Sempre atrás de mais lucro, Hollywood encontrou um bom mercado na China. Franquias como “O Exterminador do Futuro” e “Warcraft”, por exemplo, foram salvas pelo sucesso de bilheteria no país asiático. Para conseguir estreitar mais os elos, “A Grande Muralha” era a aposta do cinema americano em colocar um toque chinês nos blockbusters. Elementos não faltaram para tanto: a ambientação no principal símbolo da nação, o tradicional diretor Zhang Yimou, uma estrela carismática como Matt Damon e muita ação e efeitos especiais.

Se o resultado comercial foi um sucesso – US$ 69 milhões arrecadados na China somente no fim de semana de estreia – em termos de cinema, “A Grande Muralha” é uma decepção.

A trama aborda uma das lendas sobre a construção da Muralha da China: a cada 60 anos, uma horda de monstros tenta transpassar a barreira, para se alimentar dos humanos que vivem do outro lado. Dois mercenários do Ocidente, William (Matt Damon) e Tovar (Pedro Pascal) chegam justo no momento em que os ataques são retomados e acabam se vendo no meio de uma batalha épica.

Vale lembrar que “A Grande Muralha” se viu no meio de uma discussão sobre o branqueamento da história chinesa. Afinal de contas, colocar um ator com traços típicos americanos como Matt Damon de protagonista de um filme sobre o maior monumento da China não soa muito bem.

Se antes poderíamos dar um crédito ao projeto por ainda não ter sido visto por ninguém, as críticas, agora, são mais do que justas: durante todo a projeção, William surge como o herói, o sujeito capaz de derrotar os monstros, sempre com os melhores planos, o cara a ser seguido por todos aqueles chineses. A sensação é que todo o exército, generais e reis são estúpidos e precisam da inteligência do ocidental para salvá-los.

É quase um “Histórias Cruzadas” com efeitos especiais: Matt Damon no papel da Emma Stone salvadora e os chineses como os negros incapazes de lutarem sozinhos.

Não bastasse isso, o roteiro de “A Grande Muralha” é de chorar de tão pobre. Tudo soa didático demais (as explicações que Matt Damon dá a Pascal sobre as funções do exército na primeira batalha são risíveis) e sem o devido aprofundamento. O romance entre William e a comandante Lin Mei não possui tempo necessário para ser desenvolvido e, por isso, não envolve o espectador a ponto de se importar com a situação. Tal falto compromete a crença nas transformações e mudanças de personalidade e valores do protagonista tão necessárias para o andamento da trama.

E pensar que Tony Gilroy, o mesmo cara dos textos dos ótimos “Rogue One”, “Conduta de Risco” e “O Ultimato Bourne”, foi um dos responsáveis por essa sucessão de erros…

Resultado de imagem para the great wall movie

Zhang Yimou, entretanto, parece notar que o forte do filme não é a história ou os personagens e sim o visual. Para quem já fez verdadeiras pinturas em forma de cinema como “Herói” e “O Clã das Adagas Voadoras”, criar momentos belos com o investimento de Hollywood é fácil.

E “A Grande Muralha” não falha nisso: o lançamento das bolas de fogo na primeira batalha, a luta de William e Tovar contra os monstros em meio a uma grande neblina, os balões tomando o céu após a morte de um importante membro do exército chinês e os efeitos provocados pelos vitrais na sequência final deixam qualquer um de queixo caído com tamanha beleza. Aliado a isso, temos um figurino e direção de arte impecáveis com boas chances de conseguirem beliscar uma indicação ao Oscar 2018.

“A Grande Muralha” poderia ser visto como uma bobagem inofensiva cheia de efeitos visuais e ritmo acelerado do cinema americano aliado ao rigor estético chinês. O filme, infelizmente, não permite que fechemos os olhos, mais uma vez, para termos que aceitar a salvação do mundo sendo feita por um homem branco e ocidental que passa por cima de tudo e todos para “ensinar” algo aos bandos de tapados. Sejam estes asiáticos, africanos, latinos ou de qualquer região do planeta considerada inferior.

Até quando?