Lembro-me bem quando assisti a Tropa de Elite (2007) pela primeira vez. Achei-o muito bom, cheia de vida, extremamente forte, verdadeiro. Mas lembro que fiquei com uma pulga enorme atrás do orelha, pois tinha a clara intenção que o filme defendia os atos do Capitão Nascimento por uma série de elementos narrativos que adotava, dentre eles o fato da narração em off ser do próprio personagem. Só depois pude ver entrevistas de José Padilha, assistir ao seu trabalho anterior, o ainda mais impactante Ônibus 174 (2002), e ver conversas a respeito do filme que fizeram com que eu mudasse de opinião a respeito do mesmo.

Revendo o trabalho ficou claro que o longa não defende os atos do Bope, mas sim apresenta Nascimento como um homem desequilibrado, intolerante, cego pelas suas convicções e que utiliza de todo e qualquer método para fazer o que ele considera correto. E o trabalho apenas mostra a história através da ótica deste personagem, e aí deixa que o espectador tire a sua conclusão, que, infelizmente, em sua maioria, foi completamente equivocada ao eleger Nascimento como uma espécie de herói, um modelo de cidadão, um mártir da incorruptibilidade, que dá tapa na cara de vagabundo, e põe bandido na cadeia.

Enfim.

Anos depois conferi 300 (2007). E, me desculpem, mas este não precisei ver duas vezes pra concluir que é completamente equivocado do início ao fim. Tudo bem, o visual do filme é interessante… mas trata-se de um trabalho calcado numa imbecilidade que é a “honra” de se matar o outro em uma guerra, baseado num machismo de exército absurdo, em que o homem de verdade é aquele ser que diz sim, senhor, pra quem está acima dele, que sabe capinar bem o chão e bater com força na cabeça do próximo. É a forma de pensar do pau pequeno, do impedimento da reflexão e ser o maior herói possível está na quantidade de cabeças que se decepou.

Mostrando esta “bela história”, 300 toma partido e se posiciona do lado dos espartanos. Não vemos apenas os personagens tendo essa mentalidade, mas o filme se posicionando a favor desta imbecilidade que é a honra do soldado acéfalo e analfabeto, que carregou peso desde muito jovem.

E aqui isso se repete de maneira exacerbada em 47 Ronins. Evidente que não tenho nada contra esse tipo de história, mas quando o filme “assume a briga” como se fosse sua, retratando isso de maneira panfletária, o resultado é este tipo de trabalho.

Como se não bastasse, a direção de Carl Rinsch tem a sensibilidade de uma mão de elefante, ao inserir uma preguiçosa trilha sonora de maneira ininterrupta durante todo o longa, que sublinha de maneira descarada a manipulação da direção perante a plateia.

Aliás, o filme é tão focado em contar a “bela história” dos ronins, que o faz de maneira apaixonada e pouquíssimo inspirada, tentando criar elementos paralelos a essa trama, como a improvável paixão entre Kai (Keanu Reeves) e Mika (Ko Shibasaki), que forçam a barra, deixando claro que se tentou cativar o espectador de várias formas, mas nenhuma com habilidade suficiente.

E não por culpa do elenco. Os que adoram falar mal de Keanu Reeves, terão nenhum argumento, pois o ator executa o seu papel de maneira focada e eficiente, da mesma forma que acontece com os seus demais colegas, com destaque para a boa atuação de Hiroyuki Sanada, que dá boas camadas a Ôishi, tornando-o o personagem mais interessante do filme.

Sem dúvida nenhuma, o maior destaque do filme fica pelos seus excepcionais figurino e direção de arte, que dão um visual belíssimo ao trabalho, utilizando-se das cores de maneira bastante inventiva, fazendo com que as imagens que cria sejam de uma beleza arrebatadora.

Mas isso nem de perto salva a obra, que confesso que me fez rir abertamente quando, já no seu desfecho, os personagens agradecem emocionadamente a um ato de “bondade” do Shogun Tsunayoshi, e a direção no mesmo momento coloca uma trilha que deveria ser emocionante, e assim presenciamos um momento de grande bondade que admito: não consigo enxergar.

Aliás, de modo geral, 47 Ronins exibe pouquíssima bondade para com os seus espectadores. Mas consigo facilmente imaginá-lo sendo exibido nos exércitos pelo Brasil, servindo como exemplo para ovelhas sem cabeça.

NOTA: 3,5