A presença de Linn da Quebrada no BBB tem trazido discussões e pautas importantes sobre o corpo travesti, que se condensam diante do fato do Brasil ser o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo todo. O debate sobre a violência contra esta população é o que norteia “Madalena”, primeiro longa-metragem de Madiano Marchetti.

Rodado no interior do Mato Grosso do Sul, a narrativa acompanha três jovens que tem condições socioculturais e perspectivas de vida diferentes. Apesar de morarem na mesma cidade, nenhum deles se conhece, mas tem suas trajetórias cruzadas por Madalena. A personagem, na verdade, é uma figura ausente. Através da descoberta de seu cadáver na plantação de soja de Cristiano (Rafael Bona), temos o start da trama, tornando-se o elo de ligação entre os protagonistas.

Toques e reações

A produção mostra como cada um dos personagens centrais se comporta diante do ocorrido com Madalena, esboçando diferentes formas de se reagir a violência e a brutalidade, como empatia, inércia e medo. Nesse ínterim, a ausência e a ligação entre eles se manifesta por meio de perseguições fantasmagóricas, uma procura incessante e uma lembrança bem pontuada. Tais elementos acentuam a presença de espírito da personagem-título e ofertam ao filme tonalidades de gênero diferentes.

Marchetti passeia entre a ficção científica e um drama naturalista, apresentando situações corriqueiras e diálogos prosaicos que não aprofundam a conexão entre os personagens e nem adensa as jornadas que o roteiro propõe explorar. Cada recorte, em sua particularidade, possui dramas e situações bem articulados e que refletem a vivência da juventude no Brasil contemporâneo, mas que aqui perdem pela carência de aprofundamento. O resultado é uma obra estruturalmente interessante, porém, quando observada de perto, rasa e dessincronizada.

A busca por um lugar

No passeio pelas tramas, a visão do centro oeste brasileiro chama a atenção. Marcheti demarca o cenário dessa região pouco vista no audiovisual nacional, por meio da escolha de planos, movimentação de câmeras e iluminação. A fotografia assinada por Guilherme Tostes e Tiago Rios é um componente importante para ambientar os protagonistas e forjar a figura imaterial de Madalena.

A atmosfera criada coloca em destaque a perspectiva dos protagonistas sobre ela, o que é refletido diretamente pela iluminação natural que alterna entre cenas rodadas exclusivamente de dia – para personagens solares – e a noite, evidenciando o assombro e a perturbação instaurada pelo cadáver. A luz também serve como mediador das relações, entregando desde narrativas que se propõem a serem leves e cotidianas a situações pesadas e cansativas.

“Madalena” desenha ainda os principais temas que envolvem a questão do território e da identidade no centro oeste. Assim, o agronegócio, o viés político e o predomínio do sertanejo são elementos intensos na narrativa e auxiliam a inserção de pontos de discussão pouco difundidos no cinema nacional como a variedade de corpos e a presença de espaços e vivências distantes do olhar massificado.

Marchetti evoca um cinema naturalista para dar voz e vez a corpos e imagens do Brasil não enxergadas por seus próprios habitantes. Mostrando que, apesar das ausências e por conta delas, é possível construir um fio condutor que una as diferentes experiências tupiniquins. É uma pena que não consiga explorar melhor essas situações e aprofundar seus personagens.

MAIS CRÍTICAS NO CINE SET: