“O mundo é dos homens”. Essa famosa frase não é em vão: o mundo realmente é dos homens. Nas entranhas sociais, os homens mantêm o seu protagonismo. Nas sociedades, o patriarcado e suas ramificações, como machismo, imperam e constituem as normas estabelecidas sob a ótica do homem. O homem. O viril, o ordenador, o inventor, o salvador. O homem poderoso. Poder! Poder é quase um sinônimo deste patriarcado (branco). O homem, com suas mãos grandes e espessas, com sua suposta força, coordena a estrutura e mantém o seu poder. O poder é importante na manutenção do seu eu dominante, em quaisquer esferas. O homem é poderoso apenas por ser homem, afinal. O poder, portanto, se estrutura em todas as formas em que ele, o homem, pode dominar, social, político, cultural, intelectual, sentimental. O patriarcado precisa desse discurso para manter o seu domínio, a sua ordem, a sua importância em um mundo dominado por ELES.

Pensando nisso, Alex Garland (“Ex-Machina”, 2015) nos entrega mais uma produção inquietante e perturbadora. “Men” (2022) é um thriller psicológico, até bizarro, que coloca em xeque esse poder do patriarcado na sociedade e como ele atravessa nas mulheres de forma violenta e violadora.

Harper (Jessie Buckley, maravilhosa) depois de uma separação nada amistosa com o marido James (Paapa Essiedu, de “I May Destroy You”, 2020) resolve ir ao campo para esquecer os traumas e se renovar. Lá, é recebida pelo dono da casa Geofrey (Rory Kinnear, excelente! – merecendo destaque desde o show de atuação na série “Penny Dreadful”, 2014-16). Mas toda a calmaria se transforma em pesadelo quando um indivíduo nu a persegue.

DAS PEQUENAS ÀS EXPLÍCITAS VIOLÊNCIAS

Partindo desse princípio, Garland faz um estudo social simbólico acerca desse poder dominante do homem e como ele é personificado nesta figura máscula, potente e onipresente que ele mesmo criou para si. Um thriller com vertentes bizarras em uma sequência final de muito incômodo e angústia que representam de forma certeira esses fundamentos masculinos impressos na sociedade e de como a mulher, longe de ser o sexo frágil, se vê vulnerável e até desamparada por atitudes do homem.

E as pequenas violências do patriarcado e machismo são muitas, desde as mais implícitas, como sempre chamar a personagem pelo nome de casada, mesmo separada. Até as mais explícitas, como culpá-la pelo grande trauma que a levou até ali ou xingá-la por não fazer as vontades masculinas. Mais ainda, penetrar em sua mente, no seu ser para condená-la pelo fracasso do casamento e não querer a separação, a violência, aqui, psicológica e literal, são as violências que as mulheres sentem diariamente, em um relacionamento tóxico e sufocante. Aliás, ser mulher em um mundo entorpecido pela figura do homem poderoso é sufocante. Não se esqueçam de que o homem é mimado pelas circunstâncias que lhe privilegiam.

 FORÇA DO HOMEM PELO DISCURSO

Foucault nos diz “que são os discursos eles mesmos que exercem seu próprio controle”. Essa é uma grande questão na vida e na ficção: “Men” define muito bem essa ordem do discurso, mais uma vez parafraseando Foucault, para explanar essa força poderosa do homem. Ele é tão poderoso, tão bem articulado e planejado que parece que têm as mesmas faces, o discurso não muda e se renova a cada nova geração. O fantasma do patriarcado se desenvolve desde a infância, passando por toda a vida e até mesmo na religião que, historicamente, exerce esse diálogo da supremacia do homem.

E não adianta falar dos abusos desse poder quando não há uma vontade mínima de melhora. Pois esse poder dominante e dominador são como a Hidra de Lerna, mata um, renasce mais dois. O homem nasce de si mesmo, afinal. E ao fim, não há outra escapatória que enfrentar essa força para sobreviver e, claro, contar com outra figura feminina, aqui, com sua amiga Riley (Gayle Rankin), que mesmo distante consegue ver de fora e não pensa duas vezes em ir ao encontro da amiga. Mulheres devem se fortalecer!

“Men” é angustiante, bizarro, violento, nojento e estarrecedor. O duro é pensar que esses simbolismos impressos no filme não chegam nem perto da realidade dura, crua, cruel e que mata!

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