Pode alguém amar e ser amado em meio às diferenças culturais, sociais, estéticas, etc.? O sonho de um grande amor, um conforto de um lar permeia o imaginário de mais da metade da população mundial. Afinal, quem não quer ser amado e desejado, se sentir único?

Vivemos em um mundo em que os padrões estéticos são muito bem delimitados: branco, olhos azuis, louro e magro. O eurocentrismo deixou suas marcas profundas em muitos aspectos. E, nesse padrão estético e social estabelecidos, aqueles grupos minoritários ficam de fora no sentido de aceitação/ascensão social e pelo direito de ser amado e acolhido. Negros, indígenas, gordos, pessoas de baixa estatura e anões, por exemplo, são as vítimas dessa exclusão que demarcam e ceifam vidas.

A produção polonesa The Dress (Sukienka) ‘ousa’ ao entregar o protagonismo para uma atriz anã. E quando digo ousa é no sentido de invisibilização mesmo. Quantas produções já assistiram como atores anões protagonizando filmes e séries? Ok, temos o Peter Dinklage (“Cyrano” e “Game of Thrones”), premiado e disputado. Mas é um ponto fora da curva; não há outros nomes de grande projeção mundo afora.

A BELEZA DO DESABROCHAR

Julka/Julia (Anna Dzieduszycka) é uma camareira solitária que vive no hotel onde trabalha. Seu mundo é apenas isso: trabalho, uma conversa e outra com a colega de serviço Renata (Dorota Pomykala), jogos de azar e muitas borrifadas de cigarros. Julia é reprimida, reticente, irônica, mas, no fundo, há uma mulher que quer renascer e ser descoberta. Seu grande momento acontece quando um dos hóspedes, Bogdan (Szymon Piotr Warszawki), mostra certo interesse por ela. Caminhoneiro, eles acertam de se encontrar dali a quatro dias quando voltar.

E eis que ela desabrocha.

Ela vai atrás de um vestido e esse vestido é um portal que se abre em muitas perspectivas e expectativas. É a esperança de, enfim, ser notada, de não ser mais preterida e vista como uma atração de circo, como ouve certa vez. E aquele sorrisão dela maquiada é uma das coisas mais belas e sensíveis dos últimos tempos.

Quando se é diferente aos olhos de um trator compressor do padrão, quaisquer investidas é como se acendesse no fundo um lugar que muita gente nem sabia que existia, mas está lá. É muito maior do que ser só amado, ser normal. É a porta também para ser aceito, para ser notado.

Infelizmente, nem sempre o diferente pode ser amado e ter o mínimo de felicidade possível quando há pessoas cruéis que brincam com suas vivências, seus corpos, suas histórias. É a vida como ela é.

Roteirizado e dirigido por um cuidadoso Tadeusz Lysiak, “The Dress” concorre ao Oscar de Melhor Curta-Metragem em live action.