Poucos são os filmes que transcendem o tempo, envelhecem bem e ainda continuam relevantes. Talvez possamos chamá-los de “clássicos”, mas não somente pela idade que possuem ou pela etimologia da palavra (que significa estar dentro de regras ou modelos), mas pela forma como ainda conseguem vencer barreiras do esquecimento em meio a tantos lançamentos anuais e por suas qualidades e valores reconhecidos. Esses filmes constituem uma referência posterior para toda a indústria e são exemplos de criatividade em momentos que ainda não eram marcados pela tecnologia. Se existisse uma lista com esses filmes, ‘Planeta dos Macacos’, de 1968, estaria em uma posição de destaque.

Dirigido por Franklin J. Schaffner, o filme comemora cinquenta anos em 2018. Uma idade razoável, que demonstra como essa obra conseguiu se manter indispensável todos esses anos. ‘Planeta dos Macacos” é o início de uma grande franquia, que se tonou parte do imaginário pop cinematográfico. Teve três continuações, um programa de TV, uma refilmagem e até mesmo uma paródia em Os Simpsons. Isso faz refletir sobre como o filme transcende todos os grupos sociais e idades – tendo múltiplos níveis de apelação.

‘Planeta dos Macacos’ conta a história do astronauta americano George Taylor (Charlton Heston), que vai parar por acidente em um planeta habitado por macacos. Os animais dominam o lugar, escravizando os seres humanos, inclusive George e os tripulantes da nave. Na história, o astronauta tem que lutar pela sua liberdade e os outros. Essa narrativa do filme mostra a habilidade implacável para investir na fantasia com credibilidade, trazendo as implicações mais profundas em um roteiro bem-sucedido, principalmente, pelo apelo à imaginação dentro de um contexto de ação, aventura e ficção científica. É um filme que consegue misturar as questões da sociedade ao entretenimento – e ainda fazer uma previsão sóbria do futuro da loucura humana.

Eminentemente bem-sucedido em vários níveis, o filme tem suas fraquezas, mas o aglomerado de significados alegóricos é o que dá grande destaque para essa obra. Em um momento ou outro, o filme trata das relações raciais, da guerra e do pacifismo, da inquisição da igreja, da investigação do Senado e da supressão do pensamento, dos mitos sexuais, da lacuna de credibilidade nas declarações oficiais de posição, dos processos dedutivos seletivos dos historiadores, do fosso de geração, da estrutura social e sistema de castas. É um filme que usa a ficção e aventura para tentar espelhar a realidade da civilização: dramática e complicada.

Os projetos criativos de maquiagem de John Chambers, executados por Ben Nye e Dan Striepeke, são também um dos principais contribuintes para o sucesso do filme, que foi ganhador do Oscar de Melhor Maquiagem em 1969. Isso porque as maquiagens simulam de forma realista os recursos do macaco – elas foram planejadas para encaixar nos vincos naturais do rosto, garantindo máxima mobilidade e animação. Ainda mais notáveis são as personalidades individuais inventadas dentro de cada espécie e as expressões de para cada um dos personagens, como o olho doloroso e o maxilar lento do orangotango de Evans, o arco de sobrancelha e sorriso compassivo de Miss Hunter e o nervosismo juvenil de McDowall.

A cinematografia do filme é um dos pontos positivos assim como a utilização do widescreen. Schaffner pensou na ação em termos de tela ampla, e ele usa espaço e distância dramaticamente. A excelente fotografia de Leon Shamroy ajuda a tornar os vastos exteriores (Utah e Arizona) uma parte magnifica no resultado final. A edição, porém, é distrativa; várias vezes há um corte e, em seguida, uma visão do que já vimos, mas agora visto de um ângulo diferente ou de muito mais alto. O efeito é estático: faz parecer não estar chegando a lugar algum. Isso, talvez, se dê pela busca da gramática cinematográfica e dos limites técnicos que existiam na época.

O filme conta ainda com uma trilha sonora impecável do Jerry Goldsmith, que emprega instrumentação incomum para alcançar efeitos que são ao mesmo tempo primordiais –como ecos distorcidos misturados com piano. Seu efeito é sugerir os ecos de um mundo desprovido de vida passada, desolado, evitando clichês eletrônicos e adaptando-se às demandas complexas da ação e da aventura em um novo mundo.

‘Planeta dos Macacos’ é uma das melhores fantasias de ficção científica que já saíram de Hollywood. Isso não significa que é arte. Mas, este filme é eficiente e artesanal; é concebido e realizado para o máximo apelo popular, embora com uma mensagem cautelosa, e com algumas tentativas de marcar pontos contra várias formas de pensamento estabelecido. É um clássico por se manter atual e conseguir passar tanta relevância por meio de seu conteúdo. É um filme muito divertido, e suas pretensões filosóficas não impedem o caminho do entretenimento.