Um exímio cozinheiro nem precisa consultar o livro de receitas, pois já está tudo gravado na mente. Claro, há aqueles que não são tão bons e também sabem de cor e salteado uma determinada receita. Mas aí é que está a diferença: não basta saber cozinhar, tem que ter o dom, o comprometimento com a comida e o seu toque especial nas suas especiarias para completar o sabor.

Eis, então, uma receita básica dos filmes de ação seguida por Joe Carnahan em “Mate ou Morra”:

  1. Um protagonista durão, viril e atlético. O famoso badass. Não pode deixar de ser mulherengo, irônico e piadista. Aqui, representado por Roy (Frank Grillo);
  2. Um vilão que pode ser carismático ou não, mas é a representação de um cavalheiro: educado, fala baixo, abusa das metáforas para intimidar seu oponente ou aquele que atrapalha de alguma forma seus planos de domínio. Lógico, é um bilionário com planos megalomaníacos. Aqui, representado por Ventor (Mel Gibson);
  3. E a mocinha. Ah, a mocinha! Doce, sensível, fala mansa e sussurrada. Costuma ser a grande mente para derrotar o vilão. É a sua açucarada presença que motiva o nosso herói na luta contra o mal, nem que para isso tenha que destruir uma cidade para manter esse amor. Aqui, representada pela Dra. Jemma Wells (Naomi Watts).

Agora misture tudo, com pitadas e altas doses de tiros, pancadas, explosões, espadas (em uma cena de embate ótima!). Tempere com um roteiro mais do mesmo e voilà: temos um filme de ação.

Em “Mate ou Morra”, conhecemos Roy, um durão ex-militar que vive o mesmo dia todos os dias com uma única certeza: vai morrer! Bom, histórias de looping infinito já não são mais novidades desde Feitiço do Tempo (1993), clássica comédia romântica protagonizada por Andie MacDowell e Bill Murray. Filmes que desafiam a linha temporal de tempo-espaço atiçam a mente de um público cativo, dependendo do seu gênero.

O diferencial de “Mate ou Morra” é que Joe Carnahan (“A Perseguição”, 2011), o nosso cozinheiro em ascensão, não se leva à sério e nem margem para quem assiste acreditar que se trata de um filme reflexivo ou pretencioso.

Neste sentido, os clichês como um vilão que quer dominar o mundo, a mocinha, o herói, as explosões são usados ao seu favor. A linguagem pop do gamer, isto é, o uso do mecanismo de videogame para chamar a atenção de um público mais jovem é sensacional. Pois deixa claro qual o público que ele quer atingir. Um bom cozinheiro, por exemplo, nunca entregaria um prato que contenha leite para alguém intolerante à lactose, não é mesmo?

“Mate ou Morra” não é para ser levado à sério, tampouco procurar por seus erros e acertos. É um filme clichê, que abusa do clichê, com personagens clichês e motivações idem, mas que, na receita final, dá para se divertir/digerir com uma boa água tônica para acompanhar.

‘Ghostbusters: Apocalipse de Gelo’: apelo a nostalgia produz aventura burocrática

O primeiro “Os Caça-Fantasmas” é até hoje visto como uma referência na cultura pop. Na minha concepção a reputação de fenômeno cultural que marcou gerações (a qual incluo a minha) se dá mais pelos personagens carismáticos compostos por um dos melhores trio de comédia...

‘Guerra Civil’: um filme sem saber o que dizer  

Todos nós gostamos do Wagner Moura (e seu novo bigode); todos nós gostamos de Kirsten Dunst; e todos nós adoraríamos testemunhar a derrocada dos EUA. Por que então “Guerra Civil” é um saco?  A culpa, claro, é do diretor. Agora, é importante esclarecer que Alex Garland...

‘Matador de Aluguel’: Jake Gyllenhaal salva filme do nocaute técnico

Para uma parte da cinefilia, os remakes são considerados o suprassumo do que existe de pior no mundo cinematográfico. Pessoalmente não sou contra e até compreendo que servem para os estúdios reduzirem os riscos financeiros. Por outro lado, eles deixam o capital...

‘Origin’: narrativa forte em contraste com conceitos acadêmicos

“Origin” toca em dois pontos que me tangenciam: pesquisa acadêmica e a questão de raça. Ava Duvernay, que assina direção e o roteiro, é uma cineasta ambiciosa, rigorosa e que não deixa de ser didática em seus projetos. Entendo que ela toma esse caminho porque discutir...

‘Instinto Materno”: thriller sem brilho joga no seguro

Enquanto a projeção de “Instinto Materno” se desenrolava na sessão de 21h25 de uma segunda-feira na Tijuca, a mente se esforçava para lembrar da trama de “Uma Família Feliz”, visto há menos de sete dias. Os detalhes das reviravoltas rocambolescas já ficaram para trás....

‘Caminhos Tortos’: o cinema pós-Podres de Ricos

Cravar que momento x ou y foi divisor de águas na história do cinema parece um convite à hipérbole. Quando esse acontecimento tem menos de uma década, soa precoce demais. Mas talvez não seja um exagero dizer que Podres de Ricos (2018), de Jon M. Chu, mudou alguma...

‘Saudosa Maloca’: divertida crônica social sobre um artista boêmio

Não deixa de ser interessante que neste início da sua carreira como diretor, Pedro Serrano tenha estabelecido um forte laço afetivo com o icônico sambista paulista, Adoniram Barbosa. Afinal, o sambista deixou a sua marca no samba nacional dos anos 1950 e 1960 ao...

‘Godzilla e Kong – O Novo Império’: clima de fim de feira em filme nada inspirado

No momento em que escrevo esta crítica, caro leitor, ainda não consegui ver Godzilla Minus One, a produção japonesa recente com o monstro mais icônico do cinema, que foi aclamada e até ganhou o Oscar de efeitos visuais. Mas assisti a este Godzilla e Kong: O Novo...

‘Uma Família Feliz’: suspense à procura de ideias firmes

José Eduardo Belmonte ataca novamente. Depois do detetivesco – e fraco – "As Verdades", ele segue se enveredando pelas artimanhas do cinema de gênero – desta vez, o thriller domiciliar.  A trama de "Uma Família Feliz" – dolorosamente óbvio na ironia do seu título –...

‘Donzela’: mitologia rasa sabota boas ideias de conto de fadas

Se a Netflix fosse um canal de televisão brasileira, Millie Bobby Brown seria o que Maisa Silva e Larissa Manoela foram para o SBT durante a infância de ambas. A atriz, que alcançou o estrelato por seu papel em “Stranger Things”, emendou ainda outros universos...