“La Mif”, nova produção do diretor Fred Baillif (“Tapis Rouge”), é um drama social devastador – ainda que não da maneira comumente vista em filmes do gênero. Ganhador do prêmio de Melhor Filme da mostra Generation 14plus do Festival de Berlim deste ano, o longa da Suíça é uma dura análise do sistema de proteção de menores deste país europeu, contado do ponto de vista tanto de tutelados quanto de tutores.
A “Mif” do título é uma gíria para “família” – e é a forma como um grupo de meninas que vive em um abrigo de menores se refere a si mesmo. Os motivos que as levaram lá são multifacetados, mas muitos são relacionados a abusos sofridos no seio de suas famílias.
Elas são acompanhadas por um grupo de agentes sociais chefiados por Lora, uma mulher que carrega sofregamente o fardo psicológico da profissão, mas que consegue ter uma relação próxima – na medida do possível – com as meninas.
Usando como ponto de partida um espinhoso caso de sexo entre adolescentes ocorrido dentro do abrigo e o retorno de Lora após uma licença por motivo de doença, “La Mif” apresenta cada uma de suas oito personagens principais (as sete menores mais Lora), sem se ater a arcos narrativos clássicos.
“La Mif” argumenta que essas vidas, complicadas e de certa forma interrompidas por uma miríade de fatores, não se prestam à compartimentalização e nem à organização para fins dramáticos.
PRONTO PARA A AÇÃO
Escrito por Baillif em colaboração próxima com seu elenco de atrizes mirins não-profissionais, o roteiro apresenta uma compilação de histórias em que as linhas entre certo e errado são constantemente borradas por emoções à flor da pele.
Isso é reforçado pela montagem simultaneamente fluida e precisa, também executada pelo diretor. Ela desloca imagens através da cronologia de eventos, recontextualizando-as com novas informações e novos ordenamentos. O retorno de Lora ao abrigo, mostrado logo no início do filme, por exemplo, ganha um contorno completamente diferente quando reapresentado em uma versão estendida no terceiro ato que explicita o motivo de sua ausência.
Nas mãos de Hollywood, os mesmos elementos poderiam render uma história de uma agente social mudando a vida de um grupo de garotas. A dureza do filme vem da lembrança de que a realidade não é tão simples como no cinema e muitas vezes, os profissionais que cuidam de jovens em situação de risco são tão problemáticos quanto os menores sob sua tutela.
“La Mif” aponta corajosamente para um problema que não parece ter solução, mas o faz de maneira esperançosa, com muitos momentos em que suas personagens conseguem enxergar a vida para além de sua situação. É um filme belo e trágico – mas como as mulheres em seu centro, pronto para a ação.