Conseguir um papel interessante já é uma luta para os artistas do sexo masculino num sistema de produção que, cada vez mais, leva em consideração o lucro em detrimento à qualidade dos filmes. Para as atrizes então, nem se fala! Conte quantos filmes protagonizados por mulheres você assistiu recentemente em que elas não estavam (1) falando sobre homens, (2) em busca de um interesse amoroso, (3) obcecadas em mudar seu jeito/aparência em função de homens ou (4) sendo femme falates para homens.

Nada contra homens, mas mulheres também são capazes de render histórias que não tenham a ver com esses pontos, né? Por isso, o Cine Set reuniu uma lista com alguns personagens femininos marcantes desde 2000. E, quem diria, nem só de procurar marido vivem as mulheres do mundo do cinema! Confira.

Eve Hammond (Natalie Portman), em “V de vingança” (2006)

Sim, o filme é sobre um homem mascarado (ou seria uma mulher? O filme deixa a dúvida no ar) que busca vingança contra um regime opressor. Porém, é Eve que funciona como metáfora para explicitar a necessidade de mudança na sociedade retratada do filme. Na trama, ela passa por profundas transformações: de cidadã apática a conspiradora, prisioneira e, finalmente, uma mulher livre. Ainda que isso tudo só tenha sido possível graças à presença de V (Hugo Weaving), e ainda que seja sugerido um envolvimento amoroso entre os personagens, esse não é o foco do filme.

Kym (Anne Hathaway) em “O casamento de Rachel” (2008)

Kym, ex-modelo que passou a última década entrando e saindo de centros de reabilitação, volta para casa para o casamento de sua irmã. Ela busca se recuperar do vício em drogas e bebida e, principalmente, da culpa por um acidente que causou a morte de seu irmão mais novo. Seu temperamento instável e necessidade de atenção são o ponto principal da trama, ao mesmo tempo em que a personagem quer melhorar e amadurecer, num processo complicado para ela, seus pais e para sua irmã, Rachel (Rosemary DeWitt), que cresceu à sombra da tragédia familiar. Anne Hathaway concorreu a um Oscar por esse papel, muito mais interessante que o que lhe rendeu a estatueta no ano passado por “Os Miseráveis”.

Betty Elms (Naomi Watts), em “Cidade dos Sonhos” (2001)

“Cidade dos Sonhos” gira em torno da relação entre Betty e Rita (Laura Harring) dentro de um universo de pesadelo, e tem umas das tramas mais bizarras da história do cinema, como só David Lynch poderia nos brindar. Ele está longe de ser um filme empoderador para alguma mulher, mas é a prova de que é possível trazer complexidade a um personagem feminino mesmo com um roteiro que foque em relações amorosas.

Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence), em “Jogos Vorazes” (2012)

Numa época em que os blockbusters voltados ao público feminino são tão moralistas para com as mulheres como “Crepúsculo”, é um sopro de esperança uma personagem como Katniss em um filme popular do naipe de “Jogos Vorazes”. A moça encara o desafio de competir no jogo-título para salvar a vida da irmã, tem habilidades físicas cultivadas por conta própria e quase nunca precisa da ajuda de seu parceiro de jogo Peeta (Josh Hutcherson), além de usar sua inteligência para criar a estratégia que permite que ela e o rapaz ganhem o jogo. Mais “exótico” ainda é o fato de que o filme tem um ritmo de aventura capaz de entreter tanto o público feminino como o masculino.

Maggie Fitzgerald (Hilary Swank), em “Menina de Ouro” (2004)

Maggie não quer fazer compras, passar por uma mudança no look para se tornar “uma linda mulher” nem seduzir o treinador Frankie (Clint Eastwood) em “Menina de Ouro”. Ela quer ser uma lutadora profissional de boxe, mesmo sabendo que seu caminho será tortuoso por ser mulher e por começar a treinar em uma idade mais avançada. No filme, suas motivações e vivências são tão importantes quanto as do treinador, e o laço quase familiar que se cria entre eles transforma os dois. Não por acaso, Hilary Swank ganhou seu segundo Oscar de Melhor Atriz com essa personagem.

Marjane Satrapi, em “Persépolis” (2007)

O longa de animação é uma adaptação do quadrinho autobiográfico de Marjane Satrapi e também é dirigido por ela. “Persépolis” conta a história da menina rebelde e seu amadurecimento até a idade adulta, tendo como pano de fundo as mudanças sociais e políticas no Irã numa época extremamente repressora. O desejo de liberdade retratado pela personagem, seja quando ela, ainda pré-adolescente, compra fitas k-7 de heavy metal ou quando, já mais velha, decide retornar ao seu país (e  as suas raízes) mesmo vivendo na Europa, é o foco principal da história, merecendo destaque também o amor e admiração pelos membros de sua família.

A Noiva (Uma Thurman), em “Kill Bill” (2003/2004)

Tramas de vingança são um prato cheio para filmes de ação protagonizados por homens. Por isso, Tarantino surpreendeu quando surgiu com “Kill Bill”, no qual uma assassina busca a vingança contra seu ex-amor e aqueles que o ajudaram a tentar matá-la, grávida, no dia de seu casamento. Ainda que recheado de mulheres obviamente dentro dos padrões de beleza, “Kill Bill” apresenta personagens femininos marcantes, seja pelo aspecto trágico, caricato ou divertido. Além disso, elementos como o fato de a personagem principal ser mãe ou de não ter dado o braço a torcer pelos sentimentos que ainda tinha por Bill e completado a vingança tiram A Noiva da zona de conforto em que as personagens femininas são geralmente jogadas.

Grace (Nicole Kidman), em “Dogville” (2003)

Em “Dogville”, Grace é a estranha acolhida em uma pequena cidade nos anos 1930. Ela foge de algo que só descobrimos mais tarde na trama, depois de ela ser aceita e, depois, explorada por um povo que parecia tão digno. O tom de tragédia grega chama mais atenção que a experimentação com os cenários (inexistentes) nesse filme, e as situações a que Grace é submetida e a sua resposta a elas fazem com que Kidman (e os outros atores) represente valores, e não apenas um indivíduo. Para dar tamanha profundidade às personagens femininas, o diretor do filme, Lars Von Trier, já afirmou que costumava escrever seus roteiros tendo homens como protagonistas, mudando o sexo do personagem ao dar o ponto final no texto. Levando em consideração filmes como “Dogville”, “Anticristo” e “Melancolia”, a técnica parece estar dando certo.

E você, curtiu a lista? Que outros filmes dos anos 2000 com papeis femininos marcantes você adicionaria?