Nesse subtítulo que escrevemos, na esmagadora maioria das vezes, acabo optando por revelar alguma qualidade do filme acompanhada de algum defeito que atrapalha o seu desenrolar. Dessa forma, tento ser o mais abrangente possível em poucas palavras. Além disso, tenho em mente que ao falar logo de um defeito de um filme muito aguardado isso chama mais a atenção do leitor. Prefiro isso a manter um tom sempre mediano, nem pra bom, nem pra ruim.

Poderia perfeitamente também fazer isso em A Vida Secreta de Walter Mitty, pois o trabalho possui uma série de defeitos que poderiam muito bem ser colocados lá, mas prefiro não.

A Vida Secreta de Walter Mitty é um filme de bom coração.

Nesse mundo de hoje, em que cada vez mais se pensa cada vez menos para fazer um filme, poder ver que um trabalho está interessado em estabelecer um diálogo sincero com você é algo que já merece vários elogios. Mesmo que apresente falhas, o longa mostra-se de peito aberto, sem ter vergonha de soar cafona ou algo do tipo.

Conhecemos Walter Mitty (Ben Stiller), chefe do setor de negativos da Revista Life. Um homem pacato, tímido, introspectivo, que fantasia vários momentos do seu dia para tentar esquecer o marasmo que é a sua vida. Dentre os seus devaneios está presente Cheryl (Kristen Wiig), sua colega de trabalho, com quem sonha poder conhecer melhor. Porém, ambos parecem que não terão muito tempo para isso já que a Life foi vendida, e o novo grupo que comanda o periódico, liderado pelo desagradável Ted (Adam Scott) vai terminar com a edição impressa, restando apenas a digital, o que acarretará uma série de demissões. Uma última edição da revista vai ser lançada, e o famoso fotógrafo Sean O’Connell (Sean Penn) manda um telegrama para a revista com a sua melhor foto. Porém, o negativo não estava com o postal, e Mitty vai atrás de O’Connell para consegui-lo, mesmo que para tal tenha que ir para os lugares mais longínquos do mundo.

Como se pode notar pela premissa, o filme é uma espécie de trabalho de autoajuda, com momentos mais e menos inspirados, investindo na ideia de que não vale a pena ver a vida passar sem fazer parte dela: deve-se ter interesse em viver novas experiências, sair da zona de conforto, conhecer novas culturas. Somente assim pode-se descobrir mais sobre o mundo e você mesmo.

A direção de Stiller mostra-se bastante sensível e bem intencionada, infelizmente recorrendo a escolhas defeituosas como o duvidoso tom do humor nos momentos de fantasia (como na briga entre Walter e Ted pelas ruas da cidade), que depois de pouco tempo tornam-se previsíveis e repetitivos, ou quando, em outro exemplo, coloca uma série de frases de efeito pelo caminho que Walter cruza exercendo um desnecessário papel sublinhativo da “mensagem” que o filme quer passar.

Além disso, Todd (Patton Oswalt), o atendente da rede social, é um personagem muito mal desenvolvido. Ele aparece demais no filme só pra deixar bem clara a transformação pela qual Walter passou. Tudo para que não haja a menor possibilidade que ela passe despercebida.

Mas, como já disse, o filme exibe quase uma pureza juvenil que só sendo insensível e/ou ranzinza para não se deixar levar. Momentos como a paródia de O Curioso Caso de Benjamin Button (2009), quando ele anda de skate na Islândia, joga futebol na montanha, ou o clichê, mas clássico instantâneo, momento em que ele sobe no helicóptero ao som de Space Oddity, deixam um sorriso no rosto diferente de tudo o que vi neste ano.

O Stiller diretor mostra-se bem mais talentoso e interessante do que o ator. Assim como já vimos em Zoolander (2002) e Trovão Tropical (2008), nos trabalhos mais recentes do artista se pode notar um diretor inteligente, com bagagem cinematográfica, conhecedor da linguagem audiovisual e que sabe explorar suas tramas, sem nenhum tipo de estrelismo e exageros. Também pode-se destacar a pop/indie trilha sonora de Theodore Shapiro que funciona de maneira extremamente entrosada com a atmosfera do filme.

A presença de Sean Penn no filme agrega peso a história, mas curiosamente me fez lembrar que, apesar de toda a boa intenção do mundo, A Vida Secreta de Walter Mitty não é Na Natureza Selvagem (2008). O longa de Stiller não mergulha profundamente nos questionamentos existenciais do seu protagonista e não tem a casca grossa de um ator/diretor como Penn.

Ainda assim, é dos mais agradáveis de se ver neste ano que está prestes a acabar.

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