“Depois de Tudo” conta a história de uma amizade em dois atos paralelos. De início, é um filme um tanto confuso e com problemas de ritmo, mas, aos poucos, conquista o espectador com duas coisas que tanto fazem falta no atual cinema ‘mainstream’ brasileiro: arrojo técnico e diálogos instigantes. Infelizmente, o vazio que envolve os personagens acaba estragando o que poderia ser uma grata surpresa do diretor João Araújo (que nos entregou o clássico – só que não – ‘O Magnata’).

Sem muita cerimonia, o filme nos introduz a Ney, uma espécie de Fábio Jr-Roberto Carlos-Paulo Ricardo com um pequeno detalhe: ele é cego. Ao mesmo tempo, conhecemos Marcos, um cansado funcionário público. Seriam dois personagens distintos, não fosse o detalhe de que, muitos anos antes, eles eram dois amigos que tentavam criar um bar. A ligação entre os dois fica ainda mais interessante com a chegada de Bebel, uma jovem que se envolve com Marcos, ao mesmo tempo em que flerta com Ney.

A premissa à la “A Última Sessão de Cinema” pode até não ser das mais originais, mas o que torna “Depois de Tudo” uma produção envolvente é a esperteza com que a história é conduzida. A montagem, em especial, é digna de nota, ao jogar raccords sonoros que ligam os dois momentos da narrativa – essa técnica é muito bem aproveitada na cena em que saímos de uma crise existencial da Bebel jovem para acompanharmos o calvário da personagem mais velha em uma cama de hospital.

Os diálogos carregados de passivo-agressividade também são um aditivo importante para a história, principalmente na fase que se passa nos dias atuais, infinitamente menos interessante que a dos personagens jovens.

Dito isso, é uma pena que os diálogos sejam ditos por personagens tão mal desenvolvidos. Não há como sentir empatia por nenhuma daquelas pessoas, ainda que o filme tente explicar demais e se estender no dilema dos dois amigos a modo de ignorar completamente o terceiro elo do triângulo, relegado a um interesse amoroso e ‘macguffin’ da história. Estou falando de Bebel, vivida com tanta intensidade por Maria Casadevall que dá até tristeza de pensar que é o personagem mais subaproveitado da trama.

O fim repentino e cheio de buracos do filme deixa um gosto amargo. “Depois de Tudo” é como aquele TCC que a gente começa cheio de animação e depois termina de qualquer jeito para entregar na hora. É uma pena, porque havia potencial.