As dores de amadurecimento dão o tom de “Close”, novo filme de Lukas Dhont que estreou em Cannes – onde dividiu o Grand Prix com “Both Sides of the Blade”, de Claire Denis – e foi exibido no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary. O drama confirma o diretor belga como um dos maiores expoentes do cinema queer da atualidade, com uma potente história que pode requerer o uso de lenços aos espectadores mais sensíveis.

O longa acompanha Léo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav de Waele), dois meninos do interior da Bélgica que vivem uma amizade unha-e-carne. Quando eles começam o ano letivo em um novo colégio, a proximidade os torna alvo das típicas chacotas estudantis, o que introduz tensão na até então plácida intimidade. Eventualmente, Léo decide colocar barreiras entre si e Rémi, com consequências trágicas para todos os envolvidos.

O roteiro, escrito pelo diretor, é hábil em prender o público logo no início dos 105 minutos de duração e aumentar a carga dramática do conflito devagar, mas constantemente. O resultado é um filme paciente, mas não maçante, em que cada cena – em seus pequenos detalhes – adiciona uma gota a mais em uma situação que está a ponto de transbordar.

Um exemplo é a reação devastadora de Rémi quando Léo parte para o soco por não querer dormir na mesma cama com ele, como faziam sempre. Ela serve como prelúdio para a grande briga entre os dois cerca de dez minutos depois, que, por sua vez aponta para uma ruptura séria da amizade. Aos poucos, a ternura que regia a relação dá lugar à violência. 

AS RESTRITIVAS BARREIRAS DA VIDA ADULTA

O processo de normatização da brutalidade entre meninos pré-adolescentes é uma notória preocupação temática do subtexto da produção. Enquanto Rémi se enturma com os deslocados, Léo se infiltra entre os populares em uma tentativa de afirmar uma identidade independente do velho amigo. Isso o leva a praticar pesados esportes de contato e ajudar no trabalho pesado da fazenda de sua família. Aos poucos, o sensível menino vai embrutecendo.

Ver esse desenvolvimento complexo na atuação de Dambrine é tão hipnotizante que é difícil crer que esse é seu trabalho de estreia. De Waele – também estreante – incorpora com precisão a inocência perdida de seu personagem. E entre os coadjuvantes, Émilie Dequenne – uma das maiores atrizes belgas de sua geração – está fantástica como a mãe de Rémi, oscilando entre o desespero e a aceitação de uma situação a qual não consegue explicar.

Entender os pormenores da trama e reconhecer os talentos envolvidos, no entanto, não torna o filme mais fácil de assistir: “Close” é um filme lindo, intenso e duro sobre o fim da infância. Ele argumenta que crianças falam sobre tudo e que a vida adulta começa quando essa habilidade se esvai. No silêncio que resta, culpa, dor e vergonha nascem para ocupar as mentes que outrora só pensavam em soldados de mentirinha. 

Crítica faz parte da cobertura do Cine Set do Festival de Cinema de Karlovy Vary 2022.