Como avaliar arte? Como questionar intenções artísticas? E mais importante, como selecionar os potenciais artistas do amanhã? Estas são algumas das perguntas que “Art Talent Show”, filme que teve premiére mundial no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary deste ano, propõe e tenta responder. A produção tcheca, vencedora inaugural do Grande Prêmio da mostra Proxima, surpreende ao abordar essas questões de maneira irreverente, esbanjando momentos hilários.

O documentário gira em torno da seleção para a Academia de Belas Artes de Praga, no qual os candidatos devem submeter trabalhos, criar obras em tempo determinado, responder a testes e passar por extensas entrevistas individuais. Quem já passou por processos similares sabe como a experiência pode ser excruciante, mas o recorte inusitado dos diretores Adela Komrzý e Tomáš Boja torna o filme uma comédia que aponta para a absurdez do conceito do “vestibular de arte”.

O foco dos realizadores não está nos aspirantes a alunos, mas nos professores. Os candidatos aparecem mais – especialmente na parte das entrevistas, que transborda humor de constrangimento – mas são os mestres que guiam “Art Talent Show” e é através de seus olhos que o público entrevê o misto de apatia e desespero de ter que selecionar artistas tão jovens para a academia.

O olhar e o tom são empáticos, o que não impede os professores de mostrarem suas facetas menos lisonjeiras para a câmera. Vladimír Kokolia, por exemplo, é o clássico malvadão que faz as entrevistas muito desconfortáveis e odeia abertamente quando os candidatos justificam suas criações com a necessidade de autoexpressão. Em outro ponto, Kača Olivová – de longe a mais divertida personagem em cena – menciona o desinteresse em produzir obras de arte. 

O INGRATO DE PAPEL DE AVALIAÇÃO DA ARTE

A montagem certeira de Hedvika Hansalová é o pulso da produção e é nas suas mãos que os melhores momentos dela viram ouro cômico. A discussão na sala dos professores para escolher os possíveis temas da 2a fase do exame é de rachar o bico, bem como a correção das provas escritas.

Do outro lado, os candidatos também não deixam por menos quando o assunto é senso do ridículo: uma candidata sugere transmitir AIDS como uma performance artística; outra, não-binária, é bastante vocal na quebra de paradigmas de gênero, mas toda a sua produção artística gira em torno de desenhos de pênis. Na tentativa de explicar suas verves criativas para garantir uma vaga, os jovens se colocam em retóricas impossíveis – e a partir daí, as risadas são garantidas.

“Art Talent Show” não quer falar exatamente sobre que obras de arte são melhores (ou mais bem-sucedidas) do que outras. Se quisesse, talvez mostrasse os aprovados na seleção. Ao invés disso, o documentário quer instigar uma reflexão sobre o papel ingrato dos profissionais que têm que fazer esse tipo de avaliação. Depois dele, você provavelmente nunca mais verá uma exposição da mesma forma. 

Filme visto na cobertura do Festival de Karlovy Vary 2022.

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