Uma dançarina à beira do abismo é o foco de “Mirrors in the Dark”, filme tcheco que teve sua estreia mundial no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary deste ano. O longa de estreia de Šimon Holý, exibido na mostra Leste do Oeste do evento, capricha no visual com uma bela fotografia em branco e preto, ainda que derrape no ritmo e teste a paciência do espectador casual.
Marie (Alena Doláková) divide seu tempo entre os ensaios para seu novo espetáculo de dança, as festas ocasionais e o romance com o namorado František (Borek Joura). Ela, no entanto, não é feliz. Com 30 anos, ela constantemente questiona seu talento artístico, a saúde do seu relacionamento com a mãe e o caminho que seu namoro está tomando. “Mirrors in the Dark” acompanha a jovem enfrenta uma crise existencial (nem sempre) silenciosa e busca uma saída para ela.
Estruturalmente, a produção usa um questionário de 36 perguntas, que pode fazer duas pessoas se apaixonarem dependendo das respostas de cada uma. Marie e František resolvem responder e, a partir delas, temos a base a partir da qual as cenas se desdobram.
Essa decisão se prova um problema fatal no ritmo de “Mirrors in the Dark”. Em três longas cenas que sozinhas computam 41 minutos (praticamente metade do tempo de projeção), Holý não consegue avançar a narrativa. O resultado é uma discussão interminável que joga um balde de água fria nas expectativas do público toda vez que ressurge.
PLASTICIDADE ABSORVE ROTEIRO INDECISO
O roteiro, também assinado pelo cineasta, esboça razões para o tédio da sua protagonista, mas, com tanto tempo dedicado às performances de dança e às cenas do questionário, o cerne da tristeza de Marie nunca é abordado. A câmera a acompanha andando pelas ruas à noite, chorando sozinha em seu quarto e contemplando sua situação, mas a trama não abre espaço para discutir o porquê dos eventos mostrados.
Pelo pouco oferecido, Marie parece uma arquetípica jovem contemporânea, cheia de pessimismo, obcecada com sua auto importância e que trata a vida como se fosse um jogo cujas etapas precisa vencer. Em si mesma, ela serve como um comentário preciso de sua geração e teria sido ótimo ver essa faceta sendo mais explorada na produção.
O forte de “Mirrors in the Dark” acaba sendo seu apuro técnico e visual. A belíssima fotografia em preto e branco – cortesia da diretora de fotografia Jana Hojdová – rouba a cena e dá um ar onírico à obra, especialmente durante as coreografias. Pequenos detalhes, como a progressiva aproximação da câmera durante as cenas do questionário, reforçam a confiança que os realizadores têm na sua linguagem cinematográfica.
Inevitavelmente, é a falta de definição do roteiro que se torna um obstáculo nos passos e movimentos de “Mirrors in the Dark”. Por mais que seu look mostre o potencial de Holý e seus colaboradores, a sensação final é que há mais passos em falso do que piruetas no filme.