Em Palmer, drama da Apple TV+ dirigido pelo ator e diretor Fisher Stevens, a proposta é lançar um olhar sensível sobre questões de gênero e de masculinidade. É a história de um homem endurecido de uma geração anterior confrontado pelo mundo moderno, e aprendendo a compreender e aceitar um comportamento não-binário quando acaba se tornando uma espécie de pai adotivo.
No filme, acompanhamos Eddie Palmer (vivido por Justin Timberlake), que acabou de ser libertado da prisão após cumprir pena de 12 anos. Ele retorna à cidadezinha modorrenta onde cresceu para viver com a avó (June Squibb), sua única parente. No trailer vizinho à casa deles, mora Shelly (Juno Temple), uma moça que tem problema com drogas, e seu filho Sam (o estreante Ryder Allen). As circunstâncias acabarão fazendo com que Palmer e Sam passem a viver juntos, e o rapaz acha estranho o fato do menino gostar de brincar com bonecas e de assistir a um desenho animado com fadas e princesas na TV. Ele não é o único, porém: Na escola e pela cidade, Sam começa a ser ridicularizado e a sofrer bullying, e Palmer acaba tendo que defendê-lo e a cuidar dele.
É um drama bem conduzido, até gentil, por assim dizer, e que não foge muito do básico nos seus aspectos visuais. Stevens e seu diretor de fotografia Tobias A. Schliessler filmam grande parte do longa com a câmera na mão, e também enfatizam a frieza e a sobriedade da história com uma paleta de cores discreta e, muitas vezes, deixando as cenas internas sombrias. Sam é o personagem que traz a cor, até nos figurinos às vezes, e sempre que ele está em cena o filme fica um pouco mais quente e iluminado. É uma abordagem apropriada, mas que também não faz o filme se destacar visualmente.
HONESTIDADE É O BASTANTE
Como em todo filme dirigido por atores, as performances é que acabam tornando-se mais importantes. Apesar das desconfianças naturais que surgem toda vez que um astro ou estrela da música se aventura pelo cinema, Timberlake acabou se revelando um bom ator ao longo dos anos e aqui ele conduz o filme com competência e sobriedade. Talvez sobriedade em demasia: um pouco mais de delineamento do seu personagem e de abertura poderia ter ajudado a história. Afinal, Palmer é o tipo caladão e não é exatamente um protagonista ao qual o público se afeiçoa. Squibb está muito bem, como sempre, e Temple, com visual bem diferente para compor sua personagem, consegue evitar que a sua mãe drogada e promíscua fique muito unidimensional. Mas o garotinho Allen é a revelação do projeto: divertido e luminoso em várias cenas, mas também capaz de grande emoção em momentos-chave da história. É graças a ele, principalmente, que o espectador compra o laço “pai-e-filho” que surge entre os personagens.
Alguns aspectos do roteiro de Palmer, porém, diminuem o filme. A personagem da avó some da história, e um desenvolvimento a respeito dela acaba não tendo nenhuma consequência. E o protagonista começa um romance com a professora da escola, interpretada por Alisha Wainwright, que parece morno e apenas jogado na narrativa. É um bom filme, que de alguma forma nunca vira ótimo, nunca se torna realmente memorável para o espectador.
Apesar desses problemas, Palmer eleva-se um pouco para além das suas boas intenções graças à interação entre Timberlake e Allen. É uma fórmula que não falha nunca no cinema: homem fechado convivendo com criança e, pelo visto, parece que é difícil mesmo estragá-la. O filme também representa bem um conflito moderno, em que os ideais antigos de masculinidade são confrontados por um mundo em mudança e novas formas de se encarar questões de sexualidade e padrões sociais. Palmer não é muito profundo, nem é nada que nunca foi visto antes, mas extrai emoção de uma fonte honesta e, às vezes, honestidade é o bastante.