre frase “Trust No One”.


1) A Maior das Mentiras – 4ª Temporada/ Em Busca da Verdade – Parte II – 5ª Temporada

É difícil dissociar estes dois capítulos já que ambos se completam, enquanto um abre, o outro fecha a trilogia (o primeiro encerra a 4 temporada e o segundo é do início da 5 temporada). Dentro da mitologia, não há episódios tão avassaladores quanto estes dois. Carter e Spotnitz jogam os fãs no seu pior pesadelo ao colocar Mulder e Scully pertos da morte. O primeiro é confrontado com suas crenças: E se tudo aquilo que ele acreditou até então, não passou de mentiras? O texto da dupla coloca até os pobres fãs diante da situação conflitiva, os levando acreditar que tudo não passou de um embuste. Um final de temporada arrepiante e doloroso.

Já em Busca da Verdade coloca Scully próxima da morte mais uma vez, em razão ao câncer que ela adquiriu. Com uma parte dramatúrgica convincente e bem encenada, o enredo conspiratório é altamente envolvente culminando em um dos momentos mais forte da série: a possível morte do Canceroso. Em outras palavras, ambos são a Masterpiece da mitologia conspiratória.