Superlativos costumam empobrecer textos por sempre serem dotados de excessos e, por muitas vezes, desconhecimento de quem escreve. Falar de Eduardo Coutinho, porém, exige esse recurso. Neste domingo (2), o Brasil perdeu o maior documentarista de sua história. Um sujeito capaz de trazer a realidade brasileira através de sutilezas e estudo de personagens reais como poucos. A fala mansa e a capacidade de diálogo faziam com que seus entrevistados se revelassem perante às câmeras.

Coutinho ousou mostrar um Brasil autoritário e pobre durante o período de vigência do regime militar. Com “Teodorico – O Imperador do Sertão”, o diretor deixa o personagem principal externar todo o coronelismo do Nordeste do país. Porém, nenhum outro superou a força de “Cabra Marcado Para Morrer”. Todo o processo do cineasta para encontrar uma família destroçada após a morte do patriarca, vítima de uma emboscada por tentar melhores condições para os trabalhadores rurais, ajuda a compor as injustiças de um país. Uma obra-prima cada vez mais atual.

O estudo sobre aspectos da sociedade brasileira continua em obras menores como “Santa Marta: Duas Semanas no Morro”, “O Fio da Memória”, “Boca de Lixo” e “Santo Forte. “Edifício Master” começa uma fase mais intimista de Coutinho, culminando no belo “Jogo de Cena”. “Moscou”, “Antes da Estreia” e “As Canções” foram os últimos projetos do diretor.

Que o Brasil não esqueça da importância desse homem: Eduardo Coutinho está na história do cinema brasileiro como um dos maiores de todos os tempos no país.

EQUIPE DO CINE SET ELEGE OS GRANDES FILMES DE EDUARDO COUTINHO

Caio Pimenta
Filme escolhido: Jogo de Cena

O que é a realidade ou ficção? Como é o processo do ator para incorporar o personagem? Qual o papel do diretor de um filme? Esses questionamentos permeiam “Jogo de Cena”, obra-prima de um sujeito capaz de questionar a própria arte aos 70 anos de vida. Como se não bastasse, ainda arranca atuações inesquecíveis de Fernanda Torres e Andréa Beltrão.

Renildo Rodrigues
Filme escolhido: Edifício Master

“Edifício Master” é um filme com a proposta mais simples possível: conhecer um pouco da vida dos moradores de um grande prédio de apartamentos no Rio de Janeiro. Para qualquer pessoa com menos talento e sensibilidade, seria um exercício de futilidade, com algumas histórias pitorescas, outras tristes, a maioria comezinhas e efêmeras. Porém, Coutinho, transforma esse material num grande poema sobre a solidão urbana, em que as histórias pitorescas, tristes e comezinhas compõem um painel orgânico e pulsante da vida na cidade grande. Operar esse tipo de milagre era a marca do grande artista Eduardo Coutinho. Uma perda em que o adjetivo irreparável se justifica, ao menos uma vez.

Susy Freitas
Filme escolhido: Cabra Marcado Para Morrer

“Cabra marcado pra morrer” (1985) foi, e ainda é, um filme de extrema relevância para a história do documentário brasileiro. Ao abordar o assassinato do líder camponês João Pedro Teixeira e os anos de silêncio e repressão dos sobreviventes por conta da ditadura militar, a emblemática produção lembra ao espectador a importância de se contar histórias, principalmente as que nunca deveriam ter acontecido e as que não devem acontecer novamente.