A Amazônia é uma região que naturalmente desperta fascínio em todo o mundo. Suas florestas impenetráveis, rios caudalosos e povos indígenas cujo isolamento guarda culturas milenares são alguns dos elementos que aguçam o imaginário popular e transformam o lugar em um verdadeiro Eldorado que muitos desejam desbravar.

Ao longo dos anos, esse mesmo fascínio tomou conta de diversos cineastas que se sentiram impelidos a tentar explorar e entender um pouco mais sobre a região através dos seus filmes. Entre o final de 2015 e o início de 2016, dois longas rodados na Amazônia chegaram aos cinemas: o brasileiro “Órfãos do Eldorado” e o colombiano “O Abraço da Serpente”, indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Além disso, o diretor americano James Gray pretende lançar até o final do ano “Z – A Cidade Perdida”, que mostra a missão fracassada de um explorador britânico que se aventurou pelas selvas sul-americanas e nunca mais voltou. Isso sem falar, claro, no novo filme de Sérgio Andrade, “Antes o Tempo Não Acabava”, co-dirigido com Fábio Baldo.

Assim, diante desse interesse aparentemente renovado do cinema pela Amazônia, o Cine SET traz uma pequena lista com outros filmes que também foram ambientados na região. A lista inclui produções estrangeiras e produções brasileiras de outros estados na região. Para conhecer mais sobre os filmes feitos por realizadores amazonenses, acesse a seção do site com uma série de matérias sobre o assunto (clique aqui).

Brincando nos Campos do Senhor (1991)

Baseado no romance de mesmo nome, o filme dirigido pelo argentino naturalizado brasileiro Hector Babenco já traz poesia no seu próprio título. Ele conta a história de um casal de missionários americanos (Aidan Quinn e Kathy Bates, ótimos) que se mudam para o interior do Norte do Brasil, onde devem reiniciar o trabalho de catequização de uma comunidade indígena, cujos últimos esforços não foram bem-sucedidos. Além disso, conhecemos o piloto de avião Lewis Moon (Tom Berenger), cujo relacionamento com os indígenas vai se tornar mais forte do que ele jamais imaginou.

Com mais de três horas de duração, o filme se arrasta em diversos momentos, mas, ao final, ele é capaz de oferecer uma visão assustadora da arrogância do “homem branco” diante de uma cultura que ele considera “atrasada” e os estragos irreversíveis que são causados em função disso. O longa foi parcialmente filmado na Venezuela e as tomadas aéreas da floresta, que mostram serras e cachoeiras gigantes (incluindo a maior de todas, o Salto Angel), são de tirar o fôlego.  O filme está disponível com legendas no Youtube.


A Floresta das Esmeraldas (1985)

O filme conta a história, inspirada em fatos reais, de um engenheiro americano (Powers Boothe) que se muda com a família para Belém do Pará, para trabalhar na construção de uma grande hidrelétrica, mas cujo filho, de apenas sete anos, é raptado por indígenas e desaparece no meio da floresta. Pelos próximos dez anos, o engenheiro continua a trabalhar na obra, sem nunca desistir de procurar pelo filho. Em uma dessas expedições, ele finalmente encontra o menino, que agora já se transformou num homem e, para sua surpresa, está plenamente integrado à tribo indígena e não tem nenhum interesse em voltar para a civilização.

O diretor John Boorman confere um tom leve e de aventura ao longa e o resultado é um filme despretensioso e agradável como aqueles que passavam antigamente na Sessão da Tarde, que ainda consegue apresentar uma pertinente mensagem ecológica sem soar demagogo. Com uma bela fotografia e uma trilha sonora instrumental que reforçam as paisagens e o caráter místico da floresta, o filme se destaca ao conferir realismo às encenações de diversos rituais xamânicos e pelo uso de dialetos nativos em grande parte da projeção (nada de indígenas falando inglês com sotaque). Destaque também para a atriz Dira Paes naquele que é o seu primeiro papel da carreira, com apenas 16 anos, interpretando a índia Kachiri.


Histórias do Rio Negro (2007)

Este documentário dirigido por Luciano Cury mostra a viagem de barco realizada pelo médico Drauzio Varella por um dos recantos mais deslumbrantes de toda a Amazônia: os mil quilômetros do Rio Negro que separam Manaus de São Gabriel da Cachoeira, no extremo norte do Amazonas. Com suas águas escuras que em dias ensolarados se transformam em um imenso espelho, o Rio Negro oferece paisagens de rara beleza que são captadas de maneira sublime pelo filme. Durante a viagem, Drauzio Varella para em diversas comunidades ribeirinhas e conversa com as pessoas que ali vivem. São pessoas simples e batalhadoras, que compartilham histórias cheias de lendas e superstições que revelam uma relação íntima e de grande respeito com a natureza.

O documentário infelizmente está fora de circulação e é muito difícil encontrá-lo. Por isso, se tiver a mínima chance, não desperdice a oportunidade de ver este filme que mostra de maneira sensível a face humana de um verdadeiro paraíso natural.


Aguirre, a Cólera dos Deuses (1972)

Don Lope de Aguirre é uma das figuras históricas mais controversas do período das grandes navegações do século 16. Sua infame expedição em busca da lendária cidade de Eldorado é retratada aqui com intensidade pelo diretor alemão Werner Herzog. Movido pela cobiça e por devaneios de grandeza, Aguirre é um homem torturado cuja cega obsessão irá levar ele e todos ao seu redor à destruição. A interpretação de Klaus Kinski é nada menos que histórica, incorporando a insanidade do personagem de maneira assustadoramente real. Em um dos melhores momentos do filme, Aguirre está delirando e falando palavras sem nexo. Porém, por alguns breves segundos, os grandes olhos azuis de Kinski miram diretamente o espectador, e o brilho feroz que emana do seu olhar é tão forte que nos tira da segurança do nosso lar, como se naquele momento o personagem fosse capaz de sair da tela e nos puxar para dentro do seu próprio inferno verde. Um dos grandes momentos do cinema mundial, proporcionado pelo talento colossal de um diretor e um ator que estavam apenas iniciando uma das relações de amor e ódio mais antológicas da sétima arte.


Fitzcarraldo (1982)

Dez anos após o lançamento de Aguirre, Werner Herzog e Klaus Kinski voltam a se encontrar naquele que pode ser considerado o ápice da carreira de ambos. Aqui mais uma vez somos testemunhas da loucura de um homem em meio à floresta. Porém, diferentemente de Aguirre, Brian Sweeney Fitzgerald, a quem os moradores locais chamam simplesmente de Fitzcarraldo, é tomado não pela insanidade da cobiça, mas sim pela determinação teimosa de realizar um sonho.

Para ele, após se deslumbrar com a apresentação do soprano Caruso em um espetáculo de ópera encenado no luxuoso Teatro Amazonas, fica claro que a sua missão é poder proporcionar este mesmo tipo de experiência cultural para outras pessoas, o que ele pretende fazer ao construir um novo teatro, tão grandioso como o de Manaus, na cidade peruana de Iquitos. Para tanto, ele está disposto a se aventurar por um território da floresta ainda inexplorado e ocupar uma vasta área de seringueiras, tornando-se assim ele próprio um barão da borracha.

A missão de Fitzcarraldo é louca, quase certamente fadada ao fracasso e até mesmo suicida, logo, não muito diferente da expedição empreendida por Aguirre. Só que agora o olhar do diretor nos permite ver a beleza e até mesmo sentir uma certa admiração pelos esforços quixotescos do personagem ao lutar contra todos os obstáculos possíveis e imagináveis para (tentar) alcançar o seu objetivo. Uma crítica ácida e, ao mesmo tempo, uma homenagem apaixonada a todos os sonhadores deste mundo.

https://www.youtube.com/watch?v=F53yUsgVuL0