A comédia Até que a Sorte Nos Separe se tornou o filme nacional de maior arrecadação em bilheteria no ano passado. A história do casal da “classe C” que tira a sorte grande na Mega-Sena encontrou ressonância junto ao publico brasileiro, provavelmente por extrair seu humor da própria ascensão social e econômica deste segmento da população nos últimos anos. Como geralmente acontece com sucessos do cinema, agora vem a continuação, que novamente se aproveita dos estereótipos dos “novos ricos” brasileiros para criar humor. Pena que os roteiristas e o diretor Roberto Santucci não aproveitem a oportunidade em mãos e se contentem em reutilizar o humor rasteiro e sem inspiração tão comum na produção brasileira atual.

No começo de Até que a Sorte Nos Separe 2, o casal Tino e Jane (vividos por Leandro Hassum e Camila Morgado) voltou à pindaíba, mas logo recebem uma “boa” notícia: a morte de um tio os deixou com uma polpuda herança. Tudo que eles precisam fazer é ir até o Grand Canyon, nos Estados Unidos, para jogar as cinzas do falecido. Mas Tino resolve aproveitar e levar toda a família para Las Vegas. Lá, perde a herança na mesa de jogo e começa a ser perseguido pelo seu credor, um bandido ligado à máfia mexicana.

Pode-se afirmar que o filme representa uma oportunidade perdida porque a premissa concebida pelos roteiristas era perfeita para satirizar a mais brega das cidades americanas e os aspectos mais toscos da sociedade deles, o apelo do dinheiro fácil e o culto à figura do “vencedor”. E contrapor tudo isso à cafonice brasileira, afinal a caricata família do filme poderia ser usada para mostrar como muitas vezes nós sobrevalorizamos a cultura americana, quando eles podem ser tão cafonas quanto nós. Infelizmente, não é o que ocorre: de sátira, Até que a Sorte Nos Separe 2 tem muito pouco, e se apoia sobretudo na performance discutível de Leandro Hassum para fazer rir.

Hassum é um daqueles comediantes que parece acreditar que falar alto é sinônimo de ser engraçado. A performance dele já é muito histriônica (ele vestido de mulher ao fazer a mãe de Tino, então, é um horror) e combinada com a sua gritaria acaba deixando seu personagem meio irritante. Às vezes ele acerta, principalmente quando se concentra na parte física da sua atuação – a cena na qual ele dança com os strippers no clube das mulheres, por exemplo. Mas mesmo esse momento é estragado pela direção, que estende a piada até ela deixar de ter graça.

Aliás, a direção se atrapalha com coisas simples, como a introdução da atriz Camila Morgado – quando a cena faz questão de nos lembrar, de forma exagerada, que ela está ali substituindo Danielle Winits, intérprete do papel no filme anterior. E no final, Santucci não consegue nem mostrar direito o movimento do lutador Anderson Silva (sim, ele está no filme por algum motivo) para derrotar o vilão da história.

Outro que faz uma participação especial no filme é a lenda da comédia Jerry Lewis, de forma surpreendente. Suas duas cenas, porém, são bem inócuas e sem graça – sem contar que Tino aparentemente fez um curso relâmpago e aprende a falar inglês entre sua primeira e sua segunda cena com Lewis… O lendário comediante é desperdiçado numa obvia tentativa de emprestar sua reputação ao projeto.

Pelo menos a produção é mais feliz ao fazer uso das paisagens americanas, como a Las Vegas iluminada pela noite, o Grand Canyon e a famosa estrada Rota 66. E a presença dos sósias de personalidades americanas famosas como Oprah Winfrey e Johnny Depp na mesa de jogo de Tino é uma das (poucas) boas piadas visuais do filme.

Se quando o filme tenta ser engraçado ele funciona na base da tentativa-e-erro, nas suas tentativas de comover o espectador o resultado é sempre desastroso. Como nos constrangedores minutos finais, quando a comédia dá lugar a lições de auto-ajuda. De certa forma, essa é a proposta de Até que a Sorte Nos Separe 2: nos fazer rir de situações manjadas e estereótipos culturais, com uma pequena liçãozinha de moral no seu desfecho. O filme até faz rir em alguns momentos e fãs do primeiro devem ficar satisfeitos, mas o resultado final poderia ser mais engraçado, mais anárquico, mais satírico.

Mas não adianta julgar um filme pelo que ele poderia ser, apenas pelo que ele é, e no fim das contas os realizadores de Até que a Sorte Nos Separe 2 demonstram ter pensado pequeno. Eles parecem tão deslumbrados com as luzes de Las Vegas quanto seus personagens desmiolados. Foram aos Estados Unidos fazer turismo e o cinema ficou em segundo plano.

NOTA: 3,0