De Longe Te Observo, do estreante em longas-metragens, Lorenzo Vigas, é um filme de falas espaças, breves, que prioriza as imagens e, como diz o título do filme na tradução para o português, a observação destas através de uma reduzida profundidade de campo.

Na trama escrita pelo próprio Vigas, e pelo consagrado Guillermo Arriaga, acompanhamos o protético Armando (Alfredo Castro), um homem na meia idade que gasta o seu dinheiro levando garotos à sua casa para satisfazer seus desejos sexuais. Mas ele não transa com eles. Apenas os observa, à distância. Certa feita ele leva para a sua casa Elder (Luis Silva), um jovem membro de uma gangue de rua. O seu primeiro encontro não ocorre da maneira que Armando esperava, mas isso não o impede de ir atrás do garoto, o que faz com que os dois criem uma estranha relação.

Este longa, vencedor do Festival de Veneza 2015 e o escolhido da Venezuela para pleitear uma vaga no Oscar de 2017, trata de relações humanas a partir do ponto de vista de um homem interessado em contatos sexuais efêmeros, sem toques, e que usa como arma o interesse das suas “vítimas” por dinheiro.

Através da profundidade de campo reduzida realizada por Sergio Armstrong, Vigas separa o protagonista do ambiente em que vive e o circula. Visualmente temos um personagem “focado”, observando algo “desfocado”, que não corresponde àquilo que ele vive, nem ao seu modo de vida, até que ele sai do foco, e vai em busca do que quer, para novamente voltar ao foco. Armando não se mistura, e quando o faz, retorna rapidamente a sua zona de conforto, com tudo no seu devido lugar (e o contrário também acontece, como na cena do tapa, em que o personagem, por tentar entrar no foco de Armando, é esbofeteado e fica fora de foco).

Não à toa que a relação com Elder soa estranha e incoerente em diversos momentos, o que não necessariamente significa um defeito. Em alguns instantes o filme lembra o excelente Para Minha Amada Morta (2016), quando não evidencia o que de fato os dois personagens querem com aquela relação de proximidade e com muitas coisas não ditas. Algumas vezes os conflitos que acontecem entre os dois são instigantes e nos suscitam dúvidas para muitas questões fora do filme, sobre a nossa natureza, sobre como nos relacionamos sexualmente com os outros, e de que maneira escolhemos demonstrar isso. Mas, em outros pontos, as escolhas e ações dos personagens parecem mal desenvolvidas, como a orientação sexual do garoto, e a maneira que ele se aproxima de Armando depois da rejeição inicial.

O tempo mais cadenciado dialoga muito bem com a escolha dos roteiristas para o protagonista. Armando, de fato, é um observador e o filme possui muitas passagens em que apenas observamos, juntos de Armando, a sua busca por sexo e por um, aparente, acerto de contas com o pai. Dessa maneira nos aproximamos do personagem e, de certa maneira, nos tornamos cúmplices da sua busca.

Mas, é claro que isso só é possível graças ao ótimo trabalho de Alfredo Castro. Ator econômico, mas de intensidade, o chileno estabelece uma figura calada, fechada, mas que evidentemente possui inseguranças e desejos latentes. Aparentemente preso a memória de uma mulher presente em diversas fotografias pela casa, e guiado pela busca de prazer em rapazes que encontra na rua, Armando é um homem vazio, que parece realizar atividades extravagantes no seu cotidiano para se sentir vivo, para ter satisfação em alguma coisa, tudo isso para depois negar o que fez, e ter a sua vida pragmática intacta de volta. Somando ao seu recente trabalho em O Clube (2015), Castro, de vasta carreira no teatro e televisão, mostra-se como um dos atores mais interessantes do cinema latino-americano da atualidade.

Também é necessário destacar o desenho de som da produção, que inteligentemente nos conta diversos acontecimentos que não estão no quadro, criando um efeito de sugestão eficiente e sofisticado, colocando para o espectador a responsabilidade de completar as informações que as imagens oferecem.

Culminando em um final indispensável, mas ao mesmo tempo imprevisível, De Longe Te Observo apresenta um diretor seguro que entende que, muitas vezes, o ser humano escolhe os caminhos que segue pelo que tem de mais frágil e incoerente, guiando-se pelas efemeridades das relações humanas, e que isso só o torna ainda mais interessante.