Ah, o Dia dos Namorados! Para alguns, a data é sinônimo de presente, jantar caprichado e fim de noite mais caprichado ainda; para outros, significa amargar a falta de alguém para dormir de conchinha. Há também os que aproveitam a data para frisarem que estão “solteiros sim, sozinhos nunca!”. E se em algum desses “times” há um cinéfilo, a data também pede maratona de filmes temáticos.

Como nem só de “Casablanca” ou “Simplesmente Amor” vive o dia dos namorados, esse ano o Cine Set listou outras opções para celebrar a data, a dois ou não. Confere só:

O Atalante (L’Atalante, 1934), de Jean Vigo

Abrimos a lista com “O Atalante”, uma pequena pérola do diretor Jean Vigo. Com uma recepção fria na época de seu lançamento, o filme foi redescoberto pelos cinéfilos da Nouvelle Vague, tornando-se uma referência no que diz respeito a apresentação de uma atmosfera romântica, mas realista mesmo quando traz seus toques poéticos. Na trama de “O Atalante”, o capitão Jean (Jean Dasté) acaba de se casar com Juliette (Dita Parlo) e passam a viver num barco, juntamente com a tripulação formada por Père Jules (Michel Simon) e um garoto (Louis Lefebvre). Os encontros e desencontros do casal ao chegarem em Paris são mostrados de maneira até hoje inventiva, e o ritmo da narrativa permanece moderno para espectadores menos afeitos a filmes antigos.

Loving (idem, 2016), de Jeff Nichols

Um dos concorrentes do Oscar 2017, “Loving” tem tudo que um bom filme de Dia dos Namorados pede: a representação de um amor verdadeiro, que enfrenta todas as barreiras possíveis, e que atravessa os tempos com persistência. Não bastasse isso, ainda é uma obra baseada em fatos reais, com atuações e direção excelentes. Na trama do longa, Richard (Joel Edgerton) e Mildred Loving (Ruth Negga) são perseguidos pela polícia por serem um casal interracial nos EUA segregacionista dos anos 1950. Exilados do próprio Estado pela justiça, eles lutam pelo direito a viverem como uma família novamente. “Loving” é um filme de direção classuda, mas isso não impede de você preparar os lenços de papel para assisti-lo, ok?

Anjos caídos (Do lok tin si, 1995), de Wong Kar-Wai

Wong Kar-Wai já é responsável por um dos filmes mais românticos de todos os tempos, “Amor à flor da pele” (Faa yeung nin wa, 2000), item obrigatório de uma lista como essa. Porém, ele tem ainda outros filmes excelentes que lidam com relacionamentos, e dentre eles, há “Anjos caídos”. A trama gira em torno de um assassino (Leon Tai) e sua assistente (Michele Reis), os quais nutrem um relacionamento platônico. A loura platinada Baby (Karen Mok) desestabiliza essa relação, ao passo que acompanhamos também He Zhiwu (Takeshi Kaneshiro) se aproximar de Cherry (Charlie Yeung), que não consegue lidar direito com o término de seu último relacionamento. O filme apresenta personagens sedentos de conexão uns com os outros e retrata bem a melancolia dos amores não-correspondidos. Solteiros, sintam-se representados nessa lista com esse filme!

Embriagado de amor (Punch-Drunk Love, 2002), de Paul Thomas Anderson

O belíssimo “Embriagado de amor” não tem a grandiosidade natural dos filmes de Paul Thomas Anderson, mas é sem dúvida “O” filme do diretor para compor essa lista. Nele, acompanhamos Barry Egan (Adam Sandler, mostrando que sabe atuar quando quer), um pequeno empresário em dificuldades financeiras e psicológicas também. Ao se apaixonar por Lena (Emily Watson), ele faz de tudo para superar as dificuldades, sejam elas seu medo de amar, seja a distância entre ele e Lena, seja uma quadrilha de mafiosos! A sinopse é assim meio maluca, mas “Embriagado de amor” vale o play para qualquer casal.

O segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005), de Ang Lee

Eu me recuso a escrever uma lista de filmes românticos sem “O segredo de Brokeback Mountain”. A história de amor entre os caubóis Ennis (Heath Ledger) e Jack (Jake Gyllenhaal) concorreu a oito Oscars e ganhou três, mas para além de prêmios, sobrevive como uma obra tanto triste quanto romântica na mente dos cinéfilos.  Não é por menos: o filme é um slow burn de desejo proibido, preconceito, segredos e amor incondicional, tudo isso dirigido com sensibilidade ímpar por Ang Lee e emoldurado pela bela fotografia de Rodrigo Pietro. O longa também traz a melhor atuação de Ledger depois do Coringa de “Batman: O cavaleiro das trevas” (Batman: The dark Knight rises, 2008).

Jules e Jim: uma mulher para dois (Jules Et Jim, 1962), de François Truffaut

Não sei para vocês, mas para mim, lista de filme romântico que se preze tem que ter bastante filme de época! Com um exemplar como “Jules e Jim: uma mulher para dois”, fica fácil preencher esse requisito. O clássico de Truffaut se passa no começo do século XX e explora as idas e vindas do relacionamento dos personagens-título (interpretados por Oskar Werner e Henri Serre, respectivamente) com Catherine (Jeanne Moreau). Além de uma delicada abordagem do romance semi-biográfico de Henri-Pierre Roché, o filme conta com todos os elementos de assinatura do cinema autoral de Truffaut: uma abordagem naturalista da trama, mas com uso criativo da câmera, uma trilha sonora marcante (do parceiro de longa data Georges Delarue), e a total adoração a sua personagem feminina. Longa obrigatório para todos os 365 dias do ano.

O não sei que das mulheres (It, 1927), de Clarence G. Badger

“O não sei que das mulheres” é o pai e a mãe de todas as comédias românticas modernas. O filme mudo até hoje surpreende por seu ritmo narrativo acelerado, bem ao gosto do público atual, juntamente com o desenvolvimento e exposição seus personagens nada quadrados, criados ao gosto dos EUA pré-código Hays. De quebra, foi um dos primeiros filmes a cimentar a ideia tanto de “it girl” quanto de “estrela de cinema”, graças ao carisma de Clara Bow. Na trama, a vendedora Betty Lou (Bow) é considerada por Monty (William Austin) uma “it girl”, moça que tem um charme único e espontâneo, embora não tenha consciência disso. Betty, que nutre uma paixonite pelo chefe, o playboy Cyrus (Antonio Moreno), consegue uma chance de conquistá-lo graças ao seu jeito descontraído. É uma comédia romântica irresistível, que até hoje gera suspiros e risadas mesmo nos espectadores mais “durões”.

O beijo (Kuchizuke, 1957), de Yasuzo Masumura

Se você procura um filme que sumariza todo o torpor e empolgação de um relacionamento que começa a despertar, “O beijo” é o filme perfeito. A direção vertiginosa de Masumura é usada ao longo de sua filmografia para dar um ar de loucura e alienação, mas nesse longa a pegada cabe muito bem para demonstrar a intensidade dos sentimentos do casal protagonista, Kinichi (Hiroshi Kawaguchi) e Akiko (Hitomi Nozoe). No filme, os dois se conhecem graças a uma coincidência não muito agradável: os pais de ambos estão na prisão. Para além do foco em conseguir dinheiro para cobrir as despesas da prisão, eles passam um dia de pequenas aventuras, alimentando uma nova afeição nessa pequena obra-prima da Nouvelle Vague japonesa.

Procura-se Amy (Chasing Amy, 1997), de Kevin Smith

Houve uma época em que Kevin Smith sabia dialogar com os pequenos medos e aspirações cotidianas da juventude, e essa época foi a segunda metade dos anos 1990. Em “Procura-se Amy”, ele traz uma comédia com a marca desses tempos áureos: uma câmera simples, boas atuações de atores não tão experientes (Ben Affleck ainda era, se muito, “o cara que escreveu um filme com Matt Damon”) e diálogos afiados e realistas. Na trama, o foco é o namoro do quadrinhista imaturo Holden (Affleck) e a experiente Alyssa (Joey Lauren Adams), no qual o passado dela passa a ser uma sombra no relacionamento. O longa se mantém atual ao mostrar o romance da perspectiva masculina, algo pouco usual até hoje dentro do subgênero das comédias românticas, além de ser um dos raros retratos minimamente saudáveis de uma personagem bissexual com Alyssa e mostrar os males de uma masculinidade tóxica num namoro mesmo com a trama partindo desta.

Trilogia Antes do Amanhecer, Antes do pôr-do-sol e Antes da Meia-noite (Before Sunrise, 1995; Before sunset, 2004; Before midnight, 2013), de Richard Linklater

Sim, nossa lista termina com obras obrigatórias na primeira posição, sendo uma escolha manjada. Não, não havia como evitar isso. O motivo é que a trilogia de Linklater dialoga perfeitamente com a noção de romance nessa virada do século XX para o XXI, das suas dores aos seus prazeres. O casal Jesse (Ethan Hawke) e Céline (Julie Delpy), em suas longas caminhadas por cidades na Alemanha, Paris e Grécia, dissecaram muitos dos tópicos de conversa que um relacionamento que se preze debateria, e com isso, conquistaram fãs ao longo de quase 20 anos de trama. Mais que isso, eles cobriram não só a fase de início de relacionamento, mas todas as fases que envolvem amadurecê-lo, trazendo a tona os pequenos gestos que mostram o que é o amor “de verdade”.