• “Chorar de Rir” (2019). Direção: Toniko Melo. Elenco: Leandro Hassum, Monique Alfradique, Otávio Muller, Natália Lage.

Lançado discretamente nos cinemas brasileiros no último fim de semana, “Chorar de Rir” é o mais interessante filme protagonizado por Leandro Hassum em anos. Tudo bem que isso que não era algo tão difícil assim, afinal, estamos comparando com obras-primas como “Até que a Sorte nos Separe 1, 2, 3“, “O Candidato Honesto 1 e 2“, “Os Caras de Pau”, “Vestido Para Casar“.

Por outro lado, percebe-se um artista incomodado com a forma com que o seu trabalho é analisado por críticos e pela própria classe artística, servindo o filme como uma espécie de resposta a todos aqueles que o diminuem de certa forma. Pode até não ser admitido, mas, é o que transparece ao longo dos 103 minutos de duração.

Dirigido e roteirizado por Toniko Mello (“Vips”), a produção mostra a trajetória de Nilo Perequê (Leandro Hassum), o humorista mais popular da televisão brasileira. Cansado de ser diminuído pelos colegas, ele decide sair da comédia e se aventurar pelo drama ao se aliar com um diretor renomado (Felipe Rocha) para fazer uma versão do clássico do drama, “Hamlet”, de William Shakespeare”. Durante a apresentação, porém, tudo sai errado e ele se vê enfeitiçado. Somente ao arrancar o riso de uma pessoa que nunca sorriu, Perequê estará livre da maldição.

A FÚRIA PROBLEMÁTICA

“Chorar de Rir” utiliza-se de indiretas para atacar seus alvos. Perequê/Hassum cita os filmes nacionais que ninguém vê, provoca quem acha que ele perdeu a graça após emagrecer, coloca de antagonista o diretor teatral premiado todo arrogante como uma sátira àqueles que o diminuem como um artista, sacaneia os métodos de preparação de atores, deixa os ensandecidos críticos trancados no porão de um barco à deriva. Sobra também ataques aos artistas de uma nota só, repetidos em uma única fórmula como os sertanejos e funkeiros (pelo menos, há uma zoeira engraçadinha com um clássico humorista nacional).

Acima de tudo, Leandro Hassum quer trazer à baila o velho, mas, sempre importante debate sobre a falta de credibilidade com que o humorista é tratado dentro das artes e perante o público. Neste ponto, a reivindicação é válida vide o que ocorre durante a temporada de premiações quando gente como Melissa McCarthy só consegue ter chances na hora em que migra para o drama e atuações fantásticas como Sacha Baron Cohen fez em “Borat” não são nem consideradas.

Nem toda a fúria contra o cenário artístico faz de “Chorar de Rir” um bom filme. Temos uma trama super previsível incapaz de desenvolver qualquer conflito de forma satisfatória (pobre Monique Alfradique), ancorada em piadas nada engraçadas com trocadilhos constrangedores reconhecidos pelo próprio roteiro (braço direito canhoto, nunca dei meus fundos, perequete e coisas do gênero).

Há espaço também para um final pseudo-emotivo para fazer o público chorar, não de rir, mas, à fórceps, utilização de efeitos sonoros simplórios para indicar a hora da risada, momentos nada a ver (o que diabos é o trecho “Cantando na Chuva“???) e Leandro Hassum careteiro mais do que Jim Carrey na época de “O Máskara”. Por fim, até mesmo a boa sacada da trilha sonora com uma versão mais clássica de ‘Despacito’ se dilui por tantas vezes ser executada.

AUTO-CRÍTICA VAI BEM

E aí reside o grande ponto que Leandro Hassum não parece estar interessado: falta auto-crítica para perceber que os filmes dele precisam evoluir.

Verdade que “Chorar de Rir” seja um salto (pequeno, diga-se), mas, o problema do cinema feito por ele não ser reconhecido deve-se à baixa qualidade do material que apresenta. Até mesmo o tipo de humor careteiro dele soa datado para os tempos atuais – Jim Carrey e o próprio colega dele na Globo, Marcius Melhem, foram por outros caminhos mais interessantes nesta década.

Procurar “inimigos” nos filmes nacionais que “quase ninguém vê” e achar profissionais arrogantes apenas por não gostarem do trabalho dele soa infantil e até burro, afinal, os longas nacionais pouco vistos, em sua maioria, sofrem com baixa distribuição e divulgação, algo que as comédias de Hassum não enfrentam. Além disso, humor popular não significa tratar o povo como idiota: é possível, sim, ser inteligente. Na comédia, Chico Anysio, Jô Soares e a turma do “Tá no Ar” deixaram valiosos exemplos disso no Brasil, enquanto o recente “Nós” mostrou o mesmo para o terror.

Se Alejandro González Iñarittu detonou toda a indústria de Hollywood e ainda saiu aplaudido pela mesma no ótimo “Birdman”, Leandro Hassum, no máximo, consegue levantar um ‘isso aí’ tímido dos colegas humoristas com “Chorar de Rir”.

Pelo menos, é mais do que o constrangimento gerado pelas bombas anteriores.