“Eu sou grande. Os filmes é que são pequenos.”

A frase de Norma Desmond em “Crepúsculo dos Deuses” encaixa bem no momento vivido por Maria Enders. Atriz na faixa dos 40 anos, ela não consegue mais viver contracenando com fundos verdes, diálogos pobres e sendo puxada por fios para fazer o novo blockbuster da temporada de Hollywood. Ao mergulhar em uma nova adaptação da peça que a revelara duas décadas atrás, a personagem de Juliette Binoche no drama “Acima das Nuvens” descobre o pior dos temores para uma profissional da área: o envelhecimento.

A luta dos direitos das mulheres ainda passa longe da indústria do cinema. Para isso, basta dar uma olhada em quantos filmes são protagonizados por atrizes e a lista de indicadas ao Oscar em comparação aos personagens masculinos para ver o número reduzido de bons papéis. Para piorar, o padrão da beleza estética de se manter impecavelmente linda sempre importa mais que o talento.

“Acima das Nuvens” se concentra na insegurança de Enders dentro desse cenário cruel. A metalinguagem do filme nesse clima ganha ainda mais força pela escolha do elenco. Binoche (excelente, para variar) representa o cinema europeu, com roteiros mais densos em que a beleza conta, porém, o que importa está no conteúdo e na arte dramática. Já Kristen Stewart (surpreendendo com uma ótima atuação) e Chlöe-Grace Moretz (competente e só) são as estrelas de Hollywood: lindas e jovens em condições de continuar por muito tempo brilhando.

A grande sacada do diretor Olivier Assayas está em abrir esse diálogo desses dois mundos de visões antagônicas e mostrar a superficialidade dos conceitos valorizados na indústria cinematográfica. Isso inclui desde a escolha de filmagens em externas para aproveitar a fotografia natural em vez dos insípidos estúdios até o circo da mídia, destacando muito mais a fofoca do que a obra em si.

Mesmo com uma duração excessiva por repetir a mensagem diversas vezes e uma desnecessária divisão em capítulos (diga-se de passagem, uma mania de muitos diretores atuais), “Acima das Nuvens” traz uma sempre necessária cutucada no atual mundo do cinema e da injusta posição da mulher nesse setor.