Sabe aquele ditado em terra de cego quem tem um olho é rei? Bom….ele se enquadra como uma luva para o novo trabalho da queridinha do humor nacional, Ingrid Guimarães. Fala Sério, Mãe! é uma comédia nacional que quando comparada aos últimos filmes de Leandro Hassum, Paulo Gustavo e as várias porcarias lançadas nos últimos três anos – da onda de filmes de youtubers aos bizarros Ninguém Entra, Ninguém Sai e Divórcio – se torna uma espécie de Cidadão Kane do gênero.

Saindo das comparações, o longa-metragem de Pedro Vasconcelos (responsável pela novela A Força do Querer) é apenas uma comédia que senta a bunda na zona de conforto e cumpre o objetivo de entreter através da química entre suas atrizes, além de Guimarães, temos a jovem em ascensão, Larissa Manoel e a temática familiar entre mãe e filha para fisgar os corações mais moles. O resultado é bem simpático e espirituoso ainda que não esconda a falta de profundidade do texto em analisar as relações entre mãe-filha. Seguem 3 pontos, que evidenciam que até mesmo quando acerta, Fala Sério, Mãe! também expõe sua fragilidade.


1. A comédia para toda família

Neste quesito, Fala Sério, Mãe! é uma comédia bem  atraente na velha fórmula de filme “indicado para toda a família”, que fisga o espectador pelas diversas piscadinhas que constrói suas situações cotidianas e familiares. É difícil você não se identificar com alguma das relações familiares apresentada no longa-metragem, vividas pela mãe Ângela (Guimarães) e Maria de Lourdes, a Malu (Manoela).

Mesmo o drama apresentado pelo longa ser brega e repleto de clichês, a narrativa evita o embaralhado de esquetes humorísticas com histórias sem pé nem cabeça ou rasas, e entrega uma com início, meio e fim. A relação entre mãe e filha é bem construída, e existem alguns momentos bem bonitos que é valorizado pelo tom bem-humorado.

Pena que o filme acaba deixando a desejar na execução. Pedro Vasconcelos que tem dois longas na carreira, o péssimo O Concurso e a esquecível nova versão de Dona Flor e Seus Dois Maridos, se acomoda em oferecer uma comédia teen trivial, apoiada na trama de situações forçadamente estereotipadas que dá atenção excessiva a verborragia interminável da personagem de Guimarães.  Há mais preocupação em criar esquetes voltada para o humor besteirol do que desenvolver a relação dramática do longa.


2. O encontro de gerações – Ingrid e Manoela

Se há uma fortaleza em Fala Sério, Mãe! é a boa química entre Ingrid e Larissa. Tanto que o primeiro ato do filme focado apenas na atriz veterana é o mais frágil do longa, com os momentos mais constrangedores, como a sequência da amamentação que beira o ridículo. É como se o longa neste início, ao tentar abordar através do humor, as inseguranças e angústias da mãe de primeira viagem, faça escolhas caricatas e pueris para retratar a situação.

A entrada de Larissa, no papel de Malu na adolescência, permite o filme apresentar uma consistência melhor e a relação dramática entre as duas personagens funciona muito bem – a cena em que ambas se aproximam ao som de Não quero Dinheiro de Tim Maia é de um tratamento sensível, de mexer com o coração mais delicado. Nesta relação, a atuação da veterana com a garota-prodígio dá caldo. Ingrid incorpora pela milésima vez no humor nacional, o papel do arquétipo estereotipado da mulher moderna neurótica que fala aos berros. É outra atuação previsível, mas funciona pela desenvoltura cômica que ela personifica uma mãe coruja, extremamente possessiva.

Serve de eficiente contraponto para atuação lúcida de Larissa, que mesmo escorregando aqui e ali – é estranho ver sua Malu, carioca da gema, com sotaque paulista – traz uma interpretação delicada do drama juvenil da personagem. Pena que tudo que acontece fora da relação das duas, não tenha qualquer finalidade narrativa: o marido de Marcelo Laham e os outros filhos do casal de uma hora para outra viram peças de decoração; as questões sobre a comunicação franca entre gerações familiares, as questões inerentes à sexualidade feminina e profissionais são pinceladas superficialmente ou somem frente aos clichês e o humor infantilizado.


3. Cinema, Televisão e……..Paulo Gustavo

Se há um esforço de criar um elo de identificação na relação mãe e filho, Fala Sério, Mãe! como produto audiovisual é de uma preguiça enorme. A impressão é de você estar assistindo uma série de TV ou um telefilme esquemático, que resvala em problemas nítidos de ritmo e montagem. Curioso que no recente Dona Flor, Vasconcelos ofereceu um trabalho dinâmico visualmente. Aqui, ele dá um passo para trás e entrega um produto convencional, sem ousadias, que não arrisca, com cenas mais longas do que o necessário. Pode funcionar no formato televisivo, mas não no cinematográfico.

Claro que há um outro acerto: as rimas visuais criadas pelo diretor para mostrar as inversões das posições na vida entre mãe e filha, onde ora é Ângela que entra debaixo do chuveiro para cuidar da filha, ora é Malu que toma a mesma ação para ajudar a mãe são interessantes, assim como recurso pouco usual de fragmentar a narrativa sob o ponto de vista de mãe e filha em comédias nacionais. Pena que essas qualidades não se sobreponham as limitadas composições de cenas descritivas e repetitivas.

A participação especial de Paulo Gustavo como ele mesmo, em certo momento do filme, apenas ilustra que a Ângela de Guimarães nada mais é do que a versão contemporânea de Dona Hermínia da classe média carioca, menos vulgar, porém, tão mais estridente quanto ela. A participação do comediante e as semelhanças entre ambas personagens em suas neuroses, desbocamentos e superproteção deixam a sensação que Fala Sério, Mãe! ocorre dentro do mesmo universo de Minha Mãe é uma Peça, como se fosse um spin-off.

Entre erros e acertos, Fala Sério, Mãe!  é simpático e envolvente em estabelecer o mapa afetivo entre mãe e filha.. Um programa agradável de férias para você chamar a genitora e curtir junto com ela.  Apesar dos estereótipos maternos exagerados apresentados pelo filme, você com certeza vai perceber diversas situações semelhantes na sua relação de vida, afinal, amor e preocupação de mãe não apenas são iguais, como são universais.