Foi no fim da década de 1990 que Cate Blanchett surgiu para o grande publico de cinema. Me lembro de tê-la visto pela primeira vez no drama Oscar e Lucinda (1997), onde ela atuava ao lado de Ralph Fiennes, e aquela atriz já se destacava com seus olhos afiados e sorriso interessante. Pouco tempo depois, veio a sua primeira indicação ao Oscar pela atuação que a pôs no mapa do cinema, no drama histórico Elizabeth (1998).

Antes disso, porém, ela já era um nome estabelecido no teatro australiano. Nascida em 1969 em Melbourne, Austrália, Cate formou-se pelo Instituto Nacional de Artes Dramáticas em 1992. Pelos próximos cinco anos ela trabalhou no teatro e na TV até fazer seu primeiro filme, Um Canto de Esperança (1997). Então veio Elizabeth – sua atuação como a jovem rainha Elizabeth I conduz o filme, uma eficaz mistura de suspense com drama histórico que fez sucesso. Naquele mesmo ano Fernanda Montenegro concorreu ao Oscar por Central do Brasil (1998), mas a estatueta acabou indo para Gwyneth Paltrow por Shakespeare Apaixonado (1998). Até hoje muita gente reclama da vitória de Gwyneth, mas receio que se Cate tivesse ganhado, pelo menos nós, brasileiros, reclamaríamos menos…

Pelos próximos anos Cate Blanchett se manteve ocupada com vários projetos, às vezes melhorando-os simplesmente por estar ali – quem a viu, ruiva, maluquinha e irresistível na comédia Vida Bandida (2001), não esquece. Ela até participou de uma das maiores produções de todos os tempos, a trilogia O Senhor dos Anéis (2001-2003), como Galadriel.

Então veio O Aviador (2004) e a chance de trabalhar com Martin Scorsese, interpretando uma das maiores atrizes de todos os tempos, Katharine Hepburn. No filme ela está fantástica: além da atriz reproduzir à perfeição os trejeitos de Hepburn, que também era meio afetada fora das telas, Blanchett e o roteiro a usam para representar o conflito humano do protagonista Howard Hughes, vivido por Leonardo DiCaprio. Quando ele a perde, se inicia seu caminho em direção ao isolamento e à neurose. Pela atuação, Cate Blanchett merecidamente ganhou o Oscar de atriz coadjuvante.

Desde então ela já foi indicada mais vezes ao Oscar: pela sua fantástica atuação no drama Notas Sobre um Escândalo (2006); pela sua curiosa participação como Bob Dylan em Não Estou Lá (2007), onde era a melhor coisa do filme; e pelo seu malfadado retorno ao papel da rainha na desnecessária continuação Elizabeth: A Era de Ouro (2007), onde era a única coisa boa do filme. Fora suas participações memoráveis em filmes como O Talentoso Ripley (1999), A Vida Marinha com Steve Zissou (2004), Babel (2006), O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (2008) e Hanna (2011). Mesmo quando os filmes não são tão bons, o trabalho de Cate Blanchett sempre se destaca.

Agora, a atriz volta a disputar a estatueta por Blue Jasmine (2013), no qual foi dirigida por outro velho mestre do cinema, Woody Allen. Em Blue Jasmine, Cate interpreta Jeanette, que adotou o nome Jasmine quando se casou com um marido rico. Porém, quando os negócios escusos do marido dela são descobertos, ele é preso e ela perde tudo, sendo forçada a um padrão de vida mais humilde e a voltar a morar com a irmã de criação. Jasmine, no entanto, não consegue deixar o passado para trás e se mostra cada vez mais perturbada. É uma pessoa auto iludida e incapaz de ver a realidade. O convívio dela com a irmã causa mudanças nas vidas de ambas, não necessariamente para melhor.

Para viver a personagem, Woody Allen precisava de alguém capaz de transmitir a sua loucura, mas também atrair o publico e deixa-lo interessado nela. Cate cumpre esses dois requisitos. Ela é ora cativante, ora repulsiva para o espectador, e a atriz dá vida a todas as suas nuances. O publico se pega sentindo alternadamente raiva, empatia e pena dessa mulher tão aprisionada pelos seus próprios demônios.

Pelo seu trabalho em Blue Jasmine, Cate Blanchett já ganhou o Globo de Ouro, o BAFTA, o prêmio da Sociedade Nacional de Críticos de Cinema e do Sindicato dos Atores, entre outros. Só falta o Oscar para consagrá-la de vez, e ela é a franca favorita… Nas últimas semanas, com a polêmica em torno de Woody Allen ressurgindo – a velha suspeita, nunca comprovada, de que ele tenha abusado da filha Dylan – alguns veículos e profissionais chegaram a se questionar se as chances de Cate no Oscar seriam prejudicadas por causa disso. Não acredito que isso ocorra, e seria uma pena se fatores externos à obra e que não têm nada a ver com o filme impedissem o reconhecimento de um dos melhores trabalhos de atuação dos últimos anos.

Caso Cate Blanchett vença o Oscar, como parece certo, a estatueta representará uma consagração merecida. Além disso, ela entrará para aquele seleto grupo de atrizes que ganharam mais de uma vez. Tudo isso será muito bom para sua carreira e aumentará ainda mais seu cacife, mas o fato é que, a essa altura do campeonato, o Oscar representa a “cereja do bolo”. Ela já é uma das melhores atrizes do mundo, alguém capaz de transitar facilmente entre superproduções e filmes pequenos, entre papeis densos e outros mais leves, e que sempre parece estar se divertindo com seu trabalho. Se o Oscar por Blue Jasmine significar mais dessa diversão e mais papeis interessantes num futuro próximo, então a Academia terá prestado um serviço aos espectadores de cinema do mundo.