Filmes de espionagem quase sempre ostentam um ar noir, como uma ode aos filmes antigos da Era de Ouro de Hollywood. Com clima denso, a tensão toma conta, as intrigas são o plot principal nesses enredos frios e sem espaço para o humor e, via de regra, quase sempre baseados em casos reais.
“O Espião Inglês”, a mais recente produção do dramaturgo com longa experiência nos palcos britânicos, Dominic Cooke (“On Chesil Beach”), bebe dessa fonte e, entre acertos e erros, entrega um filme envolvente, ainda que esquecível.
Greville Wynne (Benedict Cumberbacth) é um carismático empresário que não mede esforços para conseguir vender seus serviços. Bem relacionado e sempre viajando em busca de uma venda em potencial, ele é um homem perfeito e acima de qualquer suspeita, para que o MI6 e a diplomata estadunidense Emily Donovan (Rachel Brosnahan, nossa Marvelous Mrs. Maisel), o recrute para se infiltrar no governo da União Soviética. De repente, um homem relativamente simples está trabalhando como espião, no programa nuclear soviético – para quem não compreende um pouco da história recente, esse período ficou marcado como Crise dos Mísseis de Cuba, tempos tenebrosos durante a Guerra Fria.
Em Moscou, Wynne tem como seu aliado o coronel Oleg Penkovsky (Merab Ninidze), um ex–combatente de guerra insatisfeito com os rumos que o país está tomando e temeroso quanto uma nova possibilidade de Guerra Mundial.
Entre idas e vindas, tensões e descobertas alarmantes, nasce uma amizade verdadeira entre Greville e Oleg. Tudo isso narrado pelo próprio Greville Wynne (falecido em 1990) em dois livros de sua autoria que serviram como base para O Espião Inglês: “The Man From Moscow” (1967) e “The Man From Odessa” (1981).
Cumberbacth Acima da Média
Pode-se dizer que o filme é dividido em dois atos: o primeiro que reconstrói a história e toda aflição em estar fazendo algo errado, mas pelo bem geral da nação. Além do sentimento de culpa, do medo, aliado às tarefas que devem ser cumpridas e os conflitos familiares, aqui, representado pela esposa de Greville, Sheila (Jessie Buckley), que desconfia do marido e suas viagens sem mais detalhes. Já o segundo ato é focado na emoção, quando ambos, lógico, são descobertos.
Logo no começo disse que os filmes de espiões são redondos por já virem com certo arquétipo. Cooke não foge à regra. E na representação de um filme que se passa na Guerra Fria, o clima gélido é constante. O grande triunfo dele, em termos técnicos, é a sua trilha sonora contagiante. Soa como uma personalidade de Greville (não nos esqueçamos de que ele era um espião, portanto, representando): alegre e divertido e ao passo que se aprofunda cada vez mais na causa, torna-se densa e melancólica. A trilha, aliada à direção de arte, dão certo charme ao longa.
Todavia, The Courier (seu título em inglês), não teria o mesmo êxito se não fosse o talento de Benedict Cumberbacth que, mais uma vez, entrega um trabalho acima da média. É uma atuação cuidadosa, vívida no primeiro momento para momentos de pura aflição na sequência. Sua transformação soou genuína.
Um trabalho espetacular, assim como seu companheiro em cena, Merab Ninidze. Se o Globo de Ouro ainda fosse relevante, certamente poderiam estar facilmente na seleção de ator e ator coadjuvante. Rachel Brosnahan está bem, mas já começa a mostrar estar presa na persona Miriam Maisel (“The Marvelous Mrs. Maisel“).
Por ser um drama histórico, não haveria como fantasiar, como geralmente acontece, para agradar a plateia. “O Espião Inglês” está longe de ser comparado aos melhores filmes de espiões noir ou até mesmo ao melhor filme de espião dos últimos tempos, O Espião que Sabia Demais (2011), também com o Benedict, mas agrada e pega pela emoção, pois Cooke narra uma história verídica e histórica que tornou os dois personagens centrais heróis.
Contou, principalmente, sobre a amizade entre dois homens totalmente distintos, fieis aos seus princípios e preocupados com os rumos da humanidade naquele momento. Uma pena que ele, entre tantos filmes bons gênero, passe despercebido.
Destaque para Benedict Cumberbacth, soberbo!
Soberba, de fato, a interpretação de Benedict Cumberbatch. Acho que colocaria o filme em um nível de maior qualidade do que o que foi dado pelo crítico. Até um certo alívio ao assistir algo com um roteiro mais definido, sem baboseiras, e uma história definida.
Corrigindo: uma história mais enxuta.