O Cine Set prossegue com as entrevistas dos candidatos à Prefeitura de Manaus nas eleições 2020 com Chico Preto. 

O candidato do Democracia Cristã tenta chegar pela primeira vez à Prefeitura de Manaus. Ao longo da carreira política, Chico Preto foi vereador em Manaus entre 1996 e 2006, deputado estadual de 2008 a 2014. Foi eleito novamente para a Câmara Municipal em 2016 com 5.079 votos. 

Conforme estabelecido junto a todas as chapas, as perguntas são idênticas para todos os candidatos e feitas na mesma ordem. 

Cine Set – Qual deve ser o papel do Estado no setor cultural e qual será o foco da sua gestão no setor? 

Chico Preto – O papel da Prefeitura no setor cultural é de indução e criação de políticas públicas, através de programas e atividades, que fomentem e fortaleçam o setor. A cultura, na minha opinião, é uma das pilastras para o desenvolvimento do turismo. Quando se visita uma cidade, você deseja conhecer a cultura de um povo, os hábitos e a história. 

A gestão municipal deve induzir a lei municipal já vigente que temos, onde empresas podem financiar determinados projetos com a troca de uma parcela do ISS (Imposto Sobre Serviços), mas, podemos ter outras ações em que o município participe neste segmento fundamental. 

Cine Set – Como tornar a Lei Municipal de Incentivo à Cultura mais eficiente em sua proposta?  

Chico Preto – Muitas empresas desconhecem a lei. Este é o grande desafio. Sou advogado, mas, mesmo assim, eu não conheço todas as leis da cidade e, quando eu quero uma lei, eu vou pesquisar.  

Eu penso que a Prefeitura não fez o pós-venda da lei de financiamento da cultura. O projeto nasce de um anseio de segmentos culturais que cutucaram a Prefeitura, foi enviado para a Câmara, discutido, mas, não envolveu a sociedade que poderia financiar nem explicaram o benefício da lei.  

Por exemplo, citar a boa imagem perante à opinião pública que pode gerar o apoio a um programa cultural. Não houve isso, logo, há um desconhecimento muito grande da lei de acesso à cultura. Isso é fundamental para termos melhores resultados. 

Cine Set – Como a Prefeitura pode estimular a iniciativa privada a apoiar e investir na cultura local?  

Chico Preto – Uma das ferramentas é lei da cultura. A outra pode ser a construção de Parcerias Público-Privadas. Penso que este é um caminho para questões que vão alcançar o desenvolvimento de uma política de turismo em que este setor divulga a cultura de um povo.  

Eu olho para Manaus e percebo que a nossa infraestrutura de oferta de internet é pífia. Na Ponta Negra, um dos maiores pontos turísticos da cidade, por exemplo, o único lugar em que se sabe ter internet é na ‘parada de Dubai’. Você sai dali e não encontra mais wi-fi. Como divulgar as nossas potencialidades, cultura, hábitos se algo tão básico não é induzido pela Prefeitura? Não tenho dúvidas que as quatro principais operadoras de telefonia no Brasil têm todo o interesse do mundo em ter o seu nome e sua marca nos principais pontos históricos da cidade.  

Estamos na era da tecnologia de aplicativos. Me incomoda muito divulgar as nossas potencialidades artísticas e culturais com panfletos. O turista chega em Manaus e recebe panfleto. Não. Isso tem que estar na palma da mão através de um aplicativo. Fui a Medelín e fiquei encantado com o auxílio da tecnologia para ajudar o turista a se locomover pela cidade.  

Por isso, eu penso que esse tipo de parceria e indução para o desenvolvimento da cultura, indicando, por exemplo, quem são os agentes culturais, precisa estar ao alcance do turista e das pessoas daqui. O povo está no digital e temos que avançar neste sentido. 

Cine Set – Como a Prefeitura de Manaus pode ajudar a descentralizar as atividades culturais para que elas cheguem nas regiões periféricas, especialmente, nas zonas norte e leste da capital? 

Chico Preto – Nós temos uma diversidade de manifestações culturais. Há uma cultura mais erudita, por exemplo, com o Festival de Ópera que, na minha opinião, é algo distante da realidade da maioria da população.  

As nossas maiores e mais pujantes manifestações locais vigentes nos bairros e comunidades são as folclóricas. Você tem as festas juninas, os bois, o cangaço. Tudo isso feito por iniciativas dos próprios moradores locais. Não há indução do Estado, sendo tudo realizado pela tradição, de geração por geração, a cultura. Sinto falta da presença da organização mínima por parte da Prefeitura com relação a esse segmento na elaboração de um calendário.  

As festas juninas, por exemplo, hoje são quase ‘setembrinas’, então, a gente precisa de uma providência mais eficiente para que as coisas voltem ao eixo. O Festival Folclórico de Manaus começava no dia 12 de junho e terminava no dia 12 de julho, agora, parece que perdeu o prumo.  

Desta forma, percebe-se espaços públicos, possíveis de fomentar a cultura, subutilizados. O próprio festival que, nos anos 1960 e 1970, ocorria no campo de futebol do Colégio Militar, o antigo campo General Osório, depois, foi para a Bola da Suframa no complexo do Centro Cultural Povos da Amazônia, Hoje, este espaço está subutilizado. Não sei se é falta de recurso, falta de vontade ou visão, mas, temos um baita empreendimento, na porta de entrada do Distrito Industrial, capaz de atrair os funcionários das empresas, mas, não possui uma agenda cultural. Sei que é do governo do Estado, mas, estou pensando de forma holística com a Prefeitura fazendo a sua parte com um calendário de eventos. 

Eu aspiro ainda trazer os bairros para dentro de uma atividade permanente, gerenciada pela Prefeitura, linkada na cadeia do turismo. Explico: o turista chega em Manaus com um roteiro clássico indo para o Teatro Amazonas, depois, segue para o Largo, vai no Mercado Adolpho Lisboa, Praça da Polícia e da Matriz, Ponta Negra e encerrou. Aí, ele pega um barco, vai para o passeio na floresta. Precisamos achar uma forma de segurar esta pessoa por, pelo menos, mais um, dois dias em Manaus.

Para isso, temos que para criar atrações para ele. O porto de Manaus, por exemplo, tem uma infraestrutura centenária, mas, ainda muito boa de ser utilizada como galpões próximos à margem do Rio Negro. A Prefeitura poderia preencher estes espaços com atrações culturais vindas dos bairros com apresentações contínuas aliada a shows musicais de artistas amazonenses e a culinária local.   

Vou além: olhando para os distritos de arte de Berlim e Miami, poderíamos chamar o pessoal do graffiti e, através de Parcerias Público-Privadas com empresas de tinta fornecendo material, renovar a visão sobre o Centro de Manaus, capaz de criar um sentimento de pertencimento muito forte.

 

Cine Set – Políticas de editais públicos para o setor cultural como, por exemplo, “Conexões Culturais” e arranjos regionais em parceria com a Ancine, serão mantidas? Se sim, como poderão ser aprimoradas? 

Chico Preto – Sendo muito sincero, não tenho conhecimento profundo disso que você está me perguntando. Eu sei o que é um edital, mas, não acompanhei nos últimos quatro anos esta questão. Então, não sei te dizer, inclusive, qual foi a participação da Prefeitura neste quesito.  

Tenho a convicção de que é possível (realizar editais), mas, é preciso lembrar uma coisa: quem for prefeito irá pegar o carro andando e não saindo do ponto zero, ou seja, haverá dívidas, compromissos não honrados, uma série de situações que o vencedor das eleições terá que enfrentar para minimamente ter o controle administrativo, financeiro e político da Prefeitura a fim de que possamos olhar para uma questão como essa e saber de forma precisa como induzir e incentivar. 

Espero, primeiro, colocar a casa em ordem para tomar as rédeas e ter um olhar mais específico e profundo sobre o que você me pergunta. 

Cine Set – Artistas amazonenses quando precisam realizar atividades formativas ou cursos, mesmo de curta duração, muitas vezes, precisam sair de Manaus para fazer estas atividades, pois, elas não existem por aqui, sendo inviável para muita gente. Como a Prefeitura pode contribuir neste aspecto formativo do setor? 

Chico Preto – Eu vejo aqui um cenário de possibilidades por não encarar a cultura isolada em uma pasta e sim com um caráter transversal. Se a gente quer criar um hábito, podemos trabalhar com artistas e outros profissionais em criar uma mensagem interna para a sociedade.  

Dou como exemplo algo que vi em outras cidades: artistas trabalhando para a educação no trânsito de forma lúdica. Isso é possível em vários segmentos como trânsito, saúde, meio ambiente, educação. Por que não usar a cultura de forma ousada e criativa para criar hábitos ou mudar outros?  

Cine Set – Compreendo, mas, a questão do aspecto formativo: é possível a Prefeitura contribuir de algum modo? 

Chico Preto – Penso que sim, não acho um absurdo. O desafio vai ser colocar a Prefeitura em mãos para saber de onde estamos partindo. Neste momento, via de regra, algumas pessoas com pouca experiência, tendem a acreditar que estão partindo do zero, mas, quando chega lá, ele se depara com outra realidade e diz: ‘poxa, não vou conseguir fazer isso e aquilo’. 

É preciso saber rapidamente domar este touro selvagem, que é a máquina pública, colocar na mão e eleger prioridades. A Prefeitura atual, por exemplo, gasta R$ 10 milhões em publicidade e propaganda por mês. Não é a minha prioridade, não é. Por três anos consecutivos como vereador, apresentei projetos para diminuir isso. Com preços bem mais baixos, a gente consegue comunicar com eficiência, sobrando recursos para uma série de outras situações. Este é o grande desafio: tomar providências deste porte para olhar questões como essa e saber se é possível trazer contribuições diretas para formação de profissionais de cultura para a cidade de Manaus. 

Cine Set – O senhor pretende ter uma secretaria ou fundação destinada exclusivamente à cultura ou ela estará associada junto a algum outro setor? Por quê? 

Chico Preto – Eu vejo que a Manauscult ficou muito reduzida a algumas tarefas como cuidar do Passo a Paço, repassar verbas para carnaval e Réveillon, realizar algum tipo de suporte a uma atividade localizada e atender emendas de vereadores para fazer palcos e palanques em bairros, a qual respeito, mas, fico pensando qual a eficiência disso.  

Acredito que a Manauscult ficou atrofiada em relação ao seu papel de fomento e consolidação da cultura na cidade. Chegando à Prefeitura, vou precisar de um raio-x, em um curto espaço de tempo, para tomar uma decisão se ela permanece ou sofre uma reformulação na visão sobre cultura e turismo que precisamos ter em Manaus. O que eu vejo não é o suficiente; precisamos de mais ousadia e possivelmente reformular.  

Quanto ao nome, não tenho problema de ser Manauscult ou Cultura Manaus. Mais importante é a prática, a operação, a rotina e os desafios que sejam enfrentados com eficiência e ousadia para podermos alcançar outro patamar do ponto de vista administrativo e da relação da Prefeitura com a cidade e os cidadãos.  

Cine Set – O senhor conhece alguma obra do cinema amazonense? Já assistiu? Tem algum que o senhor mais gosta? 

Chico Preto – Não sou expert não, mas, tenho noção de produções independentes daqui de Manaus e do interior, incluindo o pessoal de Tefé. Achei de uma ousadia e intrepidez tremenda o que fazem lá em Tefé.  

Não me vem à memória nenhuma produção local que pudesse citar, mas, sei que o Silvino Santos foi um grande cineasta local. É alguém que o segmento reconhece como referência no cinema amazonense e sei de boas iniciativas feitas em governos do Estado passado, tendo o Robério Braga à frente da Secretaria de Cultura, e que o assunto ganhou fortalecimento com essa política.  

Confesso que não sei sobre as dificuldades enfrentadas hoje, mas, a julgar pelas notícias que vemos relacionadas ao governo, eu penso que a vida não está fácil. Se para a saúde não está fácil, ainda pior deve estar para a cultura.  

Espero que, em parceria com o governo estadual, possamos consolidar o segmento cultural para divulgar Manaus não mais na Folha de São Paulo ou na Veja e, sim, nos lugares certos como, por exemplo, no YouTube, Prime Video, Netflix, através do cinema, uma ferramenta poderosa para contar a nossa história e atrair turistas. 

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