O saudoso Roger Ebert já dizia que “o filme é aquilo que nos mostra, nada mais”, alegando que qualquer interpretação que façamos da imagem é nossa e é válida, mas que ela não constitui a imagem em si. Teorias à parte, o que o crítico americano pedia era que respeitássemos o conteúdo que víamos na maneira em que era apresentado, ao invés de especular muito sobre seu valor ou significado.

Nesses termos, “Águas Rasas”, novo suspense de Jaume Collet-Serra, é um tão-somente um filme feito sob medida para o início do verão americano, apostando em uma trama de sobrevivência que tem tudo para fazer sua atriz principal, Blake Lively (de “Gossip Girl” e “A Extraordinária História de Adeline”), ganhar mais fãs.

A verdade é que o filme não está muito preocupado em discutir temas novos para além de sua proposta garota-tenta-não-morrer-na-praia, apesar do roteiro do Anthony Jaswinski insistir em trazer uma história de trauma familiar e novos rumos de vida para o cenário, o que soa forçado para dizer o mínimo.

Esse pano de fundo vê Nancy (Lively), surfista e estudante de medicina, em uma viagem para uma praia no México, onde sua mãe surfara anos antes, logo depois de saber que estava grávida dela. Aos poucos, sabemos que sua mãe falecera e que ela está longe da família desde então, evitando voltar à sua vida e faculdade durante o processo de luto.

Tudo isso é feito através de um inventivo recurso visual que coloca textos, imagens e até mesmo vídeos na tela, num avanço ante a técnica que a série britânica “Sherlock” aperfeiçoou. É por essas interações que rememoramos a vida de Nancy por fotos e sabemos de seus problemas em casa através de chamadas por vídeo.

Todo o aprumo visto aqui desaparece quando vamos para a parte do real suspense, em que a estudante se vê lutando pela sua vida contra o ataque de um tubarão assassino, que se desenrola como uma mistura de “Tubarão” (1975) e “Mar Aberto” (2003) feita para a geração “millenial”.

O excesso de CGI mata boa parte do apelo que o antagonista do filme poderia ter, o que é uma pena já que Collet-Serra consegue manter um bom clima de tensão apesar de sustentar seu longa em uma proposta há muito conhecida. É admirável que ele consiga nos fazer nos importar com uma protagonista cujo arco dramático não vai além do óbvio e se mostra totalmente desprovido de surpresas.

O talento não é só dele: Lively mostra que pode ir além das comédias bobas e dos dramas altamente açucarados, segurando o filme sozinha durante quase a totalidade do tempo de projeção. Sem um papel que lhe dê gravitas suficiente para uma performance arrebatadora, ela mostra desenvoltura e carisma que driblam as problemáticas do roteiro.

É digno de nota que ele torne toda a ação centrada em mulheres (uma filha em luto por uma mãe e cujo maior laço afetivo remanescente é com a irmã), deixando homens longe de papeis de heróis tradicionais (os que aparecem no longa geralmente têm um destino pouco lisonjeiro), mas isso é pouco se comparado às falhas.

De maneira geral, no entanto, apesar dos entraves, “Águas Rasas” funciona dentro de seus pequenos parâmetros e entretém de maneira leve. Fãs de horror e suspense terão pouco o que ver aqui, mas, para quem gosta de suas histórias de superação com vistas paradisíacas e uma dose módica de sangue, vale o mergulho.